sábado, 22 de agosto de 2015

A Conquista de Ceuta. 1415. João G. Monteiro e António M. Costa. «Juntos à terceira porta, o combate tornou-se especialmente rijo, com os mouros a meterem as suas azagaias, lanças curtas, rente ao solo, de maneira a ferirem as pernas dos nossos combatentes»


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«… E foi assim que o infante Henrique, intrépido e ávido de ganhar naquele dia as suas esporas de cavaleiro, avançou em direcção ao castelo. Baixou a viseira do seu bacinete, embraçou o escudo que trazia e pôs em fuga um grupo de mouros que perseguia as centenas de cristãos que tinham logrado forçar a entrada pela Almira. Na rua Direita, encontrou uma porta reforçada por uma barbacã, o que lhe deu um bom pretexto para testar a fortaleza dos seus membros grossos e viris, no auge das suas vinte e uma primaveras. A investida foi tal que os inimigos se tiveram de abrigar na junção de três muros, desencadeando a partir daí um contra-ataque apoiado. Nessa altura, Henrique já só podia contar com a ajuda de 17 homens da sua coluna de ataque, pois a sede, o cansaço e a ganância do saque tinham deixado os restantes para trás. Ainda assim, aguentou ali, estoicamente, durante duas horas e meia.
Isso não foi, porém, suficiente para saciar o desejo de glória do infante: repelidos os adversários, decidiu avançar com apenas quatro companheiros, Álvaro Fernandes Mascarenhas, Vasco Esteves Godinho, Gomes Dias Góis, todos eles servidores da sua Casa, e Fernão Álvares, um escudeiro do rei que queria muito bem a Henrique e que tinha vontade de se colocar ao seu serviço. Mas ai onde eles se foram meter! Entre uma porta colocada junto à robusta muralha coroada por duas filas de ameias e uma torre de estrutura abobadada munida de aberturas para o despejo de pedregulhos e de líquidos incendiários pelos sitiados, saía um caminho estreito que partia de uma segunda entrada e que conduzia os assaltantes entre o muro e a barbacã, até se chegar a uma terceira porta. A concentração de guerreiros era ali de tal ordem que os de dentro receavam lançar pedras sobre os cristãos, com medo de acertarem nos seus próprios homens…
Juntos à terceira porta, o combate tornou-se especialmente rijo, com os mouros a meterem as suas azagaias, lanças curtas, rente ao solo, de maneira a ferirem as pernas dos nossos combatentes. A situação tornou-se desesperada e quem se apercebeu do perigo deu logo o infante morto. A notícia correu célere e chegou aos ouvidos de João I, que reagiu de coração apertado à ideia da perda, sem contudo deixar de salientar que o mais importante era que ele tinha morrido honradamente, no cumprimento do seu ofício de homem de armas…» In João Gouveia Monteiro e António Martins Costa, 1415, A Conquista de Ceuta, Manuscrito, 2015, ISBN 978-989-881-804-1.

Cortesia de Manuscrito/JDACT