terça-feira, 22 de outubro de 2013

Carla Alferes Pinto: A Infanta dona Maria de Portugal, o Mecenato de uma Princesa Renascentista. « Estávamos no ano de 1557; a Infanta tinha 36 anos. É o próprio rei que faz e proposta do noivo à Infanta: Y porque el rey Don Fernando se halla viudo, y es la Magestad mas digna de vuestros méritos…»

jdact

A “Sempre-Noiva”. Política matrimonial e Diplomacia paralela
«(…) Os cronistas e estudiosos (Carolina Michaëlis de Vasconcelos, incluída) na sequência deste episódio falam de ume Infanta sofredora e profundamente magoada, que se resigna em silêncio às adversidades de ser apenas mais ume princesa casadoira. Não duvidamos do empenho pessoal de D. Maria neste casamento. Filipe era senhor de Castela e herdeiro do império de seu pai; não haveria, portanto, consórcio que a Infanta mais almejasse. Mas a sua reacção à mudança de estratégia política de Carlos V se sentimental, foi rapidamente ultrapassada por um sentido de Estado quase inato que sempre caracterizou e, sua actuação. Veja-se como exemplo a carta que escreveu a Maria Tudor, de Setembro de 1553 (as negociações foram interrompidas em Julho), exprimindo a felicidade que sentia pela conclusão favorável dos seus negócios. D. Leonor, mesmo contrariada, não desiste de reaver a filha, e depois do desaire do casamento com Filipe II pressiona o irmão para que reclame junto da coroa portuguesa a ida da Infanta para Castela; será esta a razão porque Carlos V atrasou a sua entrada no Mosteiro de Juste. D. Leonor envia logo a Portugal, para não perder tempo enquanto fazia a fatigante viagem para Castela, o embaixador João Mendonça com cartas de Carlos V, de Filipe I e suas para João III.
Carlos, Leonor e Maria da Hungria chegam a Castela, tendo as duas últimas ficado em Valladolid, onde se juntaram à princesa D. Joana que para aí voltara depois de ficar viúva de João de Portugal. É então que chega a primeira negativa, pelo embaixador Duarte Almeida, de João III baseada na falta de decoro que era a saída da Infanta de Portugal sem estar casada. A resposta do rei português não agradou aos seus interlocutores e Carlos V envia a Portugal Sancho de Córdova com a missão de levar consigo a Infanta, sem qualquer hipóteses de desculpa. Escreve cartes a João III e a D. Catarina onde dá conta da sua vontade, cuja base legal se encontra no contrato de casamento de Manuel I com D. Leonor.
D. Leonor escreve também uma carta à irmã, a rainha D. Catarina, na qual, junto com as palavras de reverência e afecto, encontramos outras de ressentimento e diplomática dúvida quanto às intenções dos reis portugueses. Sancho de Córdova chega a Lisboa e entrega as cartas, quando João III decide enviar Lourenço Pires Távora ao imperador e às rainhas viúvas de França e Hungria. Este embaixador levava novas propostas de casamento para a Infanta, desta vez com o velho Imperador dos Romanos e seu tio, ou com o seu filho segundo também de nome Fernando. Estávamos no ano de 1557; a Infanta tinha 36 anos. É o próprio rei que faz e proposta do noivo à Infanta: Y porque el rey Don Fernando se halla viudo, y es la Magestad mas digna de vuestros meritos, que quantos principes ay de presente en Europa, y que en breue serà Emperador por la renunciacion que haze en el Carlos vuestro tio, parece que se deue tratar luego deste casamiento, por los medios que sean mas efectiuos. Se nos alhearmos das interpretações algo tendenciosas do biógrafo da Infanta e de Carolina Michaëlis, nada na documentação de per si nos permite concluir que João III utilizou esta proposta de casamento como forma de dilatar as negociações para a saída da Infanta». In A Infanta Dona Maria de Portugal, o Mecenato de uma Princesa Renascentista, Fundação Oriente, 1998, ISBN 972-9440-90-5.