segunda-feira, 20 de outubro de 2014

Educação. Justiça Social. Martha Nussbaum. «Tanto a acção como a liberdade são objectivos que têm uma particular importância para elas já que tantas vezes têm sido tratadas como seres dependentes e passivos»

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As Capacidades como Direitos Fundamentais: Sem e a Justiça Social
A Abordagem das Capacidades e a Justiça Social
«(…) Por não ter em conta o facto de existirem preferências adaptativas, altera também o processo do desenvolvimento a favor do status quo ao ser utilizado como referência normativa. Finalmente, na medida em que sugere que o objectivo do desenvolvimento é um estado ou uma condição das pessoas (ou seja, um estado de satisfação) desvaloriza a importância da acção e da liberdade no processo de desenvolvimento. Todas estas lacunas, sublinha Sen, são ainda maiores quando a teoria é confrontada com as desigualdades que se baseiam no sexo: pois a vida das mulheres reflecte a sua luta por muitos elementos de bem-estar, nos quais estão incluídos a saúde, a educação, a mobilidade, a participação política, etc. As preferências das mulheres normalmente são apresentadas de uma forma distorcida e têm frequentemente origem em circunstâncias que à partida foram injustas. Tanto a acção como a liberdade são objectivos que têm uma particular importância para elas já que tantas vezes têm sido tratadas como seres dependentes e passivos. Esta linha de pensamento encontra-se próxima quer da do feminismo que condena o Utilitarismo como paradigma económico dominante, quer de trabalhos de activistas eruditos para os quais a participação e a acção das mulheres são uma coisa fundamental.
Não é uma surpresa o facto de eu apoiar estas ideias. No entanto, parece-me que elas não nos poderão levar muito longe ao analisarmos a questão da justiça social. Podem dar-nos uma percepção geral sobre aquilo que as sociedades se deveriam esforçar por alcançar mas, dada a relutância de Sen em se comprometer com a substância (que capacidades deveriam as sociedades considerar prioritárias) até mesmo essa orientação é manifestamente reduzida. Além disso, não nos ajudam a ter qualquer noção acerca de qual deveria ser o nível mínimo de capacidade numa sociedade justa. A utilização das capacidades na área do desenvolvimento, como sempre, é apenas comparativa, tal como podemos constatar no Relatório de Desenvolvimento Humano do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento. As nações são comparadas entre si exclusivamente no domínio da sua realização em áreas como a da saúde ou a da educação. No entanto, relativamente à qualidade dos serviços de saúde ou ao grau de provisão educativa, qualquer sociedade justa deveria considerar estas áreas como um direito fundamental de todos os seus cidadãos. Uma ideia interessante mas que raramente é mencionada.
Outra famosa linha de pensamento que Sen desenvolveu nos textos Igualdade de Quê? e Desigualdade Reexaminada, talvez esteja mais próxima das preocupações relacionadas com a justiça social. Essa linha de pensamento tem por base o princípio de que o conceito de igualdade é um valor político central. A maior parte dos estados considera a igualdade como um valor importante, diz Sen, mas, apesar disso, os estados não estão com frequência interessados em saber que lugar deve ela ocupar em cada um deles de forma a poderem ser feitas as necessárias comparações. Apresentando uma argumentação que é muito semelhante àquela que defende quando se refere aos objectivos do desenvolvimento, Sen sustenta que é na área das capacidades que podemos encontrar a mais prometedora e eticamente satisfatória forma de encarar a igualdade como objectivo político. Se a importância da igualdade for determinada em função da utilidade ou do bem-estar, ela não poderá servir-nos de critério devido às razões que resumidamente já expus. Do mesmo modo, também não poderá servir de critério relativamente à igualdade de recursos, na medida em que não se considera o facto de que, caso as pessoas tenham de atingir um nível semelhante de capacidade de funcionamento as suas necessidades são diferentes e que as suas capacidades de conversão dos recursos em funcionamento real não são as mesmas». In Martha C. Nussbaum, Educação e Justiça Social, Colecção Contrapontos, Edições Pedago, Mangualde, 2014, ISBN 978-989-8655-34-9.

Cortesia de EPedago/JDACT