sexta-feira, 26 de janeiro de 2018

As Egípcias. Christian Jacq. «As portas da morte abriram-se diante de Ísis, que conheceu o segredo fundamental, a ressurreição, agindo como nenhuma deusa o fizera antes: ela, a quem chamavam a Venerável…»

Cortesia de wikipedia e jdact

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A paixão e a demanda de Ísis
Ísis, a Grande, reinara nas Duas Terras, o Alto e o Baixo Egipto, muito antes do nascimento das dinastias. Em companhia do seu esposo Osíris, governava com sabedoria e conhecia uma felicidade perfeita. Até que Set, irmão de Osíris, o convidou para um banquete. Tratava-se de uma cilada, pois Set estava decidido a assassinar o rei para ocupar o seu lugar. Utilizando uma técnica original, o assassino pediu ao irmão que se deitasse num caixão para ver se era do seu tamanho. Imprudente, Osíris aceitou. Set e os seus acólitos pregaram a tampa e lançaram o sarcófago ao Nilo. Os pormenores desta tragédia são conhecidos graças a um texto de Plutarco, iniciado nos mistérios de Ísis e Osíris; as fontes mais antigas mencionam apenas a morte trágica de Osíris, cujas desgraças prosseguiram, pois o seu cadáver foi retalhado. Set convenceu-se de que aniquilara o seu irmão para sempre. Ísis, a viúva, recusou a morte.
Mas o que podia ela fazer, além de chorar o marido martirizado? Um projecto insano nasceu no seu coração: encontrar todos os pedaços do cadáver, reconstituí-lo e, graças à magia sagrada cujas fórmulas conhecia, restituir-lhe a vida. Assim começou a busca de Ísis, paciente e obstinada. E quase conseguiu! Todas as partes do corpo foram reunidas menos uma: o sexo de Osíris, engolido por um peixe. Desta vez, Ísis tinha de desistir. Mas não desistiu: convocou a irmã Néftis, cujo nome significa a senhora do templo, e organizou uma vigília fúnebre. Eu sou a tua irmã bem amada, disse ela ao reconstituído cadáver de Osíris, não te afastes de mim, clamo por ti! Não ouves a minha voz? Venho ao teu encontro, e nada me separará! Durante horas, Ísis e Néftis, de corpo puro, inteiramente depiladas, com perucas encaracoladas, a boca purificada com natrão (carbonato de soda), pronunciaram encantamentos numa câmara funerária obscura e perfumada com incenso, Ísis invocou todos os templos e todas as cidades do país para que se juntassem à sua dor e fizessem a alma de Osíris regressar do Além. A viúva tomou o cadáver nos braços, o seu coração bateu de amor por ele e murmurou-lhe ao ouvido: tu, que amas a vida, não caminhes nas trevas. O cadáver, desgraçadamente, permaneceu inerte. Ísis transformou-se então num milhafre fêmea, bateu as asas para restituir o sopro da vida ao defunto e pousou no sítio do desaparecido sexo de Osíris, que fez reaparecer por magia.
Desempenhei o papel de homem, afirma ela, embora seja mulher. As portas da morte abriram-se diante de Ísis, que conheceu o segredo fundamental, a ressurreição, agindo como nenhuma deusa o fizera antes: ela, a quem chamavam a Venerável, nascida da Luz, saída da pupila de Hator (o princípio criador), conseguiu fazer regressar aquele que parecia ter partido para sempre e ser fecundada por ele. Assim foi concebido o seu filho Hórus, nascido da impossível união da vida e da morte. Um acontecimento importante, porque este Hórus, filho do mistério supremo, foi chamado a ocupar o trono do pai, doravante monarca do Além e do mundo subterrâneo. Set não se deu por vencido. Só havia uma solução: matar Hórus. Ciente do perigo, Ísis guardou o filho entre os papiros do Delta. Não faltaram perigos a enfermidade, as serpentes, os escorpiões, o assassino que ronda..., mas Ísis, a Maga, conseguiu preservar o seu filho Hórus de todas as desgraças. Set não admitiu o seu fracasso e contestou a legitimidade de Hórus, que era no entanto sobrenatural, convocando então o tribunal das divindades a fim de conseguir a condenação do herdeiro de Osíris. Como o tribunal se reuniu numa ilha, Set usou o seu engenho para que uma decisão iníqua fosse adoptada: o barqueiro devia impedir as mulheres de entrarem na sua barcaça, e assim Ísis não poderia defender a sua causa. Mas iria a viúva desistir ao cabo de tantas provações? Por conseguinte, convenceu o barqueiro oferecendo- lhe um anel de ouro; apresentou-se diante do tribunal, venceu a má fé e os argumentos especiosos e fez aclamar Hórus como faraó legítimo». In Christian Jacq, As Egípcias, Edições ASA, 2002, ISBN-978-972-413-062-0.

Cortesia de EASA/JDACT