«No entanto, expressões como as usadas por António Quadros reenviam
para mundos legendários, fabulosos, para imaginários celtas, superstições
pagãs, que se pressupõem derivados de uma realidade ontológica primordial. O
importante em Dalila Pereira da Costa não é o “fantástico” ou o “maravilhoso”,
símbolos apenas de uma realidade ontológica primordial que tece,
secundariamente, uma configuração imaginária constituída pelo “fantástico” e
pelo “maravilhoso”, ou, como também explicita o mesmo autor, a procura dos
“arcanos” permanentes do pensamento português. Em Dalila não se trata de aceder
a essências, como se destas estivéssemos separadas e as pudéssemos pensar
objectivamente, mas de vivê-las, reconhecendo-as no nosso íntimo, tomando
subsidiariamente, como pontos de apoio, certos momentos ou certos monumentos
simbólicos da história ou da cultura de Portugal, para que dentro de nós se
liberta essa “força do mundo” ou essa pulsão originária, “arcânica”, que tudo
atravessa. Filosofar é, assim, viver, tornar a “metafísica experimental” em
vivência existencial e concreta de que o sentido de vida banal nos pode afastar
(decadência do ser e decadência de Portugal), ou aproximar (momentos
privilegiadas da vida individual ou de Portugal como um todo) ou fundir
(momento da libertação definitiva, da assunção da eternidade no tempo,
momento-limite em que a história se transfigura em ontologia).
Com o texto “Saudade, unidade perdida, unidade reencontrada”, integrado no volume que Dalila Pereira da Costa organizou com Pinharanda Gomes, Introdução à Saudade (Antologia Teórica e Aproximação Crítica), publicado em 1976, a autora revolucionou a tradição conceptual sobre a saudade, espiritualizando-a numa dimensão mítica pré-ariana, anterior, portanto, à dimensão “rácica” semito-celta atribuída por Teixeira de Pascoaes. Como António Braz Teixeira realça, embora exista um contínuo histórico entre a concepção de saudade de Dalila e de alguns dos teóricos anteriores deste sentimento (o rei Duarte I, Francisco Manuel de Melo, Teixeira de Pascoaes, Leonardo Coimbra, Joaquim de Carvalho, Afonso Botelho), a realização ontológica de elementos “pagãos” pelo cristianismo (o culto da Deusa-Mãe, a religiosidade telúrica, a herança da liturgia de símbolos de tradição megalítica, como o culto das serpentes...), universaliza a saudade numa dimensão mediterrânica e atlântica que ultrapassa tanto a circunstancialidade temporal da histórica de Portugal quanto a projecta para um espaço europeu de que actualmente Portugal seria apenas herdeiro e irradiador espiritual. Recusando a tese psicologista da saudade, Dalila postula a saudade como vivência “concreta” e “experimental” da imortalidade espiritual “soprada num corpo”.
Com o texto “Saudade, unidade perdida, unidade reencontrada”, integrado no volume que Dalila Pereira da Costa organizou com Pinharanda Gomes, Introdução à Saudade (Antologia Teórica e Aproximação Crítica), publicado em 1976, a autora revolucionou a tradição conceptual sobre a saudade, espiritualizando-a numa dimensão mítica pré-ariana, anterior, portanto, à dimensão “rácica” semito-celta atribuída por Teixeira de Pascoaes. Como António Braz Teixeira realça, embora exista um contínuo histórico entre a concepção de saudade de Dalila e de alguns dos teóricos anteriores deste sentimento (o rei Duarte I, Francisco Manuel de Melo, Teixeira de Pascoaes, Leonardo Coimbra, Joaquim de Carvalho, Afonso Botelho), a realização ontológica de elementos “pagãos” pelo cristianismo (o culto da Deusa-Mãe, a religiosidade telúrica, a herança da liturgia de símbolos de tradição megalítica, como o culto das serpentes...), universaliza a saudade numa dimensão mediterrânica e atlântica que ultrapassa tanto a circunstancialidade temporal da histórica de Portugal quanto a projecta para um espaço europeu de que actualmente Portugal seria apenas herdeiro e irradiador espiritual. Recusando a tese psicologista da saudade, Dalila postula a saudade como vivência “concreta” e “experimental” da imortalidade espiritual “soprada num corpo”.
A saudade revelará que o espírito soprado num corpo é imortal. E que
assumindo a vida na sua transitoriedade, caducidade e sofrimento, como paixão
total, ela permite a libertação do homem, ultrapassando a angústia, no amor à
terra e ao corpo, porque atingindo nele, com eles, uma outra união, em forma
desligada, na contemplação, pela renúncia à possessão». In Dalila Pereira da Costa, A História Mítica da Cultura Portuguesa, Wikipedia.
continua
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