sexta-feira, 11 de março de 2011

Gomes Leal: «Na sua poesia confluem o ultra-romantismo, o satanismo byroniano, as correspondências baudeleirianas, o parnasianismo e o simbolismo. Há ainda alguns elementos que deixam já adivinhar o surrealismo»

(1848-1921)
Lisboa
Cortesia de joaquimevonio

António Duarte Gomes Leal, um poeta e jornalista que tinha na sua irmã a sua principal fonte de inspiração. No ano da sua morte em 1875, publica «Claridades do Sul», a sua primeira obra poética. Com a morte da mãe, converte-se ao catolicismo, o que tem influência na sua obra. Publica inúmeros textos panfletários de denúncia político-social. A sua poesia oscila entre os três grandes paradigmas literários do final do século XIX:
  • romantismo,
  • parnasianismo,
  • simbolismo.
Gomes Leal foi autor de uma obra heteróclita que reflete as tendências dominantes da Geração de 70 e anuncia já o Simbolismo e o Decadentismo finisseculares, para o que contribuiu a diversidade das suas influências literárias, incluindo modelos portugueses do primeiro romantismo, como Garrett e Herculano, e modelos estrangeiros, como Vítor Hugo, Baudelaire, Nerval, Gautier e Heine.

Cortesia de openlibrary
«Em 1869, o crítico Luciano Cordeiro inclui-o entre os "poetas novos", junto a Antero de Quental, Teófilo Braga, Guilherme Braga e Guerra Junqueiro, entre outros, o que contribui para o seu reconhecimento público. Depois de uma vasta colaboração jornalística dispersa por periódicos tão diversos como a República, o Diário de Notícias, A Alvorada, Ilustração de Portugal e Brasil, ou a revista feminina Boudoir, funda, em 1872, juntamente com Magalhães Lima, Silva Pinto, Luciano Cordeiro e Guilherme de Azevedo, o jornal satírico O Espetro de Juvenal. Em 1875, publica o seu primeiro volume de poesias, Claridades do Sul. Em 1881, funda, mais uma vez ao lado de Magalhães Lima, o jornal O Século, onde assegura a rubrica "Carteira de Mefistófeles", que publicará importantes artigos de teorização sobre a poesia moderna. É também nesse ano que publica o panfleto A Traição, dirigido contra o rei D. Luís e visando a sua passividade perante a possibilidade da venda de Lourenço Marques aos ingleses. Por causa desse texto, onde apelida o rei de "salafrário", "assassino e ladrão", é preso. Depois da morte da mãe, em 1910, converte-se ao catolicismo, mas cai na miséria e no alcoolismo, acabando a viver da caridade alheia e de uma pensão do Estado, reivindicada por um grupo de escritores, à frente dos quais estava Teixeira de Pascoaes. Apesar de Gomes Leal ter sido reconhecido em vida essencialmente como poeta social e satírico, a sua "arte compósita", assim lhe chamou Vitorino Nemésio, assinala uma renovação na expressão poética portuguesa, abrindo caminho à poesia moderna». In Infopédia, Porto Editora, http://www.infopedia.pt/$gomes-leal.

Bibliografia:
A Canalha, 1873 (poema); Claridades do Sul, 1875 (poesias); A Fome de Camões, 1880 (poema); A Traição, 1881 (poema); O Renegado, 1881 (poema); História de Jesus, 1883 (poema); O Anticristo, 1.ª versão, 1886; 2.ª versão, 1907 (poema); Troça à Inglaterra, 1890 (poema); Fim de um Mundo, 1900 (poesias); A Mulher de Luto, 1902 (poesias); Mefistófeles em Lisboa, 1907 (poesias); A Senhora da Melancolia, 1910 (poesias); Pátria e Deus e A Morte do Mau Ladrão, 1914 (poema)

Cortesia de purl
Poeta joco-satírico, são deste autor vários textos que vieram a lume na Revolução de Setembro, dos quais se destacam:
  • A batalha dos astros (20 de Abril de 1870);
  • Descrença (31 de Agosto de 1870);
  • Flor de perdição (2 de Outubro de 1870);
  • No Calvário (Outubro de 1870).

Em 1875 sai a primeira edição de Claridades do Sul, cuja segunda edição é de 1901. Para celebrar Camões e Bocage, publica «A Fome de Camões» (1880) e «A Morte de Bocage» (1881). Datam igualmente de 1881 os panfletos poéticos «A Traição» e «O Herege», pondo em causa o trono na pessoa do rei D. Luís, as Instituições burguesas e a Igreja, o que gerou um verdadeiro escândalo literário e político.

Cortesia de tertuliabibliofila

Na sua obra poética e panfletária, este poeta finissecular manifesta apego a entidades históricas e religiosas, numa atitude por vezes pessimista e acusadora. Todavia, é através desse apelo à História que procura um sentido para a vida.

Outr’ora, outr’ora, em épocas passadas,
Tive uma santa Mãe de ideias maneiras,
Um recto Pai de barbas prateadas,
Tive prédios, jardins, fontes, roseiras.

Nos colégios, nas aulas, nas bancadas,
Não quebrei bancos, não parti carteiras;
Fiz bons exames, contas, taboadas,
Mais tarde amei patrícias feiticeiras.

Fui amigo do Eça e do Ramalho,
João de Deus, mais do excêntrico Fialho,
E tive que emigrar para o estrangeiro.

Chorei, gemi! Qual Dante nas estradas!
E ao regressar, por causas avanças,
- fui por três vezes parar ao Limoeiro.

Cortesia do Instituto Camões/JDACT