domingo, 16 de dezembro de 2018

A Verdadeira História. Margaret George. «Maria não falara mais do que umas 20 palavras com ele. Se estava interessado, por que não havia conversado a sós com ela? Ela ia muitas vezes ao armazém»

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A Mulher que Amou Jesus
«(…) Parece um bom rapaz, disse Natã ao jantar, com uma certa simpatia na voz.  Passou um pouco de pasta de figo no pão e esperou. Também achei, concordou Zebida. Uma família que se opôs à admissão de Diná, pode opor-se a qualquer coisa, disse Silvanus, referindo-se à mulher de Eli. Ainda mais rigorosa que Eli na sua observância da Lei religiosa, Diná trouxera uma grande alegria para a família, mas também uma certa mágoa. Assim como na Páscoa, ela tornara qualquer refeição um exercício de despojamento e de pureza ritual. Devido a isso, eles raramente faziam as refeições com Eli e Diná. Os três voltaram os seus olhos para Maria, cuja opinião seria a mais importante. Afinal, seria ela que teria de viver com ele.
Eu... As palavras saíam com dificuldade. Seus pensamentos pareciam confusos, presos. O que pensava ela de Joel, o rapaz que já trabalhara vários anos para o comércio da família e estava agora disposto a fazer parte dela? Era um belo rapaz, de uma família respeitável da cidade vizinha de Naim, tinha 32 anos, atraente e dava-se bem com todas as pessoas. Maria não falara mais do que umas 20 palavras com ele. Se estava interessado, por que não havia conversado a sós com ela? Ela ia muitas vezes ao armazém. Todos os olhos postos nela. Eu..., acho..., que não me importo. Não era isso que queria dizer! O que se passava com ela? Sentia a cabeça flutuar e as suas palavras não reflectiam os seus sentimentos. E isso não era de hoje. Já o percebera havia vários meses. Era por causa, devia ser isso, do problema que tinha para dormir. No Inverno passado, o sono pesado que sempre tivera abandonou-a, dando lugar a sonhos terríveis, e bem nítidos, ou então a insónias intermináveis. E o seu quarto tornara-se muito frio, quando o resto da casa era confortável.
Seu pai procurara ver se haviam fendas na parede, por onde passasse o vento, mas não encontrara nada. Ela acabara por colocar mais cobertas por cima. A insónia deve estar prejudicando-me, pensou Maria. Parece que não consigo pensar. Ou reagir. Mas o assunto é o casamento! Uma coisa que quero e não quero; uma coisa que pode arruinar minha vida, se fizer uma escolha errada. Há anos que venho tendo medo deste dia. Para a família, já vem sendo adiado demais, mas não, para mim. Natã inclinou-se para a frente. Uma resposta muito hesitante para uma pergunta muito importante, disse. Não me importo pode servir para resolver se vamos ou não dar um passeio, mas decididamente não é uma resposta adequada para uma proposta de casamento. Eu... O que é que ele propôs, de facto?, perguntou Maria. Talvez pudesse decidir se soubesse dos detalhes. Disse que se uniria a nós nos negócios de família e que se mudaria para Magdala. Não teria de ir morar com a família dele.
Isso era bom. Maria não queria ir morar com uma sogra e tomar conta de uma família que não conhecia, embora isso fosse uma prática comum. Disse que traria um razoável mohar, o seu dote de casamento, e que a cerimónia seria no ano que vem. Estará com 17, e ele com 23 anos. Uma boa idade para ambos. O que acham os rabinos? Até os mais liberais acham que 24 é uma idade limite para um homem se casar. Talvez ele esteja preocupado com as expectativas, disse Maria. Talvez o pai dele o esteja obrigando a casar-se. Essa era uma maneira de ser tipicamente sua. Abanou a cabeça para esquecer o que dissera. E daí?, disse sua mãe. O que importa é que é um bom homem, de uma boa família e que os dois se entendem bem. E tem ambições. Eu nem sei se gosto dele. Nem tenho certeza se o reconheceria, se o visse no mercado.
Silvanus reflectiu, como se fosse um escriba que estivesse avaliando a situação. Eu penso que quando escolhemos o nosso jumento fomos mais criteriosos do que estamos sendo agora, deixou escapar. O seu pai franziu a testa. Isso é uma tolice. É claro que tivemos de fazer mais perguntas sobre o jumento, pois ele não sabia falar! Mas com um homem é diferente. É diferente?, perguntou Maria. E o que é que ele disse?» In Margaret George, A Paixão de Maria Madalena, 2002, Saída de Emergência, Edições Fio de Navalha, 2005, ISBN 972-883-911-1.
                                       
Cortesia de SdeEmergência/JDACT