domingo, 21 de abril de 2013

Henrique III. França. Soberano assassinado por um fanático religioso. Américo Faria. « A sua coroação como rei da França é assinalada com vibrantes festejos. As populações, cansadas de guerras internas, que impediam o franco progresso do reino, desejando ardentemente viver…»

Cortesia de wikipedia

«Da copiosa prole de Henrique II, da França, e de sua mulher, a intolerante Catarina de Médicis, três filhos cingiram sucessivamente a coroa daquele país:
  • Francisco II, o enfermiço e meteórico primeiro marido da desventurada Maria Stuart; 
  • Carlos IX, morto, prematuramente, em 1574, vitimado pelos excessos de libertinagens romanas em que mergulhara pela vida fora e, um pouco, presa de remorsos por ter provocado, a instâncias de sua mãe, a odienta e estéril carnificina de S. Bartolomeu, em que pereceram alguns milhares de huguenotes;
  • por último, o amoral e efeminado Henrique III, que não teve muito melhor destino.
De nenhum deles se pode afirmar que tivesse sido feliz. Mas, dos três, o último foi o que viu o seu reinado mais dificultado por complicações de ordem vária foi, também, o único que, na flor da vida, na idade de trinta e oito anos, viria a sofrer morte violenta. Poucas seriam, porém, as pessoas que lhe profetizaram a sorte que teve, tão auspicioso foi o seu nascimento, em 1551, no castelo de Fontainebleau, essa dourada jóia da arquitectura francesa a que Francisco I, o Rei Magnífico, dispensara tão grandes e desvelados cuidados. Com o título de duque de Anjou foi desde logo agraciado.
O reino vivia, então, separado em zonas de influência dos grandes senhores, e era permanentemente perturbado pelas graves dissidências internas, que tinham a religião por fulcro e que acendiam guerras de vida e de morte entre Católicos e Protestantes, com sorte alternada para ambos os contendores. Na corte também os partidos divergentes se combatiam, mas, aqui, a luta era insidiosa, de intrigas e de inteligência, não obstante a severidade da rainha para todos aqueles que não professassem o Catolicismo.
Neste ambiente de subtilezas e hipocrisias, se desenvolveu o jovem príncipe Henrique, formando o seu carácter, a que, sem dúvida, faltaram os predominantes traços de integridade que o pudessem impor, senão à admiração, pelo menos à consideração do reino. Filho amimado e favorito da rainha-mãe, Catarina, aproveitando a morte do condestável de Montmorency, em 1567, confia-lhe, com o título de tenente-general do reino, o comando geral dos exércitos franceses, o que seria louca temeridade se não tivesse ao lado a experiência e o saber de bons generais.
Henrique, em contacto com os rudes e varonis soldados e arrancado ao ambiente amolecente da corte, poderia, porventura, integrar-se no carácter masculino e abandonar certos costumes reprováveis (que não ocultava) se não os tivesse já na massa do sangue. As suas forças encontram-se com a tropa dos Huguenotes em 1569 e sobre elas obtém as retumbantes vitórias de Jarnac e de Montcontour, conseguindo desbaratar o inimigo. Tais vitórias, mais devidas ao talento do seu ajudante, o marechal de Tavannes, do que a ele, valeram-lhe, contudo, em grande parte, ter sido escolhido, em 1573, pelos polacos para sucessor do seu rei Segismundo Augusto, morto sem herdeiro varão. Contava ele, nessa altura, vinte e três anos de idade.
Poderia augurar-se-lhe melhor futuro? Na realidade, a sua fama de combatente ofuscava a dos mais conhecidos e hábeis generais e, sendo um terceiro filho, a sorte parecia bafejá-lo, colocando-lhe inesperadamente uma coroa real na cabeça, quando, decerto, tinha afastado do espírito tal hipótese. A Polónia era, por esses tempos, um país de certa maneira atrasado, e os polacos esperavam do novo rei uma acção benéfica que desse poder ao reino e condições de resistência aos ataques e às ambições vorazes dos possantes e cobiçosos vizinhos. Ora, um guerreiro com tão boas provas prestadas satisfaria, possivelmente, os anseios patrióticos dos polacos. No entanto, o destino de Henrique Valois estava marcado de modo algo diferente. Breves meses ele se conservou sentado no trono da Polónia. Com efeito, no ano seguinte, em 1574, surpreendeu-o a morte inesperada do irmão Carlos IX. Era mais um golpe da boa fortuna a favorecê-lo.
Henrique torna-:se o natural herdeiro da aureolada coroa da França. Entre as duas nações que lhe apresentavam o ceptro real, não podia hesitar. A França era a sua pátria de berço e nação prestigiosa, poderosa. A gente era da sua raça e a sua corte era-lhe familiar. Por seu turno, a Polónia carecia de atractivos para si e o ambiente em que ali se movia não tinha os mesmos deslumbrantes encantos da vida francesa.
A sua coroação como rei da França é assinalada com vibrantes festejos. As populações, cansadas de guerras internas, que impediam o franco progresso do reino, desejando ardentemente viver numa atmosfera calma de labor profícuo, deposita as maiores esperanças no advento do novo reinado. Aos olhos dos Franceses enganados, Henrique era um chefe hábil e enérgico, ao que supunham, sendo por isso, de aguardar uma radical mudança na política do trono, e o principal factor para tanto seria exactamente o apaziguamento das várias facções religiosas que se afrontavam e disputavam entre si a supremacia do poder. Esperava-se que ele soubesse harmonizar os desavindos chefes das seitas e conduzisse o país por um rumo que o fortalecesse, ao contrário do que estava a acontecer». In Américo Faria, Dez Monarcas Infelizes, Livraria Clássica Editora, colecção 10, Lisboa, s/d.

Cortesia de Livraria Clássica Editora/JDACT