sexta-feira, 7 de abril de 2023

Alexandre VI. Volker Reinhardt. «Em 27 de Junho de 1458, morreu Afonso V, de cognome o Magnânimo. Mesmo com idade avançada, seu adversário começou a entrar em acção. Ele proibiu o filho ilegítimo de Afonso…»

Cortesia de wikipedia e jdact

De Xátiva a Roma. 1378-1458. As Origens dos Bórgias

«(…) Era imensa a necessidade de concessão de graças e indultos, ou seja, dispensas provenientes dessas complicadas regras. Por outras palavras: no palácio do vice-chanceler convergiam laços, por meio dos quais era possível estabelecer ligações com os poderosos de todo o planeta. Permissão para casar, apesar do grau de parentesco muito próximo, legitimação de filhos bastardos, absolvição de promessas incômodas: tudo isso tinha o seu valor de contrapartida e sua utilidade. E, principalmente, o vice-chanceler passou a ter acesso irrestrito a desagradáveis segredos que os poderosos não queriam que se tornassem públicos.

A nomeação de Rodrigo a bispo de Valência elevou ainda mais a sua posição e aumentou seus rendimentos. E, pouco depois, ao elevado posto dentro da Igreja, juntou-se também uma posição de liderança secular. Calisto III nomeou seu talentoso sobrinho, sem a menor cerimónia, como capitão das tropas papais na Itália. Um cardeal como general: isso foi uma ofensa para muitos. A enorme quantidade de postos atribuídos a outro sobrinho, Pedro Luís, irmão de Rodrigo, também provocou escândalos. Ele recebeu numerosos cargos no Estado Pontifício, entre eles a castelania do Castelo de Santo Ângelo. Como resultado, passou a comandar a inexpugnável fortaleza da cidade de Roma: uma prevenção para os tempos de crise. Pedro Luís, que estava destinado a ser o herdeiro da aristocrática dinastia Bórgia, ganhou, acima de tudo, os feudos que tinham sido perdidos pelos barões romanos. Indo ao encontro desses propósitos, especialmente nos territórios dos Orsini, foram tomados todos os castelos, com seus respectivos direitos de jurisdição, tributação e recrutamento de tropas. A sua amargura foi ainda maior quando o cardeal Orsini, o fazedor de papas, contabilizou recompensas no lugar de desapropriações.

Calisto derrotou os Orsini, mas o que ele queria mesmo era atingir seu patrão, o rei Afonso. As suas relações com Nápoles tinham piorado rapidamente. A exigência do monarca de continuar a condescender com ele nos âmbitos políticos do clero, ou seja, nomear candidatos convenientes para o bispado e conceder lucrativos prestimónios ao seu protegido, foi considerada um atrevimento e, por isso, recusada. O papa já não tinha a menor predisposição para esses servicinhos de capelão. A situação progrediu de tal maneira que chegou a recusar favores a Afonso, favores esses, que concedia em provocante abundância aos membros de sua família. Divergências políticas importantes agravaram a contenda. Calisto acreditava ter identificado, na táctica dilatória de Nápoles, o principal obstáculo para a realização de seu grande plano, que era reprimir os otomanos. No Outono de 1457, o rei ameaçou o papa com concilio e deposição; este, por sua vez, ameaçou o rei com privação de enfeudamento. De repente, como numa poderosa encenação teatral, no ápice do conflito, um dos dois protagonistas retirou-se do palco. Em 27 de Junho de 1458, morreu Afonso V, de cognome o Magnânimo. Mesmo com idade avançada, seu adversário começou a entrar em acção. Ele proibiu o filho ilegítimo de Afonso, Fernando de Aragão, mais conhecido como dom Ferrante, sucessor designado para a região continental do sul da Itália, de usar seu título de rei. Revogou ainda o juramento de fidelidade de seus súbditos e assumiu o reino como um feudo que fora devolvido à Igreja.

Ao mesmo tempo, o papa concedeu a Pedro Luís a função de comandante supremo das tropas que liderariam a inevitável guerra contra Nápoles. Além disso, transferiu para seu sobrinho o vicariato de Benevento e Terracina, que tinha sido ocupado pelo falecido monarca. O nepote regia esse enclave romano no reino de Nápoles, como o título mesmo indica, literalmente como substituto do papa; a experiência demonstrou, contudo, que esses vicariatos, de facto, transformaram-se rapidamente em grandes domínios autónomos. Como já mostrado no drástico agravamento das relações com os Orsini, essa concessão demonstrava também o que os Bórgia realmente tinham em vista: o trono de Nápoles». In Volker Reinhardt, Alexandre VI, Bórgia, o papa sinistro, 2011, Editora Europa, 2012, ISBN 978-857-960-127-9.

Cortesia de EEuropa/JDACT

JDACT, Volker Reinhardt, Vaticano, Escrita,