domingo, 10 de julho de 2011

Tomar: Pedras Mágicas. Parte II. «Pedras mágicas no convento são as da janela do capítulo, com quatro metros de altura. Estava incorporada na nave que Dom Manuel mandou fazer para ampliar a igreja templária, depois do descobrimento do caminho marítimo para a Índia»

Cortesia de cmtomar 

A Festa dos Tabuleiros é preparada quase em segredo por centenas de pessoas que, durante meses, recortam milhares e milhares de flores e ornamentos em papel - para as ruas do centro histórico de Tomar e para os 700 tabuleiros que este ano desfilarão.

Pedras Mágicas.
«Da memória dos tempos vêm outros sinais, como uma pedra romana que indicia a presença remota no lugar. Ou, mais junto do rio Nabão e ainda perto da roda hidráulica, no centro da cidade, a escultura que representa Santa Iria - na lenda que vem do tempo da evangelização dos visigodos pelos beneditinos, a monja teria sido atirada ao rio por um príncipe apaixonado e não desejado. O seu corpo teria ido depois parar a Santarém, onde o rio se abriu para deixar ver a urna.

Pedras mágicas no convento são as da janela do capítulo, com quatro metros de altura. Estava incorporada na nave que Dom Manuel mandou fazer para ampliar a igreja templária, depois do descobrimento do caminho marítimo para a Índia, explica Álvaro Barbosa. Mais próxima de nós, hoje, do que a sua altura inicial (o claustro de onde a podemos olhar é posterior), traduz uma profusão de símbolos. Com o mar omnipresente, tendo em conta os Descobrimentos.
A janela é toda uma lição de simbologia. A coluna, cujo fuste faz a analogia ao tronco da árvore, remete para a simbologia bíblica da profecia do livro de Isaías, que no cristianismo é lida como antecipação do nascimento de Cristo: "Brotará um rebento do tronco de Jessé". Mas também ali se representam as armas dos reis portugueses (há uma fivela de cinto, como sinal da entronização real) e elementos de flora, de onde sobressaem as alcachofras e os ramos de vime.

Cortesia de cmtomar

Triste é ver a janela a ser comida por líquenes invasivos. Só terão aparecido depois da plantação de coníferas na Mata dos Sete Montes, diz Álvaro Barbosa. Procurava-se imitar as matas de Sintra que, por sua vez, reproduziam as florestas alemãs. Mas Tomar não é Sintra e o efeito foi encher de líquenes as pedras do convento.
De lado, numa das torres, nota-se já o efeito da limpeza: aplicaram-se pachos biológicos com nutrientes que promovem a emigração dos líquenes da pedra para uma calda biológica. A diferença é notória: a pedra foi devolvida à sua beleza na torre já limpa, continua sujeita à patine do tempo na janela e em grande parte das paredes do edifício. Os mais distraídos podem não reparar que há uma outra janela semelhante. Inicialmente, havia três: uma a Ocidente (a actual) e duas a Sul, uma das quais foi entaipada. A que ainda está visível está junto da charola, num dos corredores da casa do capítulo. Vê-se de cima para baixo.

Chegamos ao outro lugar encantado deste convento, a charola. Conta a lenda que os templários entravam montados nos seus cavalos pelo deambulatório. O responsável do convento diz que é impossível confirmar tal versão - provavelmente apenas uma lenda.

Cortesia de cmtomar

Verdade é que, em 1640, vários conjurados foram ali sagrados cavaleiros, para lutar contra a ocupação filipina. Tomar sempre no centro da história.

"A mística do espaço tem a ver com a memória trazida do Oriente", diz Álvaro Barbosa. A igreja conventual era a de Santa Maria dos Olivais. A igreja da charola, do convento, era dedicada às cerimónias iniciáticas, aprendidas com os cristãos da Síria e os ortodoxos. Colocada no cimo do monte, a charola era a parte mais elevada do lugar.
"É um dos símbolos da mística fundadora de Portugal", diz o conservador do convento. Os edifícios de planta circular são trazidos para Ocidente depois da tomada de Jerusalém pelos cruzados e pelos templários. Na Cidade Santa, havia um templo circular à volta do Santo Sepulcro.
A charola alude, aliás, à morte e ressurreição de Jesus: estão ali representados os instrumentos da paixão e, na nave manuelina, a ressurreição - explica ainda Álvaro Barbosa. "O rei Dom Manuel nunca perdeu a ideia fundiária do espaço: imitar o lugar onde se deu a ressurreição de Cristo." A representação pictórica traduz também esse simbolismo, através de cenas e imagens ligados à vida de Cristo. No tambor central, uma coroa de espinhos esculpida circunda o anagrama de Cristo. Está, no entanto, escondida, mal se vê de baixo». In António Marujo.

Cortesia da CMTomar/JDACT