NOTA: De acordo com o original
Primeira Gonferencia. 17 de maio
de 1891
«(…) Ao cessar a
primeira metade do século XV três acontecimentos verificaram-se, no entanto, na
Europa: 1.º Constantinopla, a capital do império grego christão,
successora de Roma, cahira em poder dos turcos, que, derrotando os Árabes, se
tinham apoderado de toda a Ásia Menor, e dahi passado para Europa, onde
fundaram novo império, que à pouco e pouco avassallou a Grécia, a Bulgária, a
Roumania, a Servia e os estados do Danúbio, e começou a ameaçar a Allemanha
pela Hungria; 2.º Descobrira-se em Mayença a arte de imprimir, e os
livros tenderam logo á baratear, as luzes á derramarem-se, e a civilisação á crescer;
3.° Hespanha esforçava-se por unificar-se, reunindo em um só reino
Navarra, Aragão, Catalunha, Castellas, Galliza, Leão e Bascos; e França
alcançara emfim expellir os inglezes do seu território, e procurava alargar-se
até o Mediterrâneo, e assenhorear-se da Borgonha e da Provença.
A esses trabalhos
entregavam-se as nações europeas, emquanto que Portugal cuidava de navegações. Agora,
mais que nunca, precisava-se de abrir caminho para as Indias pela Africa,
porque os portos da Ásia Menor, do mar Negro e de Constantinopla, submettidos e
acurvados pelos turcos de Mahomet, feixavam as communicações, restando apenas o
Egypto que se conservara independente do jugo quer do Árabe já decahido e
escravisado, quer do Turco, que sobre todos os mussulmanos se erguera, e
apregoava-se o primeiro dos povos de crença Mahometana.
Affonso V de Portugal
foi de novo guerrear na Mauritânia, subjugou Alzira, Alcácer e Tanger. Por sua
morte, o rei João II preferiu continuar as excursões marítimas de seu finado
tio infante Henrique e approximar-se da Ásia, dobrada a costa Africana: digno
successor pela grandeza idêntica do pensamento, e mais poderoso porque era rei,
e agora entrava a Coroa nas emprezas com força própria e sob direcção
governativa. Foi nesse tempo que chegou á Portugal Christovam Colombo, pelo
anno de 1470, aventureiro audacioso,
temerário, instruído em mathematicas e cosmographia, e ancioso de tomar parte
nas emprezas portuguezas, em que já se empregavam muitos compatriotas seus, e
de outras nações europeas. Chamava Portugal e attrahia á si quantos
aventureiros arrojados desejavam navegar e descobrir terras, porque era
Portugal a única nação que se devotava á tão profícuo serviço.
Abrira, portanto,
Portugal as portas que escondiam os continentes, rasgara caminhos no seio dos mares,
desenvolvia e aperfeiçoava as sciencias cosmographicas, geographicas,
astronómicas, melhorava instrumentos de navegação, tornara-se o precursor de
todo o movimento progressivo, que seguiu o universo durante o século XV. Christovam
Colombo teria então 35 annos, e sua vida, antes desta época, não está ainda
hoje conhecida. Os autores que lhe escreveram a biographia, muitos foram elles,
tanto hespanhoes como italianos e de outras nações, divergem, contradizem-se,
por forma que ao certo se não alcança a realidade. Patenteava Christovam
Colombo grandes talentos e muitos conhecimentos mathematicos, geographicos e
cosmographicos; escrevia mapas e cartas, e tratou de empregar-se logo na
marinha portugueza, casando-se com a filha de um Perestelo, navegante
habilissimo, gratificado pela Coroa com a donatária da ilha do Porto Santo. Foi
com elle que aprendeu, estudou os roteiros, recebeu lições, e delle herdou
escriptos e mapas importantes a respeito de navegações marítimas. Colombo
relacionou-se também com todos os marinheiros e pilotos que serviam em
Portugal, fez com elles viagens diversas á Africa e aos Açores, e fixara
residência ordinária na ilha da Madeira.
Dedicado ao estudo
náutico, pesquizador de todos os factos que se passavam, engenhou logo empreza
que lhe desse renome. Era ambiciosissimo de gloria e, pois, cuidou de
desenvolver a sua actividade, para o fim de adquiril-a. Nessa época era
abraçada por muitos sábios e cosmographos a ideia de que o mundo terrestre formava
uma esfera ou globo. Copérnico, já como que também adivinhara, que, em torno do
sol fixo, é que gyravam a terra e os demais planetas». In J. M. Pereira da Silva,
Conferências Públicas, propriedade do Instituto Histórico e Geographico
Brazileiro e Academia Real de Sciencias de Lisboa, Brazil, Rio de Janeiro,
Imprensa Nacional, Library University of California, 1892.
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