domingo, 8 de novembro de 2015

Política. História. Cidadania. Jaime Cortesão. Elisa N. Travessa «Quando o saudosismo apareceu, não o ataquei, fugi, deixando de colaborar na Águia; o saudosismo continuou, e eu fugi mais, abandonando a Renascença»

Cortesia de wikipedia e jdact

Renascença Portuguesa e a Guerra. O projecto cultural da Renascença Portuguesa. O contributo de Jaime Cortesão. Concretização do sonho
«(…) Este último corrobora a posição de Proença e transmite-a a Pascoaes, criticando o saudosismo, sobretudo a ligação estreita deste à definição ideológica do projecto e como doutrina essencial da Renascença. Em relação à revista, órgão do movimento, Proença e Sérgio sugerem modificações. Cortesão considera as propostas, mas continua a filiar-se no misticismo e no idealismo da Saudade, suportado numa espécie de santidade civil: Esta revista é para nós um templo: a nossa esperança, esforço, fervor patriótico, lutas de ideias ou realizações de Beleza, unge-os a nossa fé de profunda religiosidade. Proença chega mesmo a sugerir a Cortesão a alteração do título da revista para Renascença. Considera que A Águia, servia para título de uma revista literária, exclusivamente literária, de gente moça, exclusivamente moça. O título mantém-se, como sabemos, e a tendência predominantemente saudosista também, embora enriquecida com a polémica entre Pascoaes e António Sérgio. A segunda série da revista inicia a sua publicação em Janeiro de 1912, como órgão da Renascença, tendo como director literário Teixeira Pascoaes, director artístico António Carneiro e director científico José Magalhães. Jaime Cortesão não integra a direcção talvez porque decida empenhar-se na intervenção pedagógica da Renascença com a direcção de A Vida Portuguesa e a criação das Universidades Populares. O projecto da Renascença vai ganhando forma, embora permaneça e prevaleça a tendência saudosista de Pascoaes expressa desde logo no texto que serve de editorial à 2ª série de A Águia intitulado Renascença e que pretendia acentuar a sua visão do movimento.
Foi Cortesão que sugeriu que fosse Pascoaes a escrever o texto de abertura da segunda série. Retomando ideias expressas no projecto do programa por ele apresentado, considera que o fim da revista, como órgão da Renascença, era dar um sentido às energias intelectuais que a nossa raça possui. Tenta justificar algumas das críticas que lhe são dirigidas considerando que a palavra Renascença não significa um simples regresso ao Passado, é regressar às fontes originais da vida, mas para criar uma nova vida. No entanto, insiste na Saudade como o próprio sangue espiritual da raça, o sentimento-ideia, a emoção reflectida e a própria Renascença original e criadora. Condena ainda todas as influências negativas, do ponto de vista moral, cultural, político ou religioso, vindas do estrangeiro. Pascoaes insiste no número dois da revista nas ideias defendidas no primeiro artigo. Esta insistência motiva a reacção de Sérgio e Proença à qual responde Teixeira Pascoaes e também, embora sem dedicatória, Cortesão.
Sérgio, mais tarde, numa carta a Cortesão confessa: me penaliza a ideia de que você tomou uma ala da Renascença, sem oferecer um lugar nela a um seu amigo, e da Renascença, que não tem lugar na do Pascoaes. Manifesta as suas esperanças n’A Vida Portuguesa, questionando Cortesão se esta cairia nos erros de A Águia. Sugere que se crie nela uma secção intitulada Tribuna Livre aberta a todas as opiniões e a todos os interesses de assunto geral. Funcionaria como uma arena para não dissidentes, para dissidentes, e até mesmo para adversários. Reitera a sua confiança na ideia geral da Renascença, como estava expressa nos Estatutos, e define uma série de ideias comuns ao grupo, que deveriam ser privilegiadas relativamente às ideias particulares: que a Nação Portuguesa poderá levantar-se, se o quiser; que é mister acordar as almas pelo sentimento; é preciso chamar todos à grande obra colectiva. Na mesma data envia uma carta a Proença, dizendo-lhe que já tinha escrito a Pascoaes, criticando certos conceitos do poeta que tinham vindo a ser apresentados como credos ou dogmas da Renascença: a intransigência artística e religiosa, a exclusão da cultura estrangeira, etc. Mais tarde, esclarece o seu procedimento para com Pascoaes declarando que fugiu dele tanto quanto lhe foi possível: Quando o saudosismo apareceu, não o ataquei, fugi, deixando de colaborar na Águia; o saudosismo continuou, e eu fugi mais, abandonando a Renascença. O nosso poeta continuou não só a dar-nos o seu saudosismo, como a ridicularizar e amesquinhar os estrangeirados, embasbacados com Paris de França; sou dos que o Poeta chama estrangeirados, se bem que não principalmente». In Elisa Neves Travessa, Jaime Cortesão, Sinais do Pendsamento Contemporâneo, Ensaio, Política, História e Cidadania, 1884-1940, ASA Editores, Setembro de 2004, obra adquirida e autografada em Fevereiro de 2006, ISBN 972-41-4002-4.

Cortesia de EdASA/JDACT