quinta-feira, 12 de novembro de 2020

Jorge de Sena. Poesia. «Que encanto é o teu? Se continua enquanto sofro a traição dos que, viscosos, prendem, por uma paz da guerra a que se vendem, a pura liberdade do meu canto»

Cortesia de wikipedia e jdact

Quem muito viu

«Quem muito viu, sofreu, passou trabalhos,

mágoas, humilhações, tristes surpresas;

e foi traído, e foi roubado, e foi

privado em extremo da justiça justa;

e andou terras e gentes, conheceu

os mundos e submundos; e viveu

dentro de si o amor de ter criado;

quem tudo leu e amou, quem tudo foi,

não sabe nada, nem triunfar lhe cabe

em sorte como a todos os que vivem.

Apenas não viver lhe dava tudo.

Inquieto e franco, altivo e carinhoso,

será sempre sem pátria. E a própria morte,

quando o buscar, há-de encontrá-lo morto».

Poema de Jorge de Sena

 

Amo-te Muito, Meu Amor, e Tanto

«Amo-te Muito, Meu Amor, e Tanto

Amo-te muito, meu amor, e tanto

que, ao ter-te, amo-te mais, e mais ainda

depois de ter-te, meu amor. Não finda

com o próprio amor o amor do teu encanto.

 

Que encanto é o teu? Se continua enquanto

sofro a traição dos que, viscosos, prendem,

por uma paz da guerra a que se vendem,

a pura liberdade do meu canto,


um cântico da terra e do seu povo,

nesta invenção da humanidade inteira

que a cada instante há que inventar de novo,


tão quase é coisa ou sucessão que passa...

Que encanto é o teu? Deitado à tua beira,

sei que se rasga, eterno, o véu da Graça».

Jorge de Sena, in Poesia, Vol. I

Cortesia de O Citador/JDACT

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