domingo, 12 de janeiro de 2020

Lucrécia Borgia. Jean Plaidy. «Mantinha bem a sua beleza, mas mesmo assim uma mulher de trinta e oito anos que já tivera vários filhos não podia competir com mulheres jovens…»

Cortesia de wikipedia e jdact

A Piazza Pizzo di Merlo
«(…) Vannozza ficou encantada por estar de volta a Roma. Parecia que durante aqueles meses que se seguiram ao nascimento de Lucrécia ela era a mulher mais feliz do mundo. Rodrigo visitava a ala infantil com uma frequência maior do que nunca; havia uma atracção adicional na menininha de cabelos dourados. Era uma criança encantadora, de temperamento muito doce, e ficava contente no berço, dando um belo sorriso para quem se aproximasse. Os meninos ficaram interessados por ela. Ficava um de cada lado do berço, e tentavam fazê-la rir. Discutiam por causa dela. César e Giovanni sempre aproveitavam qualquer diferença entre eles e armavam uma discussão sobre ela. Vannozza ria com as amas, ouvindo as altercações deles. Ela é minha irmã. Não, ela é minha irmã. Já fora explicado a eles que ela era irmã dos dois. César respondera, os olhos faiscando: mas ela é mais minha do que do Giovanni. Ela gosta mais de mim... César..., do que do Giovanni. Isso, lhe dissera a ama-seca, quem vai decidir é a própria Lucrécia.
Giovanni observava o irmão com olhos que mostravam uma emoção reprimida; ele sabia o motivo pelo qual o irmão queria que Lucrécia gostasse mais dele. César estava ciente de que quando o tio Rodrigo ia visitá-los era sempre Giovanni que ganhava mais doces; era sempre Giovanni que era erguido naqueles fortes braços e beijado e acariciado antes que o magnífico tio Rodrigo se voltasse para César. Portanto, César estava decidido a que todas as outras pessoas deveriam gostar mais dele. A mãe gostava. As amas-secas diziam que gostavam; mas isso devia ser porque, se não dissessem, ele iria vingar-se de alguma maneira, e elas sabiam que era mais imprudente ofender César do que Giovanni. Lucrécia, assim que pudesse mostrar uma preferência, deveria mostrá-la por ele. Ele havia decidido. Era por isso que rondava o berço mais do que Giovanni, esticando a mão para que aqueles dedinhos se enroscassem no seu polegar.
Lucrécia, murmurava ele. Eu sou César, seu irmão. Você gosta mais de mim..., mais do que de qualquer outra pessoa. Ela olhava para ele com aqueles grandes olhos azuis e ele ordenava: ria, Lucrécia. Ria assim. As mulheres se agrupavam em volta do berço para olhar, porque por estranho, que pareça Lucrécia invariavelmente obedecia a César; e quando Giovanni tentava fazê-la rir para ele, César ficava atrás do irmão fazendo caretas tão demoníacas que em vez de rir Lucrécia chorava. E aquele demónio do César, diziam as mulheres umas às outras, pois, embora ele tivesse apenas cinco anos de idade, não tinham coragem de dizer isso a ele. Um dia, seis meses depois do nascimento de Lucrécia, Vannozza estava cuidando das suas trepadeiras e flores no jardim. Ela tinha os seus jardineiros, mas aquilo era um trabalho que fazia com amor. As plantas eram bonitas, e ela sentia prazer em cuidar delas pessoalmente, porque o seu jardim e a sua casa lhe eram quase tão caros quanto os filhos. Quem não sentiria orgulho de uma casa daquelas, com a sua fachada, dando frente para a praça, e o quarto claro com a grande janela, tão diferente da maioria dos quartos sombrios de outras casas romanas? Ela também tinha uma cisterna com água, o que era uma raridade.
Sua dama de companhia, não aquela que Rodrigo havia admirado; ela já deixara o serviço de Vannozza há muito tempo, veio avisá-la de que o cardeal chegara e que com ele estava um outro cavalheiro; mas enquanto a jovem falava Rodrigo entrou no jardim, e estava sozinho. Meu senhor, bradou Vannozza, o senhor chegando e me encontrando desse jeito... O sorriso de Rodrigo foi desconcertante. Mas você fica um encanto no meio das suas plantas. Não quer entrar na casa? Eu soube que o senhor trouxe um convidado. As damas deveriam tê-lo atendido melhor. Mas era meu desejo falar com você a sós..., aqui fora, enquanto você trabalhava no meio das suas flores. Ela ficou assustada. Sabia que ele tinha algo importante a dizer, e perguntou-se se ele preferia dizê-lo do lado de fora, porque até mesmo em casas bem-administradas como a dela os criados tinham o hábito de ouvir o que não deviam.
Um grande medo entorpeceu a mente de Vannozza enquanto ela se perguntava, se ele tinha ido lhe dizer que era o fim do relacionamento deles. Ela estava agudamente cônscia dos seus trinta e oito anos. Mantinha bem a sua beleza, mas mesmo assim uma mulher de trinta e oito anos que já tivera vários filhos não podia competir com mulheres jovens; e praticamente não podia haver uma jovem que, se conseguisse resistir ao encanto do cardeal, pudesse dar as costas a tudo que um homem influente como ele podia dar a uma amante. Meu senhor, disse ela, em voz baixa, o senhor tem notícias. O cardeal ergueu o rosto sereno para o céu e sorriu o seu mais belo sorriso. Minha cara Vannozza, como você sabe, eu tenho a maior consideração por você, disse. Vannozza prendeu a respiração, horrorizada. Aquilo parecia o início de uma dispensa. Você mora aqui nesta casa com os nossos três filhos. É uma casinha feliz, mas falta alguma coisa: essas crianças não têm pai. Vannozza quis atirar-se aos pés dele, implorar-lhe que não retirasse a sua benevolente presença da vida deles. Para eles seria como a morte, se o fizesse. Seria como tentar viver sem o sol. Mas ela sabia o quanto ele era contra cenas desagradáveis; e disse, com calma: os meus filhos têm o melhor pai do mundo. Eu preferiria que eles nunca tivessem nascido a vê-los tendo que ter um outro pai». In Jean Plaidy, Lucrécia Borgia, Edição Record, 1996, ISBN 978-850-104-410-5.

Cortesia de ERecord/JDACT