sábado, 25 de outubro de 2014

Lágrimas de Ametista. Maria Mar Carvalho. «Mas a vida é uma miragem que é preciso viver, há quem nos mande morrer, chamando isso, coragem! Mas manda o poder da força e é ele que traça a vida de quem antes de nascer lá traz a sentença lida»

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Outono sombrio
«A vida envolta em noite por demais esquecida,
sufocada,
nos braços nus das ramadas de Outono!
Já a folha caiu e o verde secou,
Com ele as flores desfeitas em pétalas vãs
escurecem.
Já as aves deixaram seus ninhos,
calor, amor, seu lar.
Sobem no ar fumos cinzentos
de casa sem interior.
A noite baixa.
Alguém assobia, ao longe, as notas de uma velha canção.
Tão gasta! Tão velha! Tão fora de moda!
A vida parou aqui.
Só a velha estrada esburacada se ilumina…
De automóveis perdidos,
de estrelas vermelhas,
que rumam, loucas, ao infinito».
18 de Janeiro de 1989


Manifestação
«Arde em fogo a pradaria,
estilhaços, confusão
e a Natureza em agonia
revolve-se na escuridão.
Lá longe no horizonte,
de braços nus para o céu,
surgem uns vultos a monte
reivindicando o que é seu.
Vultos nus, desencantados,
e de vermelho vestidos
protestam ódios calados,
por nunca serem ouvidos
não lhes importa morrer,
nem ouvir o coração,
se nem no acto de nascer
tiveram opinião!
Mas a vida é uma miragem
que é preciso viver,
há quem nos mande morrer,
chamando isso, coragem!
Mas manda o poder da força
e é ele que traça a vida
de quem antes de nascer
lá traz a sentença lida.
É assim o poder do fogo,
como elemento primeiro
que reduz toda a floresta
A um imenso braseiro».
27 de Janeiro de 1989
Poemas de Maria Mar de Carvalho, in ‘Lágrimas de Ametista

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