terça-feira, 24 de agosto de 2021

As Três Sereias. Irving Wallace. «Já tomou o café? Ainda não. Estou-me vestindo. Espero por você, então. Tive de passar sem ele, esta manhã. Dormi de mais. Que quer que diga à Suzu?»

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«(…) Enquanto os fios de água desciam pelas curvas da sua carne cintilante, a sua mente voltou de novo à carta de Easterday. Que dissera ele acerca do vestuário usado nas Três Sereias? Os homens traziam sacos púbicos, presos frouxamente por fios. Decerto que isso não era realmente uma coisa chocante se se considerasse a maneira como os homens se vestiam nas praias durante o verão. Contudo, apenas aqueles sacos, e nada mais. Porém, eles eram nativos, e aquilo não podia deixar de ser decente, quase clínico. Vira centenas de fotografias de nativos, alguns deles sem qualquer saco púbico, e isso, neles, parecera absolutamente natural.

Ocorrera-lhe, uma vez que estava agora de pé no meio do quarto de banho, completamente nua, que era assim que teria de aparecer em público nas Três Sereias. Não, não era bem assim. Easterday escrevera que as mulheres usam curtos saiotes, sem qualquer roupa de baixo, e andam com os seios nus. Mas, céus, era quase o mesmo que mostrar todo o corpo.

Claire voltou-se para se mirar no espelho alto, da porta. Tentou imaginar o que pareceria dessa maneira, nua, aos nativos das Três Sereias. Tinha um metro e cinquenta e três centímetros de altura e pesava, conforme verificara aquela manhã, cinquenta e um quilos. O seu cabelo era escuro e brilhante, cortado curto, com as extremidades caídas sobre as faces. Os olhos em amêndoa pareciam de uma vaga casta do Extremo Oriente, faziam evocar as jovens submissas e recatadas da antiga Cathay, e contudo o efeito sofria o contraste da cor, azul-fumado; sexy, dissera uma vez Marc. O nariz era pequeno, com narinas bastante delicadas, os lábios de um vermelho profundo e a boca generosa, demasiado generosa. Do declive dos ombros e do peito, os seios desenvolviam-se gradualmente. Estes eram largos, cheios, como odiara que assim fossem na adolescência, todavia altos e jovens, o que constituíra uma fonte de saturação quando tinha vinte e cinco anos. As costelas mostravam-se um pouco, que pensariam os nativos?, mas o abdomem era quase liso, apenas ligeiramente arredondado, e as proporções das coxas e das pernas delgadas não pareciam más, realmente. Contudo, não se podia prever o que sentiriam outros povos, noutras culturas, os polinésios poderiam considerá-la magra, com excepção do peito. Então recordou-se do saiote. Trinta centímetros. Era fácil ver que trinta centímetros permitiam apenas dez de modéstia extra. Não falando do vento... Meu Deus, que aconteceria quando se curvasse ou levantasse a perna para subir um degrau, ou, também, como se sentaria? Decidiu discutir todo este assunto do vestuário com Maud.

De facto, uma vez que esta era a sua primeira viagem de estudo, devia perguntar a Maud o que se exigiria dela nas Três Sereias. Enquanto se enxugava, viu-se uma vez mais ao espelho. Como seria quando estivesse grávida? Realmente, tinha uma barriga tão pequena! Onde haveria espaço para outra pessoa, o seu bebê? Bem, havia sempre, a natureza tinha seus segredos, mas era absolutamente impossível prever, neste momento, o que aconteceria. Ao pensar na criança que teria, mas não tinha, franziu automaticamente a testa. Desde o princípio falara com paixão, e mais tarde com naturalidade, em ter um filho, mas Marc opusera-se a isto. Isto é, opunha-se por agora, disse sempre. As razões que o levavam a pensar assim pareciam importantes, quando as manifestava; porém, quando se encontrava só, com tempo para meditar nelas, pareciam-lhe sempre insignificantes. Devemos ajustar-nos primeiro ao casamento, afirmara ele uma vez. Devemos reservar alguns anos só para nós e evitar todas as responsabilidades que pudermos, declarara de outra. E por último acrescentara mais uma razão: era preciso que Maud se instalasse numa outra casa, se separasse deles, vivessem sós, os dois, antes de iniciarem uma nova família.

Agora, à medida que passava a toalha pelas pernas, perguntava-se se qualquer dessas razões era honesta, para não dizer válida, ou se dissimulava a verdade: que Marc não desejava um filho, que temia ter um, pois ele próprio era ainda uma criança, uma criança crescida, demasiado dependente para arcar com responsabilidades. Claire não gostou dessa momentânea suspeita e decidiu não especular mais.

Ouviu bater à porta, atrás do espelho. Claire? Era a voz de Marc. Teve um sobressalto de surpresa e sentiu-se culpada, devido a seus pensamentos, agora que Marc estava tão perto. Bom dia, volveu, com alegria. Já tomou o café? Ainda não. Estou-me vestindo. Espero por você, então. Tive de passar sem ele, esta manhã. Dormi de mais. Que quer que diga à Suzu? Alguma coisa especial? O costume. Muito bem... A propósito, a última comunicação sobre as pesquisas chegou já de Los Angeles. Novidades sensacionais? — Ainda não tive tempo de examiná-la. Vamos lê-la juntos, ao café. Muito bem. Depois de Marc se afastar, Claire pôs rapidamente o soutien, as calcinhas, colocou o cinto das ligas, calçou as meias e prendeu-as e vestiu a combinação cor-de-rosa. Ao sair da atmosfera quente do banheiro para entrar no quarto, mais fresco e claro, perguntou-se se a comunicação apresentaria qualquer facto novo. Dentro de alguns minutos saberia. Penteou-se apressadamente, pôs batom nos lábios, não usava cosméticos no resto do rosto, vestiu a saia leve de lã cor de cacau, em seguida o suéter de cachemira bege, abotoou-o, procurou uns sapatos de salto baixo, calçou-os, dirigiu-se imediatamente para o hall e desceu as escadas». In Irving Wallace, As Três Sereias, Livros do Brasil, coleção Dois Mundos, 2000, ISBN: 978-972-381-025-7.

Cortesia de LBrasil/DMundos/JDACT

JDACT, Irving Wallace, Literatura, A Arte,