Maquiavel
faz política
«... Florença
de Maquiavel tinha cerca de cinquenta mil habitantes e ocupava um território
aproximado de quinze mil quilómetros quadrados. A sua economia baseava-se no
artesanato, especialmente do sector têxtil, no comércio e na actividade
bancária, sendo essa última uma garantia para a cidade à posição de um dos mais
importantes centros financeiros de toda a Europa. Não é por acaso que os seus
banqueiros mais célebres, os Médici, desempenham um papel tão importante na
política de seu tempo e na vida de Maquiavel. O poder dos Médici, príncipes
modernos, que fundamentaram a sua força não em actividades feudais, mas sim na
dinâmica artesanal, mercantil e financeira, era exercido respeitando
instituições comunais e republicanas seculares. A concentração de poder da
família era, podemos dizer, informal e decorria do papel preponderante que ela
exercia nos organismos da administração de Florença. A deposição dos Médici
proporcionou o domínio político de Florença por um pregador fanático,
Girolano Savonarola, responsável pela instalação de uma república teocrática
onde o poder era atribuído a Cristo. Era, de certo modo, uma antecipação
radical da Reforma protestante que Lutero e Calvino conduziriam alguns anos
depois. A experiência de Savonarola, o profeta desarmado, como Maquiavel
o denomina, terminou na fogueira, em 1498. A queda de Savonarola deixou muitos cargos públicos vagos, e
foi neste espaço que Maquiavel iniciou a sua carreira de homem público. Depois
do expurgo, ocupou o cargo de secretário da segunda chancelaria do governo
florentino, que já havia reivindicado anteriormente, sem sucesso. Logo em seguida,
tornou-se secretário dos Dez do Poder, conselho cuja atribuição era
administrar as relações de Florença com os outros Estados. A república
democrática florentina, liderada por Piero Soderini, atribuiu muitas missões
diplomáticas importantes a Maquiavel, cujos objectivos eram aumentar a sua
vivência política. Em 1500 vai para
a França, em missão diplomática. Em 1502
está em Pistóia. No ano seguinte acompanha de perto a trajectória de César
Bórgia, o Duca Valentino, filho do papa Alexandre VI, que empreendeu
várias acções políticas e militares na rota da unificação italiana. César,
citado e exaltado por Maquiavel, é um exemplo de político cujas acções
desconheciam os limites éticos na busca de um objectivo maior. A morte do papa,
seu pai e patrocinador, apaga a estrela de César Bórgia que, aliás, faleceu
pouco depois. Em Roma, Maquiavel acompanha a sucessão papal, e nos anos
seguintes limitou-se a desempenhar missões diplomáticas na Itália e no
exterior. Em 1505 recebeu a
incumbência de constituir uma milícia para a República. Assim, recrutou,
organizou e treinou tropas que, por fim, não alcançaram o objectivo de oferecer
garantias às instituições republicanas.
Em 1510, Maquiavel actuou como mediador
entre o papa e o rei da França. O agravamento do conflito entre ambos levou-os
à guerra. Os franceses venceram as tropas pontifícias, e Florença é ameaçada
pela Santa Liga, entidade criada pelo papa Júlio II para lutar contra a França.
O governo republicano de Soderini caiu em 1512,
e os Médici voltaram ao poder. A partir daí, começou o ostracismo de Maquiavel.
Exonerado das suas funções, proibido de ter acesso aos prédios públicos de
Florença, o ex-secretário teria dias ainda mais difíceis. Em Fevereiro de 1513 foi descoberto um complô contra os
Médici, e Maquiavel figurava entre os suspeitos. Preso e torturado, foi multado
e condenado à prisão. Enquanto isso, ampliava-se o poder dos Médici. Neste
mesmo ano de 1513 o cardeal Giovani de Médici transforma-se no papa Leão X. E o
primeiro florentino a alcançar o papado. Indultado por intervenção directa de
Juliano Médici, com quem mantivera um bom relacionamento na juventude,
Maquiavel tenta, sem êxito, retomar à vida pública. Impedido de trabalhar,
recolheu-se ao exílio na propriedade da família, de San Andrea in Percussina,
perto de San Casciano, a cerca de quarenta quilómetros de Florença. O
Príncipe começava a nascer, embalado pelas agruras do exílio.
Mãos
à obra
Quem
tentou, até hoje, enquadrar O Príncipe como tratado filosófico ou
científico teve, no mínimo, de se exceder em malabarismos teóricos para
sustentar as suas posições. Muita tinta foi gasta para tentar explicar as supostas
intenções científicas escondidas nas entrelinhas do livro, muitos raciocínios
foram elaborados para captar sentidos imaginários mais profundos escondidos nos
desvaneios do trabalho. Como O Príncipe é uma obra muito rica, tem o
poder de inspirar interpretações, recriações e ampliações de ideias. Mas, ao
acompanharmos o seu nascimento, percebemos que o pragmatismo foi a sua marca
registada, desde os primeiros momentos». In Maquiavel, Escritos Políticos, A Arte da
Guerra, José Nivaldo Junior (Maquiavel, O Poder, História e Marketing), Colecção
a Obra Prima de Cada Autor, Editora Martin Claret, S/R, Wikipedia.
Cortesia
deEMClaret/Wikipedia/JDACT