quinta-feira, 23 de janeiro de 2020

Imperatriz dona Leopoldina Marsilio Cassotti. «O arquiduque Carlos, irmão mais novo do imperador e um militar brilhante, conseguiu entre Agosto e Setembro desse ano duas importantes vitórias sobre a França revolucionária»

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O sonho de uma imperatriz, 1797
«(…) Após a morte, em 1792, do imperador que antes havia sido grão-duque da Toscana, a ascensão ao trono imperial de seu filho, a partir de então Francisco II, foi abençoada com uma nova gravidez da sua esposa, que deu como resultado, em Abril de 1793, o nascimento de Fernando, o ansiado filho homem; infelizmente, esse menino, destinado a sucedê-lo no trono, sairia meio fraco mentalmente. A morte da rainha Maria Antonieta da França, ocorrida em Outubro desse mesmo ano, foi para o imperador Francisco II um facto mais desagradável que doloroso, pois ele nunca havia sentido muita estima por essa tia. Mas serviu-lhe para perceber que o carácter alegre da sua mulher era uma espécie de bálsamo para a sua mente, especialmente num momento em que os revolucionários franceses haviam decidido levar a liberté também aos territórios italianos pertencentes ao seu império. Por sua vez, a imperatriz confirmou nos factos a suposição de que seria tão fértil quanto sua mãe, pois, depois do herdeiro, deu ao marido duas meninas, nascidas respectivamente em 1794 e 1795, e continuaria parindo um filho por ano, até chegar ao número de doze. Por volta da última semana de Abril de 1796 a imperatriz Maria Teresa engravidou, pela quinta vez, daquela que seria Leopoldina. Os primeiros meses dessa gestação foram agridoces por conta das notícias da frente de guerra que chegavam à corte de Viena.
O arquiduque Carlos, irmão mais novo do imperador e um militar brilhante, conseguiu entre Agosto e Setembro desse ano duas importantes vitórias sobre a França revolucionária. Mas a revelação na cena italiana do general Bonaparte, após a vitória dos franceses nos campos de Rivoli, havia começado a pôr em xeque os territórios do norte daquela península. Foi por essa razão que, enquanto a imperatriz Maria Teresa se esforçava no trabalho de parto, seu marido não conseguia parar de pensar na situação de Mântua, sitiada pelas tropas desse pequeno general corso que possuía o dom de se fazer amar quase cegamente pelos seus soldados, algo precioso para um militar. Finalmente, Maria Teresa deu à luz a futura imperatriz do Brasil, a quarta filha que dava a seu marido. Três dias depois, o jornal mais importante da capital do império, o Wiener Zeitung, comunicava aos habitantes de Viena que: às sete e meia da manhã de domingo, dia 22, Sua Majestade a imperatriz deu à luz uma arquiduquesa. A essa altura, a menina já havia recebido as águas baptismais, e com elas o nome Carolina Josefa Leopoldina Fernanda Francisca. Uma semana depois do sacramento de Leopoldina, como seria chamada em família essa menina, a cidade de Mântua caiu nas mãos dos franceses. Esse triunfo militar consolidou a carreira de Napoleão, que, a despeito de ter nascido numa das ilhas mais pobres do Mediterrâneo e ser filho de um simples advogado, tornar-se-ia o homem mais poderoso da Europa e se casaria com Maria Luísa da Áustria, irmã mais velha de Leopoldina.
Uma arquiduquesa cuja infância e juventude transcorreu durante o período no qual a Europa foi abalada por um fenómeno natural em forma de génio militar como não experimentara havia séculos. Embora seus pais fizessem todo o possível para manter Leopoldina e os seus irmãos longe das guerras que seriam travadas na Europa durante aqueles anos, a maior parte das arquiduquesas, mais inteligentes e sensíveis que os filhos homens, não seriam imunes às influências das mudanças revolucionárias que a acção de Napoleão produziria nas leis, nos costumes e até no modo de pensar. No momento do nascimento de Leopoldina, para Bonaparte não restava mais que colher os frutos das suas vitórias; Rívoli e Mântua haviam semeado o pânico nos pequenos e grandes Estados italianos. De facto, depois da queda de Mântua, em Viena já se começava a temer a chegada dos exércitos franceses. Francisco II lançou mão de todos os meios ao seu alcance para evitar isso; mas, quando o risco aumentou, acabou aceitando um armistício com os seus inimigos, firmado em meados de Abril de 1797, quando a arquiduquesa Leopoldina ainda não havia completado três meses.
Dois meses antes de ela completar um ano de vida, seu pai fez algo mais surpreendente aos olhos dos seus súbditos. Para escândalo de sua sogra, a rainha Maria Carolina de Nápoles, que odiava os franceses por considera-los responsáveis pelo martírio da sua irmã, o imperador rubricou com os herdeiros dos assassinos da sua tia a Paz de Campofórmio. Enquanto isso, a futura primeira imperatriz do Brasil, que herdaria o pragmatismo paterno, crescia, como o resto dos seus irmãos, protegida pela família, pelo menos das incertezas que as ambições napoleónicas geravam nas casas reinantes europeias do Antigo Regime. Dizem, porém, que desde os seus primeiros meses de vida Leopoldina desenvolveu uma espécie de ansiedade, chegando a ferir os mamilos da sua ama de leite por conta da intensidade com que se prendia a seus peitos quando era amamentada». In Marsilio Cassotti, Imperatriz D. Leopoldina, tradução de Sandra Dolinsky, Manuscrito Editora, 2015, ISBN 978-989-881-803-4.

Cortesia de ManuscritoE/JDACT