quinta-feira, 13 de novembro de 2014

O Rio da Prata. O Famoso Intérprete Português. Gonçalo Costa. Lemonde Macedo. «A Gonçalo Costa chamaram os castelhanos ‘El Caballero’. E também por suas proezas recebeu outro título que não necessita de adjectivações e o equipara às legendárias figuras da Historia: ‘El del Rio de la Plata!’»

Cortesia de wikipedia

«O contacto português com a Argentina inicia-se nos alvores do século XVI. Em 1514 parece haver chegado ao Prata uma expedição de que se presume fosse piloto-mor João Lisboa. Segundo Damião Peres, baseado na obra de Toribio Medina El descubrimiento del Oceano Pacífico – Hernando de Magallanes, já em 1501-150 o navegador Nuno Manuel teria procurado a passagem inter-oceãnica, antepondo-se catorze anos ao comummente aceite descobrimento do La Plata por João Dias Solis, também presumivelmente português, com quem o rei de Castela fizera uma capitulação para contornar pelo sul o Novo Mundo e chegar às Molucas. A ideia, de acordo com as instruções régias, seria levar tão longe quanto possível o conhecimento da América e do seu contorno. Sabe-se que Solis partiu em 8 de Outubro de 1515 de S. Lucar de Barrameda, com três navios; que chegou em Fevereiro de 1516 a um porto-Candelária, próximo da actual Montevideu; que baptizou o grande rio com o nome de Mar Dulce; que foi trucidado traiçoeiramente e devorado pelos guaranis antropófagos, bem como os seus oito companheiros, na ilha a que chamara de Martin Garcia, nome do despenseiro de bordo.
Todas estas expedições e as que se lhes seguiram visavam fundamentalmente a descoberta das regiões auríferas e argentárias, de cujas fabulosas riquezas chegavam à Europa, através do Brasil, aliciantes e sugestivas lendas. Daí o convencimento de que, atravessando-se o continente, se atingiriam esses almejados territórios e daí também a errada identificação que dos mesmos se fazia com Malaca. Outros navegadores portugueses estiveram no rio da Prata: Cristóvão Jacques (1516-19 e 1526-29); Pero Lopes, irmão de Martim Afonso Sousa, que percorreu o Paraná e o Uruguai... Devem-se ao português Aleixo Garcia, um dos componentes da armada de Solis, as descobertas do Paraguai e da Bolívia, partindo do porto brasileiro de Santa Catarina (1524). Nuno Chaves, que se incorporara na expedição de Irala, é o primeiro a cruzar o continente americano e a estabelecer a comunicação entre as duas vertentes da América do Sul, pois vai a Lima (Peru) de onde regressa a Assunción (Paraguai). É a época em que portugueses e espanhóis, à compita, procuram assenhorear-se das terras americanas, nem sempre respeitando os aliás mal definidos limites fixados pelo tratado de Tordesilhas.
Se nos descobridores encontramos tão valiosos artífices do desbravamento e da colonização, também nos intérpretes se manifesta o espírito integrador e assimilador característico do lusitano. Com efeito, não deixa de causar espanto que, para tão difícil missão, fossem frequentemente escolhidos navegantes, pilotos, guias portugueses. O intérprete não se limitava a ser um tradutor, mero instrumento do pensamento alheio. Era o faraúte ou língua, sinónimo de conselheiro ou mentor, homem esclarecido e experimentado, de cujas capacidades dependia em grande parte o êxito das arriscadas empresas. A serviço ou não da Espanha, a vida de cada um destes homens assume contornos de autêntica epopeia. Gonçalo Costa, António Tomás e Enrique Montes, eis os nomes mais destacados… A Gonçalo Costa chamaram os castelhanos El Caballero. E também por suas proezas recebeu outro título que não necessita de adjectivações e o equipara às legendárias figuras da Historia: El del Rio de la Plata!
Uma versão existe, bastante controvertida, segundo a qual teria habitado Gonçalo Costa em S. Vicente, com seu sogro João Ramalho, no primeiro terço do século XVI. Fora ao Brasil para ajudar a exportar, com destino à Europa, parte dos escravos que o sogro largamente possuía... Passando a Armada de Diego Garcia Moguer por S. Vicente, acordou com ele Gonçalo Costa o transporte para Espanha de oitocentos dos seus escravos; comprometia-se em troca a acompanhar Garcia Moguer na qualidade de intérprete. Seria esta a sua primeira viagem ao Prata». In Lemonde Macedo, O Rio da Prata e o Famoso Intérprete Português Gonçalo Costa, a Joaquim Veríssimo Serrão os Amigos, Fraternidade e Abnegação, Academia Portuguesa da História, Lisboa, 1999, ISBN 972-624-126-X.

Cortesia da APdaHistória/JDACT