quarta-feira, 21 de outubro de 2015

Ermida de Nossa Senhora de Guadalupe na Raposeira. Ana Maria P. Parente. «A capela-mor, mais baixa, com arco triunfal quebrado, é de dois tramos, com cobertura de ogivas de nervuras espessas. Estas assentam em colunas incorporadas na parede até meio, com capitéis decorados»


Cortesia de wikipedia

Localização e Leitura Formal
«Nossa Senhora de Guadalupe na Raposeira é uma pequena ermida que se ergue num vale aberto, entre duas breves colinas, a pouca distância da Raposeira / Vila do Bispo, a norte da estrada que liga estas duas povoações a Lagos. Passa despercebida por se encontrar um pouco para o interior em relação ao traçado da estrada e por os dois leves relevos que a envolvem, a ocultarem aos olhos dos passantes. O acesso faz-se por um curto troço de estrada secundária, que termina no largo fronteiro à porta principal do templo. De pequenas proporções exteriores, com aspecto sóbrio, onde o contraste da pedra (a ermida de Nª. Sª. De Guadalupe, assenta sobre os grés triássicos, com a inclinação de 22º para S.O. e é construída com esses grés), de cor característica, no portal e degraus, no óculo, nos cunhais e contrafortes, é realçado pela brancura da cal das paredes. Essa mesma pedra encontra-se espalhada nos terrenos circundantes. O ingresso faz-se pelo portal que se abre na fachada principal, centrado, simples, de arco quebrado pouco acentuado, mas equilibrado. O arco é formado por duas arquivoltas, sem qualquer tipo de decoração, sendo a interna saliente, de rebordo arredondado e, a externa, reentrante, como que negativo da primeira. Ambas se continuam nos pés direitos com as mesmas secções, dando origem, a interna, a uma coluna. A leitura das arquivoltas e correspondentes pés direitos apenas é interrompida pelos dois capitéis que, embora apresentando decoração cordiforme, são diferentes. O corpo do capitel do lado norte acompanha o movimento do pé direito, marcando, no entanto, a reentrância com menor amplitude e é encimado pelo ábaco a toda a largura, de moldura inferior em corda e a superior, escavada, com secção angular. O capitel do lado sul está colocado apenas sobre a coluna e, no seu corpo, horizontalmente, aparece uma corda em relevo.
O ábaco, à semelhança do capitel oposto, tem o mesmo motivo na moldura inferior e, na superior, apresenta aresta denticulada, semelhante a corda desgastada pela erosão. Continua-se o capitel numa pequena imposta, que acompanha a concavidade do pé direito e termina, exteriormente, por uma cabeça em relevo, de configuração arredondada, com boca, nariz, olhos e cabelos apontados. Inferiormente, sublinhando-a, e como que envolvendo um colunelo inexistente, surge um curto e curvo encanastrado. Ao lado do saimel norte do arco encontra-se, à vista, uma pedra que, pela sua configuração, parece dar continuidade a algo que há muito já desapareceu. Sobre o portal abre-se um pequeno óculo, de profundo enxalço, que circunscreve uma cruz em pedra, de braços iguais e centro vazado. No interior a espacialidade é diferente. O templo parece mais amplo. O portal, interiormente, apresenta-se de verga levemente abaulada. O corpo do templo é formado por três tramos, marcados por dois largos arcos diafragma, que morrem a cerca de meia altura da parede e cujos ângulos chegam quase à cobertura de madeira.
Têm rebordos, como que nervuras largas e grossas, que assentam sobre os capitéis lisos de uma espécie de mísulas. Estes capitéis alargam-se junto à parede, dando assento, igualmente, à pequeníssima espessura saliente dos arranques dos arcos, os quais, no exterior do templo, são sustentados por grossos contrafortes escalonados, perceptíveis na parede interior, a partir do nível inferior dos capitéis. As nervuras dos arcos diafragma, tanto nos ângulos como no remate das arestas chanfradas dos seus perfis, apresentam pequenos elementos decorativos esculpidos. Sobre o interior visível do contraforte do primeiro arco, do lado sul, encontra-se uma pia de água benta, circular, que se estreita ligeiramente na parte inferior. Esse estreitamento está sublinhado por uma finíssima aresta saliente, sobre a qual uma linha quebrada, igualmente fina e suave, circunda a pia. Entre dois dos espaços criados pela linha quebrada surgem, no mesmo tipo de relevo, uma cruz e uma circunferência. No segundo tramo, ao lado da pia, abre-se uma porta para o exterior. Interiormente apresenta-se de verga abaulada e, exteriormente, de arco quebrado, com o ângulo pouco acentuado e de aresta chanfrada. Sem capitéis, continua-se pelos pés direitos, também chanfrados, interrompendo-se à altura de uma pequena imposta que, a poente contém um elemento decorativo, mais uma vez cordiforme.
A capela-mor, mais baixa, com arco triunfal quebrado, é de dois tramos, com cobertura de ogivas de nervuras espessas. Estas assentam em colunas incorporadas na parede até meio, com capitéis decorados. As três nervuras centrais, tanto de um lado como do outro, assentam em duas colunas colocadas a par, que, embora de bases e capitéis independentes apresentam socos e ábacos, moldurados, interligados. De cada lado do arco triunfal, e quase a ele encostada, encontra-se uma coluna, igualmente incorporada na parede, onde se apoia a nervura da ogiva, desempenhando a função que, quanto a nós, deveria pertencer ao próprio capitel daquele arco. Todas as arestas das nervuras do arco triunfal, assim como do rebordo que se encontra no seu perfil, são chanfradas e terminam por um pequeno elemento decorativo em voluta. As duas chaves do cruzamento das ogivas, decoradas, têm formas irregulares. Circundando a capela-mor, interligando todos os ábacos, à excepção dos do arco triunfal, existe uma estreita imposta, saliente, de molduras. No pano de parede do fundo, sobranceira à imposta, abre-se uma janela alta, de dois lumes, com arcos de volta perfeita. Do lado sul, no pano de parede entre a coluna encostada ao arco triunfal e o par de colunas centrais, abre-se uma porta de comunicação com a sacristia, com arco quebrado, mas de feitura muito mais recente, visível no material utilizado». In Ana Maria Passos Parente, Ermida de Nossa Senhora de Guadalupe na Raposeira, Excerto da dissertação de Mestrado de História da Arte, Escultura Figurativa na Arquitectura Religiosa do Algarve, na Baixa Idade Média, Lisboa, Universidade Nova de Lisboa, Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, 1987, Revista Medievalista, director Luís Krus, Ano 1, Nº 1, Instituto de Estudos Medievais, FCSH-UNL, FCT, 2005, ISSN 1646-740X.

Cortesia de RMedievalista/JDACT