‘Quando uma pintura chega a ter êxito, aquilo que
nela havia de mais activo em momentos anteriores torna-se menos claro e é
ultrapassado por aquilo que nela é mero produto dessa actividade. É por isso
que é bom olhar de vez em quando para trás. Tudo o que em nós há de original
conservar-se-á tanto melhor e será tanto mais apreciado, quanto mais formos
capazes de não perder de vista os nossos antepassados’». In Johann Wolfgang von Goethe, ‘Máximas e Reflexões’.
‘Nasce o ideal da nossa consciência da imperfeição da vida. Tantos,
portanto, serão os ideais possíveis, quantos forem os modos por que é possível
ter a vida por imperfeita. A cada modo de a ter por imperfeita corresponderá,
por contraste e semelhança, um conceito de perfeição. É a esse conceito de
perfeição que se dá o nome de ideal.
Será quantitativa ou qualitativa a diferença entre a essência dessa coisa imperfeita e a essência do que consideramos perfeição; quantitativa como se disséssemos da noite, comparando-a ao dia, que é imperfeita porque é menos clara; qualitativa como se, no mesmo caso, disséssemos que a noite é imperfeita porque é o contrário do dia.
Será quantitativa ou qualitativa a diferença entre a essência dessa coisa imperfeita e a essência do que consideramos perfeição; quantitativa como se disséssemos da noite, comparando-a ao dia, que é imperfeita porque é menos clara; qualitativa como se, no mesmo caso, disséssemos que a noite é imperfeita porque é o contrário do dia.
Este ideal de perfeição é o ideal helénico, ou o que pode assim
designar-se, por terem sido os gregos antigos quem mais distintivamente o teve,
quem, em verdade, o formou, de quem, por certo, ele foi herdado pelas
civilizações posteriores. Porque é vil e terreno, o corpo morre; não dura o
prazer, porque é do corpo, e por isso vil, e a essência do que é vil é não
poder durar; desaparece a juventude porque é um episódio desta vida passageira.
Teremos a vida por ilusória; não já imperfeita, como para os gregos, por não
ser perfeita; não já imperfeita, como para os cristãos, por ser vil e material;
senão imperfeita por não existir, por ser mera aparência, absolutamente
aparência, vil portanto, se vil, não tanto com a vileza do que é vil, quanto
com a vileza do que é falso. É deste conceito de imperfeição que nasce aquela
forma de ideal que nos é mais familiarmente conhecida no budismo, embora as
suas manifestações houvessem surgido na Índia muito antes daquele sistema
místico, filhos ambos, ele como elas, do mesmo substrato metafísico. É certo
que este ideal aparece, com formas e aplicações diversas, nos espiritualistas
simbólicos, ou ocultistas, de quase todas as confissões’. In Fernando Pessoa,
‘Textos de Crítica e de Intervenção’.
‘A harmonia do comportamento social requer, todos o sabemos, tanto o isolamento como
o convívio. Excessiva comunicação, debates exagerados de assuntos que requerem meditação e peso
moral, avesso muitas vezes à
cordialidade natural das afinidades eléctivas, não
enriquecem o património de uma sociedade. Antes embotam e alteram o terreno imparcial da sabedoria. A solidão favorece a intensidade do pensamento; por
outro lado,
torna de
certo modo celerado o homem que lida com a força material, com a técnica. O impulso
é a força que actualiza estas duas atitudes. Todo
o revolucionário é associal, se o impulso for nele um desvio da vida instintiva, e não uma atitude de
homem capaz de
obedecer e mandar a si
próprio. ‘A felicidade máxima do filho da terra há-de ser a personalidade’ -
disse Goethe. Personalidade criadora, obtida à custa do ajustamento das nossas próprias leis interiores, que não serão mais, no
futuro, forças
repelidas
ou encobertas,
mas
sim valiosas
contribuições para o tempo da pintura. Quando tudo for analisado e
conhecido, só o justo há-de prevalecer’». In Agustina Bessa-Luís, ‘Alegria do Mundo’
‘Talvez as pinturas
e/ou objectos sejam consoladores. Em especial os antigos,
feitos de barro
ou de tela, feitos por homens com outra mentalidade. As pinturas e/ou objectos são aquilo que
não somos, aquilo
que nunca chegaremos a ser. Será
que as
pessoas
fazem as coisas para definir os
limites da personalidade? As pinturas
e/ou objectos são os limites de que necessitamos desesperadamente. Mostram-nos onde terminamos. Dissipam temporariamente a nossa tristeza’. In Don DeLillo, ‘Os Nomes’.
Cortesia de O Citador/JDACT