terça-feira, 27 de outubro de 2015

Grandes de Portugal no século XVIII. Inventários da Casa de Távora, Atouguia e Aveiro (1758-1759). Manuel B. Rodrigues. «Em termos de honra havia o caso do monarca ter requestado a sua filha Joana Tomásia, ainda adolescente, em 1758 teria 16 anos apenas! Falava-se também, que a própria mulher do duque, fora mais um caso amoroso do monarca»


Cortesia de wikipdia

Duque de Aveiro
José Mascarenhas Silva Lencastre, 8º duque de Aveiro, 5º marquês de Gouveia, 8º conde de Santa Cruz (1708-1759)
«(…) Estes por seu lado parecem ter suspeitado que o duque seu cunhado, tinha favorecido o adultério do rei com a sua nora Teresa Tomásia, numa viagem a Salvaterra. Para enredar ainda mais a teia, constava que o rei tinha ofendido a honra do duque ao requestar-lhe a filha Joana Tomásia, ainda adolescente. Preso no seu palácio de Azeitão em Dezembro de 1758, o duque foi condenado, e barbaramente executado a 13 de Janeiro seguinte. Em 1777, o seu filho Martinho Mascarenhas, o chamado marquesito, depois de ter aceite a libertação do forte da Junqueira, recebeu ainda uma pensão anual de 1.200$000 reis anuais. Quando impetrou a revisão do processo movido a seu pai, tal foi-lhe recusado, com a argumentação de ter aceite a libertação sem ter sido declarado inocente. E a memória do duque de Aveiro nunca foi reabilitada.

O atentado. Processo e execução
Antes do atentado
Parece ser um facto indesmentível que José Carvalho Melo, tinham na década de 50 uma forte oposição de grande parte da nobreza e da Companhia de Jesus. Era latente na época o forte desejo de se criar uma alternativa minimamente credível, e aí se pode inserir a luta travada entre Carvalho Melo e o rei com a oposição, por causa do casamento do infante Pedro, irmão do monarca com dona Maria, futura rainha de Portugal. Como já vimos, Carvalho Melo saiu vencedor, pois o casamento só se veio a realizar em 1760, e numa altura em que as grandes cabeças da nobreza já tinham rolado em Belém e os jesuítas se encontravam expulsos do reino. De um ponto de vista meramente subjectivo é pois possível conjecturar, que parte da nobreza mais os jesuítas não vissem com maus olhos o desaparecimento do rei ou de Carvalho Melo. Mas um desejo não é uma realidade e o processo fabricou de um atentado, um crime organizado pela alta nobreza oposicionista mais a Companhia de Jesus. Como? Cheio de depoimentos e testemunhos falsificados pela tortura e outros compostos pelo próprio tribunal.
Já vimos também que os Távora tinham uma velha questão com o rei, devido à relação amorosa que este mantinha com a marquesa nova, Teresa Tomásia. Sentiam-se também injustiçados pelos brilhantes serviços prestados na Índia e que nem o rei nem Carvalho Melo quereriam recompensar. Constituíam também sem dúvida a guarda avançada da alta nobreza na protecção à Companhia de Jesus. Eis como um emissário de Luís XV, via os Távora, três anos depois: a marquesa mãe e seu marido desde há muito, sabiam das relações amorosas do rei, e em boa paz as sofriam. Nenhum dos dois era escrupuloso na espécie, e há mesmo aparência de que se compraziam do facto enquanto dele esperavam vantagens. Mesmo que assim não fosse, e já vimos que eram pessoas altivas a quem provavelmente repugnavam tais negócios, certo seria que o caso amoroso já durava há cerca de sete anos, e que não seria agora que iriam recorrer à infâmia e violência de um crime, para resgatar essa afronta. Como pessoas manejando os bastidores da política com a prudência e o à vontade de ser quem eram, decerto que saberiam separar Carvalho Melo do rei e ver que depor Carvalho Melo era uma coisa, atentar contra a vida do rei outra muito diferente. Eram pessoas da alta nobreza, já não muito novas e que não iam comprometer o nome da família numa acção infame.
A Companhia de Jesus por seu lado, desmantelada como estava a ser na América do Sul, tinha razões de sobra para mal querer a Carvalho Melo e por acréscimo ao próprio rei. Porém, não se está a ver uma Ordem religiosa, mesmo tendo em atenção os interesses materiais em jogo, numa monarquia hereditária, em pleno século XVIII, cometer o sacrilégio e a imprudência de colaborar num atentado à vida do próprio rei. Ter ainda em atenção que a Companhia de Jesus no século XVIII passava por ser a ordem religiosa mais poderosa de Portugal de parceria com a ordem de S. Domingos, e que eram eles os confessores do rei e de grande parte da nobreza. E decerto que também os jesuítas, sabiam ver a fronteira que separava Carvalho Melo, um mero secretário de Estado do monarca José I, rei de Portugal.
Quanto ao duque de Aveiro, como já vimos, José Mascarenhas era um homem com queixas do rei e de Carvalho Melo, e que pelo seu carácter, poderia ser considerado como suspeito, embora como é óbvio isso não pudesse chegar por si só, para o incriminar. Era rude, jactancioso e soberbo. E sendo um dos homens mais poderosos de Portugal, ainda assim sobreavaliava o seu poder. Como já disse atrás, o rei embargou o casamento de seu filho com a duquesa de Cadaval, bem como negou sempre, algumas comendas do anterior ducado de Aveiro que o duque cobiçava e a que se julgava com direito. Em termos de honra havia o caso do monarca ter requestado a sua filha Joana Tomásia, ainda adolescente, em 1758 teria 16 anos apenas! Falava-se também na época, que a própria mulher do duque, Leonor, cunhada da marquesa de Távora, também Leonor, muito tempo antes, fora mais um caso amoroso do monarca. No que respeita a outros representantes da alta nobreza e para lá de razões circunstanciais que lhes assistissem, grande parte deles tinha o agravo de Carvalho Melo com a centralização empreendida, e com o ênfase dado às Secretarias de Estado, menorizando outros órgãos de poder, os ter subalternizado». In Manuel Benavente Rodrigues, Grandes de Portugal no século XVIII, Inventários da Casa de Távora, Atouguia e Aveiro (1758-1759), revista Pecvnia, nº 11, 2010, APOTEC-Lisboa.

Cortesia de Pecvnia/Apotec/JDACT