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«O Preste João passa do imaginário medieval à realidade dos factos
nesta trama de contactos. O arcebispo Montecorvino é apoiado nos primeiros tempos
pelo Rei Jorge, descendente do Preste João, que até ao seu falecimento em 1299
traz os nestorianos à obediência de Roma.
NOTA: O Príncipe Nestoriano da tribo dos turcos Ongut foi convertido
por Montecorvino. À sua morre, em 1299, os seus opositores conseguiram que os
Ongut revertessem ao Nestorianismo.
Os cristãos encontrados pelos Polos eram os remanescentes da diáspora
Maniqueia, todos sob a alçada de departamento oficial com tutela sobre os
cristãos no império mongol-chinês da dinastia Yuan. O fim dinástico em 1368
faria baixar o pano sobre o século Franciscano, a paz mongólica e a tolerância.
Os Ming (1368-1644) iriam fechar as portas ao exterior, só reabertas no
declínio da dinastia, no século XVI, pelo esforço dos portugueses e dos Jesuítas.
NOTA: É o Tribunal, no sentido que os nossos cronistas de quinhentos
dariam aos departamentos da administração chinesa, que se ocupava dos Cristãos
(não apenas os de obediência a Roma, mas todas as cristandades latinas, gregas,
arménias, nestorianas, jacobitas), o Chong
Fu Si. O Cristianismo sob os Yuan era designado por Shi zi jiao, a ‘Religião da Cruz’; mais tarde, ao tempo dos jesuítas,
seria a Tian zhu jiao, a ‘Religião do
Senhor do Céu’, com toda a celeuma que envolveu esta matéria e que ficou
conhecida pela ‘Questão dos Termos’.
A Diocese de Pequim ficaria vaga durante quase três séculos, apagando-se,
ao mesmo tempo, quase por completo, a memória de tão notável século de
intercâmbio e missionação.
O ímpeto e eficácia da gesta franciscana na Ásia Central e Oriental devem-se,
em larga medida, à visão de Sinibaldo Fieschi, o papa Inocêncio IV e também ao
espírito de cruzada do rei São Luís. O mito do Preste João, o ténue e distante
fulgor das cristandades orientais, concitaram o pensamento e as vontades no
Ocidente, para, em aliança com os khan mongóis, fazer frente e destruir o mundo
islâmico e os respectivos centros do poder, o Califato Abasside de Bagdad e o
Sultanato Mameluque do Egipto. Inocêncio IV recorreu a franciscanos e
dominicanos como mensageiros à Ásia Central, iniciativa política em que o ‘rei
santo’ também se envolveu. Três netos de Gengiskhan, Kubilai, fundador da
dinastia na China, Hulagu, fundador da dinastia dos Il-Khan na Pérsia, e Batu,
fundador da ‘Horda de Ouro’, da Rússia e Cazaquistão, eram aliados do Ocidente
na luta contra o Islão. Este entendimento iria permitir, um pouco mais tarde,
no início do século XIV, a criação da primeira Sé Episcopal em Pequim e noutras
cidades da China.
É neste contexto que surge a figura enigmática mas, sem dúvida, notável,
de Frei Lourenço de Portugal. A escolha do primeiro emissário do Sumo Pontífice
ao Grande Khan da Mongólia, senhor do Oriente, não foi certamente tomada de
ânimo leve. O que estava em jogo era a sobrevivência do mundo cristão e a
destruição do islâmico, um reequilíbrio estratégico de forças a nível global,
pela primeira vez na História. A primeira escolha para missão de tanta monta
recaiu sobre Frei Lourenço, nomeado pela bula Dei Patris Immensa, de 5 de Março de 1245, como enviado pontifício
ao Khan dos Mongóis,
- ‘(...) regi et populo Tartarorum viam agnoscere veritatis. (...) Propter quod ad vos dilectum filium fratrem Laurentium de Portugallia et Socios eius latores presentium ordinis fratrum Minorum viros religione conspicuos, honestate decoros et sacre scripture scientia preditos, ut ipsum dei filium Ihesum Christum salutaribus eorum erudicionibus agnoscentes suum gloriosum nomen Christiane fidei observatione colatis, duximus destinandos (...)’.
Frei Lourenço não seguiu viagem por razões que não se conhecem ao certo.
Tal não retira, porém, significado à circunstância de ter sido ele o escolhido
em primeiro lugar. Uma semana depois, a 13 de Março, pela bula Cum non Solum seria designado Giovani da
Pian di Carpine, que, como é bem sabido, seguiu viagem e cumpriu a sua missão».
In João de Deus Ramos, Portugal e a Ásia Oriental, Fundação do Oriente, 2012,
ISBN 978-972-785-102-7, Comunicação apresentada no 3º Seminário sobre o
Franciscanismo em Portugal, Abril de 1995, ISBN 978-972-785-202-7.
Cortesia da F. Oriente/JDACT