domingo, 28 de maio de 2017

As Grandes Sociedades Secretas. David V. Barrett. «Enterramos uma semente e ela transforma-se em alimento. O cereal morre, e depois volta a ganhar vida»

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«A história das sociedades secretas é a história da religião esotérica e é também a história da magia. Quaisquer que sejam as suas actuais práticas e ensinamentos, aspecto e prioridades, a maior parte das sociedades secretas tem raízes religiosas. A religião é tão antiga como o homem, e o ofício de sacerdote compete com o de prostituta e o de espião pelo título de mais velha profissão do mundo. O presente capítulo analisa brevemente algumas das muitas influências religiosas nas actuais sociedades secretas, desde o início dos tempos até finais da Idade Média. Note-se que as datas apresentadas para alguns dos primeiros mestres e autores variam de fonte para fonte. Além disso, as mitologias, filosofias e movimentos religiosos do presente capítulo não se seguem, necessariamente, por ordem cronológica; muitos sobrepõem-se.

Sociedade primitiva
As origens da religião são, a um tempo, externas e internas. O homem primitivo estava muito mais à mercê dos elementos do que nós, sendo o seu quotidiano afectado por trovões, relâmpagos, vento, chuva, inundações e seca. Acima dele estava o céu, com os mistérios do Sol durante o dia, e a Lua e as estrelas à noite. O que eram essas luzes? Porque se deslocavam pelo firmamento em diferentes alturas do dia, do mês e do ano, e porque variavam de brilho, forma e dimensão? O calor e a luz do Sol davam vida. Como ter a certeza de que voltaria a recuperar a sua força geradora depois de passar pelo ponto mais fraco, a meio do Inverno? Enterramos uma semente e ela transforma-se em alimento. O cereal morre, e depois volta a ganhar vida.
É fácil perceber como se desenvolveram os deuses: a partir dos grandes poderes da natureza, poderes que fogem ao controlo do homem. Poder-se-ia fazer pedidos a esses poderes? Responderiam favoravelmente, caso se fizessem sacrifícios? Qual seria o modo mais eficaz de abordar tais poderes? Seria perigoso? Poderia qualquer um fazê-lo, ou seria preciso um especialista, uma competência, uma arte, um poder? E assim nasceram os sacerdotes.
O homem queria ainda respostas para outras questões. O que acontece quando alguém morre? Eu vou morrer? O que me acontecerá quando eu morrer? A haver vida depois da morte, que forma ela assumirá? Onde é? É boa ou má? Como posso ter a garantia de que vai ser boa? Se há vida depois da morte, houve vida antes do nascimento? Se as colheitas vivem e morrem e voltam à vida, será o mesmo verdade para as pessoas? E ainda mais questões. Para onde vou nos meus sonhos? Porque não posso trazer coisas de lá? Os sonhos prevêem o futuro? Quem me poderá revelar o seu significado? Além disso, numa altura em que um ferimento ou uma doença poderiam facilmente levar à morte, quem conhecesse o tratamento correcto, as ervas certas, era merecedor de honras, tornava-se um dos mais importantes elementos da tribo.
O sacerdote, ou xamã, ou curandeiro, conhecia os rituais adequados para garantir que o Sol voltava todos os anos. Ele sabia como trazer chuva, como conseguir uma boa colheita ou uma boa caçada, como alcançar uma vitória contra uma tribo vizinha. Conhecia o significado dos sinais e dos presságios, o sentido oculto dos sonhos; e nos seus próprios sonhos viajava, a seu bel-prazer, até à terra dos espíritos. Sabia curar e amaldiçoar. Era um homem sábio, que até o chefe da tribo procurava em busca de conselhos. Ninguém vive para sempre, pelo que uma das tarefas mais importantes do sacerdote, tendo o bem-estar da tribo presente, era formar um sucessor nas artes complexas do seu mister. À medida que esse papel se foi tornando mais poderoso, também o conhecimento passou a ser mais bem guardado; criava-se a ligação entre o poder e o secretismo.
As sociedades desenvolveram-se e tornaram-se mais complexas, e o mesmo aconteceu às formas exteriores, mais públicas, da religião, a religião exotérica, bem como ao conhecimento secreto e ao secretismo do conhecimento, no cerne da religião, a religião esotérica. Esses dois aspectos tornaram-se cada vez mais distintos, até que os segredos internos da religião foram escondidos não só do público, mas também de grande parte dos sacerdotes». In David V. Barrett, As Grandes Sociedades Secretas, 1997, 2007, Clube do Autor, 2016, ISBN 978-989-724-333-2.

Cortesia de CdoAutor/JDACT