sexta-feira, 16 de outubro de 2015

Conferências Públicas. 1891. Pereira da Silva. «… linhas escriptas por Colombo, no anno de 1506, dias antes de fallecer, na pagina branca de um breviário, que existe ainda na bibliotheca Corsini de Roma»

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NOTA: De acordo com o original

Segunda Conferencia. 31 de maio de 1891
(…) Suspendemos a primeira conferencia effectuada á respeito de Christovam Colombo e do descobrimento da America, ao referir o despeito que assaltara á aquelle famoso navegante quando soube que fora recusado por João II seu projecto de viagem directa ás índias pelo Atlântico, seguindo rumo de Oeste. Disse-vos já que partira de Portugal e dirigira-se para Génova. Amargurava-se porque desde o principio do século era Portugal a única nação da Europa, que se entregava á empreza audaz de descobrimentos de terras novas e desconhecidas; e pois lhe parecia difficil encontrar, outra que ousasse devassar e curvar os mares e arrancar de seu seio continentes ignorados. Não era alli que se apuravam então os conhecimentos geographicos, que se desfaziam tradições e legendas pavorosas do mar tormentoso da Africa, em que a edade média acreditava; que mostrara emfim que era fabula a existência de monstros marinhos recontados por Endrisi, de estreitas luzentes, por Rogério Bacon, do cahos impenetrável nas proximidades da linha segundo Albi, de basiliscos descriptos por Averrhoes, de gigantes, serêas com rabos, pigmêos com olhos nos hombros e de mil outras ficções extravagantes, devidas á imaginação dos Árabes, que assim pintando o Atlântico affastavam os espíritos de ousadias de affrontal-o?
Chegado a Génova, convencido sempre Colombo da exequibilidade de seus planos marítimos, tratou de obter do governo da republica meios para executal-os, e navios para emprehender a viagem projectada em seu espirito, affiançando ao estado grandiosas vantagens e glorias immarcessiveis. Decorria então o anno de 1486, e portanto quando já bastantes progressos e adiantamentos haviam os portuguezes conseguido, quer na arte de navegar, quer no emprego á bordo do astrolábio e do quadrante, que, no reinado de João II, juntos á agulha, única empregada no tempo de Henrique de Vizeu (infante), facilitavam agora as emprezas de atirar-se aos mares, abandonar as costas terrestres, podendo-se já, em grandes distancias, reconhecer e tomar as alturas e ficar-se certo da posição maritima. Com razão escolhia Colombo a Génova por ser sua pátria, no intuito de dar-lhe as honras do descobrimento das Indias, que convinha effectuar-se quanto antes pois que os portuguezes prosseguiam na sua rota, e com suas diligencias mais tarde ou cedo encontrariam o Indostão e as Indias próximas ao Mar Vermelho e ao golfo Pérsico.
Génova, porém, estava decadente, bem como Veneza, e todas as demais republicas marítimas da Itália, que tanto poderio e commercio haviam exercido na edade média, aproveitando-se da fraqueza do império grego de Constantinopla. Trancavam-lhes agora as relações mercantis os Turcos, senhores do mar Negro, do Bosphoro, e da Syria. Génova não se achava habilitada, portanto, para assentir-lhe ás propostas. Dissemos que Génova era sua pátria. Foi elle sempre em sua vida considerado Genovez quer em Portugal quer depois em Hespanha. Todos os escriptores coevos o affirmavam. Depois de morto, porém, como adquirira e legara um nome glorioso e immortal, diversos povos, em escriptos a respeito, tentaram chamal-o seu compatriota: até o Diccionario Larousse o faz nascer na Sabóia! Para esclarecer a questão de um modo terminante, e provar-se claramente que em Génova e dentro da cidade nascera, e de familia pobre alli residente, publicou-se em Hespanha, no século actual (século XIX), seu testamento datado de 1498, e bem assim os processos que contra a coroa hespanhola e contra seus herdeiros hespanhoes haviam promovido vários fidalgos e famílias italianas, que pretendiam ser reconhecidos seus parentes e herdeiros em falta de linha directa; publicaram-se egualmente em Génova, nos nossos dias, umas linhas escriptas por Colombo, no anno de 1506, dias antes de fallecer, na pagina branca de um breviário, que existe ainda na bibliotheca Corsini de Roma». In J. M. Pereira da Silva, Conferências Públicas, propriedade do Instituto Histórico e Geographico Brazileiro e Academia Real de Sciencias de Lisboa, Brazil, Rio de Janeiro, Imprensa Nacional, Library University of California, 1892.

Cortesia de IHGB/ARC de Lisboa/JDACT