terça-feira, 13 de outubro de 2015

Cinco turcos em Paris. Nicolas Bourbaki. Armando Araújo. «Após a guerra, o grupo renasceu. Em face da reforma obrigatória aos 50 anos, Bourbaki era forçado a renovar-se. Instituiu-se, assim, nos congressos a presença das ‘cobaias’, jovens prometedores convidados a assistir a um congresso»

Cortesia de wikipedia

Nota: A quase totalidade deste texto foi extraído, com a devida vénia, da revista Ingenium, II Série, N.º 35, Março de 1999. Algumas frases estão ligeiramente alteradas, mantendo o mesmo sentido, outras são nossas, incluindo o título. 

«(…) O nome Bourbaki é de origem grega. Na cidade de Nancy, onde alguns dos membros Bourbaky nasceram, há uma estátua do hilariante general Charles Sauter Bourbaki a quem, em 1862, foi oferecido o trono da Grécia, que este rejeitou. Aliás, este general participou na guerra franco-prussiana, com notariedade. 

Histórias do Arco da Velha
Visto de fora, um congresso Bourbaki parecia um bando de loucos. Nos ano 30, a dona da pensão onde o grupo se encontrava, para mais um congresso, chamou a polícia às duas manhã, já que lhe parecia um grupo de maníacos fugidos de um manicómio que existia próximo. A II Guerra Mundial interrompeu quase totalmente o projecto Well, um dos elementos do grupo, foi apanhado pela guerra, na Finlândia, e acusado de ser espião russo. Tinha na mala maços de cartões-de-visita de um desconhecido N. Bourbaki, membro de uma suspeitíssima Academia da Poldávia, e até os convites para o casamento de Betti Bourbaki. Impossível convencer as autoridades de que se tratava de uma brincadeira inocente. Well foi condenado à morte e salvo por horas, pelo matemático R. Nevarilirma. Em França, Laurent Schwartz, o criador das distribuições e medalha Fields em 1950, teve de passar à clandestinidade e mudar o seu nome judeu para o aristocrático Sélimartin, falsificando a assinatura e escapando às deportações. Até Freymann, o editor de Bourbaki, teve problemas. Numa rusga, as autoridades nazis encontraram a lista de nomes que compunham Bourbaki, convencendo-se de que se tratava de um núcleo da Resistência. 

Finalmente o reconhecimento
Após a guerra, o grupo renasceu. Em face da reforma obrigatória aos 50 anos, Bourbaki era forçado a renovar-se. Instituiu-se, assim, nos congressos a presença das cobaias, jovens prometedores convidados a assistir a um congresso. Sem o saberem, eram atentamente observados quanto ao cumprimento dos rituais bourbakistas. Caso fossem aprovados, passariam a integrar o grupo. Foi assim recrutada a segunda geração, com nomes ilustres como Samuel, Serre (futuro medalha Fields), Diximer, Godement e Filenberg. E a terceira, com Cartier, Grothendleck, Borel, Bruhat, Lang. Os anos 50 e 60 são a época de ouro de Bourbaki. Os Élements de Mathématique cresciam e cristalizavam. Em 1965, como está dito atrás, foi editado o trigésimo primeiro volume. A influência de Bourbaki em todo o mundo matemático era cada vez maior. Bourbaki era o ideal, o padrão. O seu método de despir um problema de tudo quanto é acessório, conservando apenas a estrutura matemática necessária para a construção da teoria, tornou-se o paradigma de investigação em Matemática. Bourbaki criou a noção de estrutura matemática. Até em termos de nomenclatura Bourbaki tomou de assalto o poder intelectual. Termos hoje vulgares na escola, como injectivo, sobrejectivo, bola ou o símbolo ø para o conjunto vazio, são criações de Bourbaki». In Armando Araújo, Cinco Turcos em Paris, Nicolas Bourbaki, Matemática Lúdica.

A amizade de Armando Araújo 
Cortesia de AA/JDACT