sábado, 17 de outubro de 2015

Cristóvão Colombo na Madeira. Rebecca Katz. «Pedro Ledesma, que na quarta viagem de 1502 se amotinou, e anos depois, subornado pelos Pinzon, disse muitas mentiras contra o Almirante nas Inquirições que se abriram e negou terminantemente que o navegador tivesse descoberto terra firme»

Cortesia de wikipedia

«(…) Segundo Fernando, Colombo conheceu a sua esposa, dona Felipa Moniz, em Lisboa, quando assistia a missa na capela do Convento de Santos, da Ordem de Santiago. Ela era filha de Bartolomeu Perestrelo, o primeiro capitão e donatário da ilha de Porto Santo, e de dona Isabel Moniz, sua segunda esposa. Perestrelo, filho de uma família nobre de Piacenza que tinha emigrado para Lisboa no século XIV, acompanhou a segunda expedição de colonizadores a Porto Santo e Madeira em 1425. Recebeu a capitania hereditária da ilha mais pequena do infante Henrique e morreu lá ao redor de 1457. O pai de dona Isabel, Gil Ayres Moniz, pertencia a uma das mais velhas famílias do Algarve e tinha lutado junto com o Infante Henrique em Ceuta em 1415. Também a sogra de Colombo era aparentada com o condestável Nuno Alvares Pereira e por conseguinte, com a casa real, ou seja com a maior nobreza do reino.
Depois da morte do esposo, dona Isabel vendeu os seus direitos na capitania de Porto Santo a Pedro Correia Cunha, marido de uma das suas enteadas, e voltou a Lisboa. Alguns anos depois, o seu próprio filho Bartolomeu foi reconduzido na posse da capitania de Porto Santo quando chegou a sua maioridade em 1473. Isso deixou a mãe com pouco dinheiro para a sua manutenção e a das suas filhas. Como se explica o casamento da aristocrática dona Felipa com o filho de um humilde tecelão? Dizem alguns investigadores que sua mãe, que mal podia manter-se, devia ter ficado feliz de vê-la casada, poupando assim as despesas do convento. Este convento, estava desde a sua origem destinado a asilo das famílias dos cavaleiros de Santiago. O mestre da Ordem fora amo de Bartolomeu Perestrelo. Como Cristóvão chegou a corteja-la não sabemos. Seu filho, o biógrafo, só diz que como ele se portou muito honradamente e era um homem de uma presenca muito fina e tão honesto que dona Felipa teve tanta conversa e amizade com ele, que consentiu ser sua esposa. Ignoramos a data e lugar do casamento mas como parece que o filho que teve com dona Felipa nasceu em 1480, podemos supor que Cristóvão e Felipa se casaram nos fins de 1479.
Na referida biografia do seu pai, Fernando Colombo escreve que o casamento teve lugar em Lisboa, mas que o jovem casal partiu imediatamente para Porto Santo. Isso é duvidoso por vários motivos. E quanto aos muitos tomos da biografia de Colombo escrita por Bartolome de las Casas, diz-se que o bispo copiou muito do manuscrito de Fernando. Quando escreve no Livro I, capitulo 130, que Colombo residiu na Madeira depois do casamento, é muito provável que essa informação lhe tivesse vindo do manuscrito de Fernando que teve a mão. E apesar de que esses dois biógrafos eram íntimos de Cristóvão Colombo, suas biografias não inspiram muita confiança. Fernando Colombo, que não era o fruto desse casamento, também nos informa que Colombo residiu por algum tempo com sua sogra em Porto Santo, e que ela, vendo quanto Colombo se interessava pelo mar, lhe contou muitas historietas que ouviu ao seu marido. Disse que lhe contou como Bartolomeu tinha arruinado Porto Santo por muitos anos, por ter levado a ilha a sua chegada, uma coelha com sua ninhada. Os coelhos cresceram tão rapidamente que dentro de um ano cobriram toda a ilha e comeram lá tudo o que fosse verdura.
Os colonizadores foram portanto forçados a transferir-se para a ilha da Madeira e assim a colonização de Porto Santo foi retardada ate que o equilíbrio da natureza foi restabelecido. Posto que o almirante gostou tanto de ouvir estas historietas e outras das viagens feitas naquela época, segundo escreve Fernando, dona Isabel lhe deu os papeis e mapas deixados pelo seu falecido marido, do que o almirante se apaixonou, e se informou assim de outras viagens e navegações que os portugueses faziam. Nem o menor indício nos foi legado da disposição ou aparência física da única mulher de Colombo, e dona Felipa fica sendo uma figura tão obscura como a da mãe do descobridor. Nem sabemos quando morreu, só que foi antes que Colombo partisse de Portugal para Espanha em 1485, e que está sepultada no mosteiro do Carmo em Lisboa. Isso sabemos pelo testamento do seu filho Diogo que se refere a el cuerpo de dona Felipa Moniz, su legitima mujer (do almirante) que esta en el monasterio del Carmen, en Lisboa. O terceiro contacto de Colombo com a Madeira ocorreu durante a sua terceira viagem a América em 1498. Naquele ano, a Espanha estava em guerra com a Franca, e dizia-se que uma frota francesa estava perto do Cabo de são Vicente, esperando a flotilha colombina de seis barcos. O Almirante navegou para o sul, passando perto da costa africana, em vez de seguir um curso directo para Porto Santo, o seu primeiro objectivo. Depois de oito dias, a frota chegou a Porto Santo, em 7 de Junho de 1498, após ter navegado pelo menos 650 milhas. Ai Colombo decidiu meter a bordo lenha, água, e provisões, e ouvir missa. Infelizmente, os habitantes confundiram a frota de Colombo com a dos corsários franceses e fugiram para os montes com o seu gado. Como não encontrou gente em Porto Santo, Colombo fez-se à vela naquela mesma noite para a Madeira. O Funchal não é a mais que 40 milhas de Porto Santo mas parece que a frota teve alguma dificuldade porque foi só a 10 de Junho, ou seja três dias depois, que o almirante surgiu no porto do Funchal. Esta informação se encontra no livro de Las Casas onde diz textualmente que En la villa lhe fue hecho muy buen recibimiento y mucha fiesta, por ser alli muy conocido, que fue vecino de ella en algun tiempo.
Este é, por enquanto, o único documento histórico da estada de Cristóvão Colombo em Porto Santo, embora só de passagem, e de mais uma visita, a mais prolongada, apenas por seis dias, a Madeira, portanto sem longas nem demorada residência. Também a Madeira contribuiu tanto para a alegria do Almirante como para a sua tristeza porque foi de ali que Colombo levou um piloto para um dos seus barcos, um sevilhano chamado Pedro Ledesma, que se portou bastante bem na terceira viagem de 1498 mas que na quarta viagem de 1502 se amotinou, e anos depois, subornado pelos Pinzon, disse muitas mentiras contra o Almirante nas Inquirições que se abriram e negou terminantemente que o navegador tivesse descoberto terra firme. Isso foi tudo o que eu pude encontrar sobre a permanência de Cristóvão Colombo no arquipélago da Madeira. Também soube que em 1953 a população da Madeira honrou a memória de Cristóvão Colombo erigindo-lhe uma estátua numa das praças principais perto do mar. Isso não admira porque há estátuas de Colombo em todas as partes do mundo ocidental. Não sei se há uma estátua de Colombo em Portugal continental. Duvido muito. De todas as maneiras, espero que os madeirenses não me condenem por ter destruído alguns dos seus mitos mais venerados». Trabalho apresentado ao Colóquio sobre os Descobrimentos e a Literatura de Viagens, 2 – 4 Novembro 1988, nas instalações da Fundação Gulbenkian, em Lisboa.
In Rebecca Katz, Christopher Columbus and the Portuguese, 1476-1498, Greenwood Press, USA, 1993, ISBN 0313288674, Cristóvão Colombo na Madeira, muweb.millersville.edu/columbus/data/spc/CATZ-03P.SPK, Paulo Campos, Arquivo Histórico, Madeira, 2009.

Cortesia de PCampos/JDACT