sábado, 22 de setembro de 2012

Serões na Aldeia. Poesia. Política. «Deslizo no teu dorso, sou a mão do teu seio, sou o teu lábio e a coxa da tua coxa, sou nos teus dedos toda a redondez do meu corpo, sou a sombra que conhece a luz que a submerge»


Pintura de Maluda, Castelodevide
jdact

Há Palavras que Nos Beijam
Há palavras que nos beijam
como se tivessem boca.
Palavras de amor, de esperança,
de imenso amor, de esperança louca.

Palavras nuas que beijas
quando a noite perde o rosto;
palavras que se recusam
aos muros do teu desgosto.

De repente coloridas
entre palavras sem cor,
Esperadas inesperadas
como a poesia ou o amor.

(O nome de quem se ama
letra a letra revelado
no mármore distraído
no papel abandonado).

Palavras que nos transportam
aonde a noite é mais forte,
ao silêncio dos amantes
abraçados contra a morte.
Alexandre O'Neill, in 'No Reino da Dinamarca'

Maluda
jdact

Vertentes
As palavras esperam o sono
e a música do sangue sobre as pedras corre
a primeira treva surge
o primeiro não a primeira quebra.

A terra em teus braços é grande
o teu centro desenvolve-se como um ouvido
a noite cresce uma estrela vive
uma respiração na sombra o calor das árvores.

Há um olhar que entra pelas paredes da terra
sem lâmpadas cresce esta luz de sombra
começo a entender o silêncio sem tempo
a torre extática que se alarga.

A plenitude animal é o interior de uma boca
um grande orvalho puro como um olhar.

Deslizo no teu dorso sou a mão do teu seio
sou o teu lábio e a coxa da tua coxa
sou nos teus dedos toda a redondez do meu corpo
sou a sombra que conhece a luz que a submerge.

A luz que sobe entre
as gargantas agrestes
deste cair na treva
abre as vertentes onde
a água cai sem tempo.
António Ramos Rosa, in “Matéria de Amor

JDACT