segunda-feira, 26 de novembro de 2012

Escritores. São Tomé e Príncipe. Caetano da Costa Alegre. «Apesar de um estilo diferente do europeu, os temas da sua obra convertem-no num precursor dos escritores e poetas africanos posteriores, que trataram do tema racial, a alienação, as recordações nostálgicas do passado, as suas reminiscências de São Tomé».


(1864-1890)
S. Tomé e Príncipe
Cortesia de wikipedia

Visão
Vi-te passar, longe de mim, distante,
como uma estátua de ébano ambulante;
ias de luto, doce, tutinegra,
e o teu aspecto pesaroso e triste
prendeu minha alma, sedutora negra;
depois, cativa de invisível laço,
(o teu encanto, a que ninguém resiste)
foi-te seguindo o pequenino passo
até que o vulto gracioso e lindo
desapareceu, longe de mim, distante,
como uma estátua de ébano ambulante.
In Caetano da Costa Alegre

«A questão da identidade nacional e, consequentemente, a tomada de consciência de pertença a um lugar, ou uma nação, salta para a ribalta com maior enfoque a partir do movimento romântico, desde os finais do século XVIII. Contudo, a identidade configura um tema complexo devido ao carácter polissémico no sentido de encerrar uma grande diversidade de conotações. Porém, na nossa dissertação, propomos falar da identidade nacional focando a política de afirmação e de construção da identidade tal como foi tratada pelo romantismo, visto o autor de que nos ocupamos, Caetano da Costa Alegre ter vivido e escrito a sua obra em finais do século XIX.
Durante muito tempo as sociedades utilizaram a história para tentar abrigar povos de diferentes origens e, consequentemente, de diferentes culturas numa unidade que era dado o nome de nação. Firmados nesse princípio, visavam a construção da identidade de sentido agregador com o objectivo fixo da “expressão de um carácter nacional”. Assim, considerava-se negativa a diversidade cultural na composição de determinada nação, valorizando-se na história aquilo que convergia para a evolução tomada como prática reguladora da visão da identidade.
Contudo, essa visão começa a mudar a partir do momento em que nas sociedades contemporâneas. Nelas, vão surgindo diferentes vozes que reivindicam o estatuto da diferenciação, apoiadas numa revisitação do passado histórico onde encontram formas de representação de determinada identidade diferenciada, se não propriamente nacional, de certa maneira cultural própria, e assim insistirem mais ideia de pluralidade do que de unidade na composição de uma sociedade. Enquanto uns se valiam do princípio da história linear para afirmar a identidade individual outros apontavam o princípio não sequencial da história, decorrente dos grupos minoritários para a formação de uma identidade cultural, ou seja, identidade colectiva. A identidade individual era formada através das transformações históricas, já a identidade cultural era reivindicada a partir da história fragmentada por favorecer as conexões entre tempos de passado e de presente. Esta representa um papel fundamental na elaboração da consciência nacional, pois tende a formar os pontos de convergência do sentimento de identidade comprimido durante muito tempo pelo opressor favorável à assimilação. É sob este ponto de vista problemático que se pode colocar com mais amplitude a questão de uma comunidade que visa a construir a sua identidade nacional.
A narrativa da nação contada nas histórias e nas literaturas nacionais fornece estórias, imagens, cenários, panoramas, símbolos e rituais nacionais que servem de suporte que darão sentido à visão de nação que se quer para uma determinada colectividade. Assim, como forma de encontrar uma identidade de características próprias, povos de diferentes culturas procuraram mecanismos através dos quais pudessem encontrar alternativas que possibilitassem o aparecimento dos aspectos culturais específicos de uma dada colectividade. Esse aspecto torna-se ainda mais pertinente quando se refere a identidade de um determinado grupo que nunca teve a sua história contada até ao momento em que começa a ser problematizada. Segundo Hall e referenciando Koberna Mecer, “a identidade somente se torna uma questão quando está em crise, quando algo que se supõe fixo, coerente e estável é deslocado pela experiência da dúvida e da incerteza”.


O conceito da identidade global começa a ser questionado quando o grupo minoritário se recusa à condição de cultura periférica, marginal e reivindica um estatuto autónomo interior do campo instituído e onde se vê incluída. Essa nova forma de pensar transforma-se em desafio para as literaturas emergentes responsáveis pela elaboração da consciência nacional contemporânea e, portanto, por uma nova forma de rever a questão da história de modo a que esta contemple a história dos grupos periféricos. Assim, no intuito de afirmar uma identidade nacional, o passado histórico serviu como uma forma de afirmar ou constituir um imaginário nacional pautado numa visão simbólica de identidade.
Enquanto movimento histórico, o Romantismo é resultado de duas revoluções, a Revolução Francesa e a Revolução Industrial, e coincide com a ascensão política e económica da burguesia europeia. O romantismo foi gerado a partir de uma escola que se pautava pela evocação do popular, do medievo, do exótico, pela exaltação da liberdade:
  • liberdade política, a vontade do rei deixou de ser soberana para o romântico;
  • liberdade moral, a norma de moralidade não é construída pelos ditames da razão, muito menos pelas crenças religiosas, apesar de reconhecer a necessidade afectiva de Deus e da religião;
  • liberdade nos sentimentos, o romântico deixava-se arrastar pelas emoções violentas.
E, sobretudo, pelo culto do ‘eu’ individual. O objectivismo absorvente e a sujeição às regras do neoclassicismo serão postos de lado para dar lugar a um espírito individualista, caracterizado pela exaltação da própria personalidade do poeta romântico». In Instituto Camões.

Cortesia de I. Camões/JDACT