segunda-feira, 28 de abril de 2014

Eleonor na Serra de Pascoaes. António Cândido Franco. «Maís tarde, por várias vezes, voltei à carga. E naquelas luminosas férias que passámos na Foz, na Praia dos Ingleses, muitas vezes Pascoaes me falou de Fernando Pessoa com estima e admiração»

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«(…) Teixeira de Pascoaes deixou por várias e cruciais vezes claramente expresso o interesse que lhe merecia a obra de Fernando Pessoa, em primeiro lugar dando-lhe como director a vez de primeiro articulista da revista A Águia, reconhecendo assim a Fernando Pessoa um talento que talvez não reconhecesse a qualquer outro colaborador da revista, coisa que muito feriu António Sérgio, e tornando-se desse modo o primeiro fernandino do século XX. Esta admiração, que começou em 1912, parece ter sempre acompanhado Pascoaes, que, por volta de 1950, pouco antes de morrer, a confessou a Eugénio de Andrade. Maís tarde, por várias vezes, voltei à carga. E naquelas luminosas férias que passámos na Foz, na Praia dos Ingleses, muitas vezes Pascoaes me falou de Fernando Pessoa com estima e admiração. E a prová-lo aí está, essa discreta homenagem, a citação, num dos poemas dos Últimos Versos, de uma frase tirada de uma carta do autor da Ode Marítima. Ao entregar-me o original, o próprio Pascoaes me chamou a atenção. (in Os Afluentes do Silêncio, 1968).
Depois da Renascença Portuguesa, sobretudo depois da polémica com António Sérgio que teve lugar entre 1913 e 1914, Pascoaes abandona não só praticamente as relações com os seus contemporâneos, isolando-se na sua casa de São João do Gatão, como deixa de escrever e de publicar poesia em verso com a frequência e a intensidade com que o fazia até aí. Repare-se que entre 1895 e 1915, ou seja em vinte anos, Pascoaes publica dezassete livros de poesia, quase um livro por ano, e entre 1915 e o ano da sua morte em 1952, ao longo de trinta e sete anos, Pascoaes publica apenas dez livros de poesia. Dos dez livros publicados entre 1915 e 1952, dois deles, pelo menos, não são inéditos: Sonetos (1925), que faz uma recolha de textos anteriores do poeta e Elegia do Amor que reedita (revisto) um poema (de resto muito importante para se compreender Marânus) já publicado em 1906 em Vida Etérea. Em 1953, meses depois da morte do poeta, saiu um outro importante livro seu de versos, escrito nos últimos anos da sua vida, Últimos Versos.
Por estas duas razões, o afastamento dos centros urbanos e das modas literárias bem como um interesse cada vez maior pela poesia em prosa, e ainda decerto por outras razões que aqui nos escapam, difícil é dizer e saber quem foram verdadeiramente os contemporâneos de Pascoaes desde 1915 até à data da sua morte. As últimas páginas do capítulo VI de Os Poetas Lusíadas apontam alguns nomes, a que seria de justiça acrescentar mais dois ou três (como Guilherme de Faria, Anrique Paço d'Arcos, José Gomes Ferreira ou mesmo Domingos Monteiro, considerado por Pascoaes poeta lusíada), mas o certo é que a partir de determinada altura, que coincide com a dolorosa despedida a António Sérgio, Pascoaes deixou, pelo afastamento, de ter entre nós contemporâneos. As palavras de Sant’Anna Dionísio (e também as de Ilídio Sardoeira) são significativas do isolamento em que o poeta e a sua poesia passaram a viver». In António Cândido Franco, Eleonor na Serra de Pascoaes, Edições Átrio, Lisboa, Colecção o Chão do Touro, 1992, ISBN-972-599-042-0.

Cortesia de Átrio/JDACT