quarta-feira, 25 de março de 2020

Condessa de Barral (1816-1891). A Paixão do imperador. Mary del Priore. «Em Setembro de 1821, a Bahia elegeu nove deputados para representá-la nas Cortes, entre eles Domingos. Ele saiu daqui levando consigo uma agenda revolucionária…»

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O nascimento da camaleoa
«(…) Do outro lado, havia os que, como o inspector-geral militar, Pedro Caldeira Brandt, endossavam a violência pura e simples. Este poderoso senhor de engenho, além  de conservador, era adversário do avô de Luísa, Pedro Alexandrino Souza Portugal. Os dois chegaram às vias de facto. Portugal ousou insultar publicamente Brandt e sofreu corte marcial. Foi absolvido por influência dos parentes, inclusive do genro, que já brilhava nos salões e na arena política baiana. Houve, portanto, duas razões para que Luísa se alinhasse com o pensamento abolicionista: as querelas familiares contra os conservadores e os princípios de Domingos. O prolongamento da infância entre o engenho São João e a cidade de Salvador foi, contudo, abortado pela decisão do pai de ir para a Europa. No pano de fundo se desenhava uma participação cada vez maior de Domingos Borges Barros nas tensões que opunham brasileiros e portugueses. Factos importantes se acumularam naqueles últimos anos. A revolução liberal do Porto, em Agosto de 1820, criou uma monarquia constitucional em Portugal e estabeleceu as Cortes, o parlamento português, como órgão supremo da administração da metrópole e de seus domínios. Foram as Cortes que solicitaram o retorno de João VI à Europa em 1821, deixando seu filho Pedro na função de príncipe regente. Inicialmente, a revolução criou a expectativa de que o Brasil seria agraciado com um grau maior de autonomia.
Em Setembro de 1821, a Bahia elegeu nove deputados para representá-la nas Cortes, entre eles Domingos. Ele saiu daqui levando consigo uma agenda revolucionária: a emancipação política da mulher e a libertação dos escravos. Em Janeiro de 1822, foi eleita uma nova junta governativa com representantes das classes ricas da província, do clero, da magistratura e dos militares. Mas uma carta régia, chegada um mês depois, determinava que o comandante de armas fosse um português, o que foi considerado um retrocesso inadmissível. Enquanto a junta debatia a legitimidade da nomeação, a população da Bahia acentuava a sua divisão em campos opostos: os que estavam a favor de Portugal e os que estavam contra.
Do lado português, contavam-se cerca de 1.700 homens armados e os próprios imigrados que controlavam a quase totalidade do comércio na província. O lado brasileiro era bem mais variado. Reunia militares, o povo pobre da cidade, profissionais liberais, a elite representada pelos senhores de engenho e uns poucos comerciantes. Existia ainda um terceiro grupo: o dos negros, escravos, forros e livres. Não havia objectivo definido ou unidade estratégica entre os brasileiros. Havia desde os que queriam a conciliação da colónia com a metrópole em bases tradicionais até os que propunham a independência e a instalação de uma república». In Mary del Priore, Condessa de Barral, A Paixão do imperador, Editora Objetiva, 2008, ISBN 978-857-302-923-9.

Cortesia de Objetiva/JDACT