Melancolia
Ó doce luz, ó Lua!
Que luz suave a tua,
e como se insinua
em alma que flutua
De engano em desengano!
Ó criação sublime!
A tua luz reprime
as tentações do crime,
e à dor que nos oprime
abres-lhe um oceano!
É esse céu um lago,
e tu, reflexo vago
de um sol, como o que eu trago
no seio onde o afago,
no seio onde o aperto?
Ó luz órfã do dia!
Que mística harmonia
há nessa luz tão fria,
e a sombra que me guia
neste areal deserto?
Embora as. nuvens trajem
de dia outra roupagem,
o Sol, de que és imagem,
não tem essa linguagem
que encanta, que namora!
Fita-te a gente, estuda,
sem medo que se iluda,
essa linguagem muda...
O teu olhar ajuda...
E a gente sente e chora!
Ah! Sempre que descrevas
a órbita que levas,
confia-me o que escrevas
de quando vês nas trevas,
que a luz do Sol encobre...
As vítimas, que escutas,
de traças mais astutas
que as dessas feras brutas...
E as lástimas, as lutas
da órfã e do pobre!
In João de Deus, ‘Campo de Flores’
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