domingo, 22 de novembro de 2015

Cartas de Amor. Fernando Pessoa. «… quem primeiro prestou a devida atenção àqueles extractos epistolares, quem primeiro intuiu a importância de que eles se revestiam e quem primeiro, inclusivamente, revelou o nome próprio, Ophélia, da destinatária daquelas cartas»

jdact e wikipedia

Nota Prévia
«Começou a saber-se da existência destas cartas de amor de Fernando Pessoa, logo menos de um ano depois da sua morte, quando outro admirável poeta, Carlos Queiroz, seu devotado amigo e companheiro, a elas se referiu no número 48 (Julho de 1936) da revista Presença e delas aí publicou alguns significativos extractos. Tanto o artigo em que essa reveladora referência era feita Carta à Memória de Fernando Pessoa, como os próprios excertos então divulgados, como ainda, a preceder um e outros, o texto de uma palestra lida por Carlos Queiroz ao microfone da Emissora Nacional em 9 de Dezembro de 1935 (isto é: nove dias depois da morte do autor da Mensagem) ver-se-iam imediatamente reunidos num folheto intitulado Homenagem a Fernando Pessoa. Trata-se de um folheto, hoje completamente inencontrável, de cerca de cinquenta páginas, com tiragem de quinhentos exemplares e que foi publicado sob a chancela de Edições Presença. Composto e impresso em Agosto de 1936, nas oficinas da Atlântida, em Coimbra, nele se reproduzia também o retrato à pena feito por Almada (que figurara já na capa do citado número da revista Presença, e, em nota indicava-se que o produto da sua venda se destinava a contribuir para a publicação da Obra de Fernando Pessoa.
Posteriormente, foi João Gaspar Simões, no seu monumental e imprescindível estudo sobre a Vida e Obra de Fernando Pessoa (1950), quem primeiro prestou a devida atenção àqueles extractos epistolares, quem primeiro intuiu a importância de que eles se revestiam e quem primeiro, inclusivamente, revelou o nome próprio, Ophélia, da destinatária daquelas cartas. É certo que esse mesmo nome encabeçava, embora com modernizada grafia, a dedicatória, que Carlos Queiroz antepusera ao seu folheto de Homenagem a Fernando Pessoa À Ofélia, ao Pierre Hourcade e aos meus amigos da Presença; e, se bem que, nos extractos epistolares então vindos a lume, o nome da destinatária se encontrasse invariavelmente substituído por três asteriscos, era desde logo tentadora, a relacionação com o nome aparecido na mencionada dedicatória.
Seja como for, no mundo literário da época, ninguém conhecia melhor do que Carlos Queiroz, não só a identidade, mas também a figura humana e a personalidade da destinatária de tais cartas (e, daí, o facto de ter podido revelar a sua existência,), pela simples razão de que se tratava de uma sua tia materna,a Ex.ma Senhora dona Ophélia Queiroz, que sempre se recusaria, ao longo de várias décadas de compreensível hesitação e de não menos compreensível reserva, a autorizar a publicação integral desta correspondência. Hoje, em virtude de um conjunto de circunstâncias e peripécias que não são por enquanto de revelar, ou que talvez nunca se revelem inteiramente, torna-se enfim possível a tão aguardada edição deste acervo documental de primeiríssima importância.
Da respectiva leitura e estabelecimento do texto se encarregou, por sua vez (e que melhor homenagem se poderia render a quem primeiro se lhe referiu?), uma das filhas do desaparecido poeta de Desaparecido, Maria da Graça Queiroz, a quem se fica igualmente devendo a compilação do curiosíssimo relato que sua Tia-Avó em tempos lhe fez, acerca das circunstâncias em que travou conhecimento com Fernando Pessoa, dos preliminares e vicissitudes do convívio entre ambos, dos cenários em que esse convívio decorreu, da própria maneira de ser, enfim, do incomparável poeta com quem assim privou, e com quem, ao que se sabe, ninguém mais teve a fortuna de assim privar. De facto, não se conhece, além deste, nem é provável que tenha existido, qualquer outro episódio sentimental na vida de Fernando Pessoa». In Fernando Pessoa, Cartas de Amor, Organização de David Mourão Ferreira, preâmbulo de Maria da Graça Queiroz, Lisboa, Edições Ática, 1978.

Cortesia de EÁtica/JDACT