quinta-feira, 2 de outubro de 2014

O Comportamento Cultural dos Macaenses perante o Nascimento. Isabel Correia Pinto. «Ser Macaense é ser natural de Macau, mas ter cultura portuguesa... é ser português do Oriente...é ter certas maneiras de ser e estar, de pensar e falar que o identificam como macaense»

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Conceito de etnia macaense
«Não se foge à verdade quando se diz que macaense é aquele que é natural de Macau. Porém, embora essa afirmação seja verdadeira, é incompleta, já que não especifica a etnia da pessoa em causa. É esse pormenor que marca a grande diferença e que o termo macaense por ser ambíguo, não especifica; qualquer pessoa que nasça em Macau é macaense, independentemente de ser ou não dessa etnia. Talvez por essa razão, os etnicamente macaenses, se considerassem desde sempre um grupo diferente dos outros naturais de Macau e se auto designassem os filhos da Terra ou filhos de Macau. Também os chineses de Macau, o grupo etnicamente maioritário sente essa diferença, denominando os de etnia macaense de Tou Sán que significa nascidos na terra, enquanto que se autodesigna por gente de Macau. Perante esta realidade, pergunta-se: Quem são afinal os filhos da terra? Que características os distinguem e os fazem parecer duplamente macaenses: por etnia e por naturalidade?
Várias têm sido as pesquisas feitas sobre o assunto, algumas as opiniões emitidas e que por vezes são contraditórias. Senão vejamos: Relativamente à origem dos macaenses, a opinião geral dos autores consultados, é que estes resultaram do cruzamento entre homens portugueses que viajavam nas naus e caravelas e mulheres asiáticas. Porém, as ideias no que respeita à etnia dessas mulheres, já não são tão concordantes. Assim, para Bento da França (1897), os macaenses têm traços mongólicos, europeus, malaios, canarins e são produto de grande mistura de raças e sub-raças. Melo Machado (1913), considera os macaenses fruto do cruzamento de portugueses com mulheres japonesas e malaias primeiro e mais recentemente com mulheres chinesas. Carvalho Rego (1950), é de opinião que os macaenses não são de ascendência sino-portuguesa, mas sim do cruzamento de europeus com outras raças do oriente. Já Eduardo Brazão (1957), expressa uma ideia diferente, referindo terem os macaenses rara miscigenação com indianas e pelas características físicas que apresentam, a maior parte deve descender do cruzamento de portugueses com malaias e chinesas. Também Manuel Teixeira (1965), refere serem os macaenses descendentes de portugueses e chinesas. Ana Maria Amaro (1988), tem uma opinião diferente, afirmando que os macaenses descendem de portugueses e mulheres malaias, luso-malaias, indianas, luso-indianas, timorenses, japonesas e também chinesas. Opinião idêntica a esta última, expressa António Carmo (1993).
Porém não basta ser natural de Macau e ter origem euro-asiática, para se ser considerado etnicamente macaense. Existem dois outros vectores importantes, que os autores consultados igualmente referenciam como característicos dessa etnia. São eles a linguagem e a religião. Relativamente à linguagem, a que foi utilizada até às primeiras décadas deste século, era para além do português, o patuá ou falar da terra, uma mistura de português simplificado com malaio, a que se foram agregando muitos vocábulos chineses. Sendo este modo de falar, característico dos macaenses como grupo. Ao cair em desuso, a linguagem utilizada continuou a ser o português com pronúncia regional própria e cada vez mais o cantonense, a que não são alheias as transformações sociais e políticas que se têm vivido em Macau, onde se sente cada vez mais a influência chinesa. Seguindo a opinião de autores já referidos como Manuel Teixeira, Ana Maria Amaro e António Carmo, estes factores fazem do macaense um bilingue nas línguas portuguesa e no dialecto cantonense, podendo ainda na maior parte dos casos, segundo Ana Maria Amaro, exprimir-se facilmente em inglês.
Relativamente à religião, todos os autores consultados são unânimes em referir que os macaenses são tradicionalmente católicos. Ana Maria Amaro considera-os católicos muito conservadores. João Pina Cabral e Nelson Lourenço falam igualmente nos três vectores principais de auto-identificação, como sendo a mestiçagem euro-asiática, a língua portuguesa e a religião católica, transcrevendo um conceito de macaense dado por um membro dessa etnia: Ser Macaense é ser natural de Macau, mas ter cultura portuguesa... é ser português do Oriente...é ter certas maneiras de ser e estar, de pensar e falar que o identificam como macaense. Poderíamos incluir nestas maneiras de ser e estar, certos hábitos e tradições nomeadamente culinárias e que são também características dos macaenses». In Isabel Maria R. Correia Pinto, O Comportamento Cultural dos Macaenses perante o Nascimento, Imprensa Oficial de Macau, Fundação Oriente, 2001, ISBN 99937-603-1-5.

Cortesia de FOriente/JDACT