domingo, 15 de agosto de 2010

Portalegre: Igreja e Convento de Santa Clara. Da construção original, erguida nos primeiros anos da dinastia de Avis, podemos observar «doze arcos quebrados assentes em duplas colunas com capitéis geminados, de feitura muito simples e sem ornamentos; estão dispostos em séries de quatro, ritmados por panos lisos de parede»

Cortesia do Arquivo do Norte Alentejano
Com a devida vénia a Ruy Ventura e ao Arquivo do Norte Alentejano publico a notícia.

Segundo rezam as crónicas dos franciscanos portugueses, o mosteiro de Santa Clara de Portalegre foi fundado na segunda metade do século XIV por Maria Fernandes e Elvira Anes, senhoras que em casa particular «se occupavam em devotos e espirituaes exercicios, pelos quaes conseguirão de Deos a santa inspiração, que as moveo a tão boa obra».

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Socorrendo-se do auxílio do rei D. Fernando, conseguiram para assento da casa conventual a doação em 1370 dos paços reais e de uns banhos anexos. Foi-lhes dada ainda autorização para «tomarem todas as casas contiguas ao mesmo Palacio, e que se pudesse tapar as serventias das ruas, que lhes fossem precisas para a fundação». Alvo de contestação na então vila, o alvará que isto determinava foi confirmado pelo rei «Formoso» em 21 de Março de 1377, pela rainha regente D. Leonor Teles de Meneses em 1383 e por D. João I em 12 de Fevereiro de 1433.

Construída a habitação monástica, a igreja foi dedicada em 1389 por Francisco, Bispo da ordem franciscana, o qual consagrou o altar mor do templo a Santa Clara e a Santa Bárbara. Eram padroeiros da igreja os reis de Portugal.

Cortesia de alexandreribeirophotography1
O convento de Portalegre pertenceu até 1534 aos Padres Claustrais, data em que passou para os Observantes. Em 1537 voltou à primeira obediência, assim se conservando cinco anos - até 1542, ano em que D. João III conseguiu do papa Paulo III a reforma dos Claustrais, passando definitivamente para a jurisdição dos religiosos observantes da Província dos Algarves da Ordem de São Francisco.

Visitado por Filipe II de Espanha quando se deslocou ao nosso país, um breve de Paulo V datado de 1615 e aplicado em 1620 fixou em sessenta o número de freiras do mosteiro.

Cortesia de cm-portalegre
O edifício recebeu várias alterações e acrescentos nos séculos que seguiram a construção, embora as de maior vulto se devam ao século XVI e a finais de setecentos (1797), altura em que a abadessa Rosa Joana de São Francisco de Assis deu ao interior da igreja a feição rococó que ainda hoje apresenta.
Extintas as ordens religiosas a partir de 1834, por morte da última abadessa foi transformado em recolhimento de senhoras pobres. Nos primeiros quartéis do século XX foi ocupado por instituições de assistência social.
Depois de 1974 serviu de abrigo a várias instituições culturais de Portalegre. Restaurado, o convento de Santa Clara abriu em 1999 como Biblioteca Municipal do concelho.

Recuperado para as funções culturais que desempenha neste momento, o espaço conventual reflecte as múltiplas vicissitudes a que esteve sujeito na sua arquitectura ao longo dos vários séculos da sua história. Da construção original, erguida nos primeiros anos da dinastia de Avis, podemos ainda observar dois tramos térreos do claustro: «doze arcos quebrados assentes em duplas colunas com capitéis geminados, de feitura muito simples e sem ornamentos; estão dispostos em séries de quatro, ritmados por panos lisos de parede» (Rodrigues & Pereira, 1988: 21 - 24).

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Ao século XVI pertencem as restantes partes do claustro. No piso térreo vemos dois tramos «um tanto incaracterísticos, num estilo chão de arcaria ampla de volta inteira», atribuídos aos anos 60 ou 70 de quinhentos (Rodrigues & Pereira, 1988: 21 - 24). Da mesma época são as arcadas do primeiro piso, com colunas de mármore com capitéis muito simples e arcos de volta perfeita em alvenaria. A este século pertencem ainda a portaria do mosteiro voltada à Rua de Santa Clara (com decoração renascentista), a cabeceira da igreja (com cachorrada, janelas de quarto de círculo e esgrafitos) e a fonte de mergulho virada à Rua de Elvas (com arcos geminados separados por um mainel, obra do início da centúria). Desta época é ainda a torre sineira, que funcionava também como mirante, possuindo janelões com adufas, num tom arabizante, e lanternim fenestrado.

Ao século XVIII correspondem várias construções e acrescentos. São de destacar uma fonte em mármore (de secção triangular, situada no centro do claustro), uma capela mandada construir em 1749 por Soror Inês de Santa Clara (no piso térreo do mesmo, ainda com vestígios de decoração mural) e a igreja.
O templo conventual apresenta a aparência que lhe foi dada em 1797. Abandonado e coberto pela fuligem que ficou de um incêndio ocorrido em 1995, foi restaurado recentemente pelo Estado – para ser de novo ocultado pelas actividades de um grupo de teatro portalegrense, ao qual o templo foi cedido pela Câmara Municipal.

Cortesia de lifecooler
Possui duas entradas laterais: uma virada à habitação monástica; outra virada ao exterior, embora recolhida dentro de um pátio com entrada pela Rua de Santa Clara. Artisticamente cuidada, esta apresenta um portal em mármore no estilo comum do século XVIII, sobrepujado por um janelão com moldura em alvenaria. Decoração em massa reveste também o interior da igreja. Nela merecem relevo o retábulo do altar mor, em talha rococó polícroma - com trono ladeado por dois pares de colunas e frontão interrompido -, e dois púlpitos em alvenaria num estilo semelhante, com elegantes dosséis em madeira entalhada. Ao fundo deste espaço destacam-se as aberturas gradeadas correspondentes ao coro de cima e ao coro de baixo. Em dependências anexas podemos observar alguns azulejos de tapete, do século XVII, e fragmentos de uma pintura mural representando dois santos franciscanos.

O estado de conservação do convento é muito bom. Falta apenas uma utilização digna da arte e do espírito da igreja. O que sobrou do rico recheio do Convento de Santa Clara de Portalegre pode ser visitado no Museu Municipal da cidade, embora a identificação das peças seja nula. In cortesia de Ruy Ventura.

Cortesia de Arquivo do Norte Alentejano/JDACT