sexta-feira, 25 de dezembro de 2015

A Vida Privada de Jesus. Simcha Jacobovici e Barrie Wilson. «Esta Assenat é uma mulher atraente com opiniões próprias. É uma personalidade forte e as suas percepções e reacções relativas a José destacam-se de forma proeminente»

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Manuscrito 17202

Episódio 1: O encontro
(…) Primeiras impressões. Oração de José pela transformação de Assenat. Se esta história se refere na realidade às figuras bíblicas José e Assenat, este texto levanta logo problemas. Assenat avança rapidamente para o centro do palco, enquanto a Bíblia faz de José a figura principal. Na narrativa bíblica, José é traído pelos irmãos e vendido como escravo no Egipto. O Livro do Génesis diz-nos que os irmãos de José tinham inveja do amor do pai por ele. Afinal, como sinal do seu afecto, o patriarca Jacob dera ao filho um manto multicolorido. Na história bíblica, depois de uma série de provações, incluindo a tentação sexual e a prisão, José trabalha e é promovido até se tornar a segunda figura mais poderosa do Egipto, a seguir ao faraó. No Livro do Génesis, o faraó dá a José uma mulher egípcia, Assenat. Esta é filha de Potifera, sacerdote de On. Deste modo, pelo casamento, José entra para uma influente família de sacerdotes. Com o tempo, têm dois filhos: Manassés e Efraim. Isto é tudo o que ficamos a saber sobre Assenat no texto bíblico. É apenas mencionada e depois desaparece. O que a Bíblia nos diz é que Assenat é filha de um sacerdote egípcio, que foi dada em casamento a José e que lhe deu dois filhos. Não temos qualquer informação acerca do seu aspecto, crenças, personalidade, valores ou carácter. Não há nada que nos indique que era uma pessoa importante ou que desempenhasse um papel decisivo na história humana.
Por outro lado, José e Assenat transporta-nos de imediato para um território diferente, simultaneamente casto e sensual. Esta Assenat é uma mulher atraente com opiniões próprias. É uma personalidade forte e as suas percepções e reacções relativas a José destacam-se de forma proeminente. Os pais respeitam os seus desejos. Embora Assenat seja egípcia, é descrita como tendo as virtudes das matriarcas israelitas, comparável a Sara, Rebeca e Raquel. Os manuscritos gregos mais tardios salientam as suas características judaicas: E esta [jovem] nada tinha de semelhante às virgens dos egípcios, mas era, em todos os aspectos, semelhante às filhas dos hebreus.
Porquê a insistência nas suas qualidades judaicas? A Assenat bíblica não viveu entre israelitas. Talvez o nosso manuscrito se refira a uma mulher que viveu no meio deles? Por outro lado, no nosso documento, a impressionante propriedade do pai de Assenat é descrita em pormenor: uma casa, um jardim, muros e, o mais importante, uma torre onde Assenat vive. Estes factos, aparentemente irrelevantes, terão um significado mais profundo? Depois de alguma hesitação inicial, Assenat é atraída por José e é preparada para ser a Noiva de Deus. Esta é uma linguagem estranha a respeito de um vulgar casamento humano, se, de facto, é disso que se trata. Na Bíblia, José é hebreu, o antepassado de duas das doze tribos israelitas do mundo antigo. Pelo contrário, a linguagem que o descreve no manuscrito José e Assenat não é hebraica. Na tradição judaica, nunca nenhum ser humano seria descrito como Deus, ou uma Noiva de Deus. Neste texto, Assenat é a noiva divina [e] José é o seu noivo. Se este texto fosse judaico, esta ideia seria uma enorme blasfémia.
Como comentou Erwin Goodenough: as tradições cristãs dos primeiros séculos, tal como são recolhidas nos escritores cristãos, não referem escritos contemporâneos de um único judeu. Por outras palavras, visto do lado cristão, é improvável que José e Assenat seja um texto judaico. Nas palavras de Ross S. Kraemer, existe uma total ausência de qualquer conhecimento desta história de Assenat nas fontes judaicas primitivas. Mas, se não é judeu, é cristão? A tentativa para localizar as pessoas que escreveram este texto é decisiva para compreender o manuscrito. Precisamos de perceber a comunidade original de onde ele saiu. Portanto, examinemos como é descrito José. Para começar, o aspecto físico é traçado com muito mais pormenores do que no Génesis. Aqui, ele enverga não o manto multicolorido de um hebreu nem o vestuário de um egípcio, mas uma túnica branca e um manto púrpura, evocando os atavios de um imperador romano. Além disso, está adornado com uma coroa, e doze raios de luz emanam da sua cabeça. Tem um ceptro na mão. Dificilmente seriam pormenores acidentais. Mas o que significam? José obedece à Tora (isto é, observa as leis dos Cinco Livros de Moisés) e é sério acerca da sua religião». In Simcha Jacobovici e Barrie Wilson, A Vida Privada de Jesus, 2014, tradução

Cortesia CAutor/JDACT