sexta-feira, 21 de março de 2014

Simon de Montfort. A figura do Vassalo Perfeito. História Albigeoise. Pierre des Vaux de Cernay. Eduardo L. Medeiros. «… criação de um Vassalo Perfeito, que servisse como um exempla tanto para a monarquia francesa em formação, como para a Igreja que precisava fortalecer o seu vínculo com o século…»

Cortesia de wikipedia

«(…) O terceiro capítulo é uma análise da figura do líder cruzado Simon de Montfort, numa tentativa de verificar se a hipótese da criação da figura de um Vassalo Perfeito seria pertinente ao contexto descrito por Pierre des Vaux de Cernay. Para tanto, consideramos como ponto de partida, o pressuposto de que para criar um modelo, devem ser adoptados parâmetros existentes no contexto ao qual o escritor está inserido. Na introdução crítica da fonte, os autores da tradução revelam um factor de suma importância para este raciocínio, qual seja, a leitura dos escritos de Bernardo de Claraval por Pierre des Vaux de Cernay. Nas obras completas de São Bernardo, foi encontrada uma apologia a uma casta de guerreiros superiores aos cavaleiros comuns, na medida em que os Templários possuíam, para Bernardo, o melhor de dois mundos: eram guerreiros temporais e espirituais. Partindo do cruzamento de minha fonte primária com a obra de Bernardo de Claraval, encontrei três categorias qualitativas ao redor da descrição de Simon: aspectos físicos, nobres e cristãos. As características físicas descritas apontam para um ideal de beleza, que no meu estudo está em conformidade com o conteúdo literário da Provença do século XII, onde a descrição do herói desprovido de falhas físicas era um sinal da Providência Divina favorável. Outro factor para a descrição física detalhada de Simon por Pierre está de acordo com a narrativa bíblica de heróis guerreiros como Absalão, David ou Sansão, todos retratados como homens perfeitos. Quanto às características nobres de Simon, Pierre retrata inúmeras situações onde a coragem do cavaleiro é provada, além de sua compaixão e senso de justiça. Este léxico moral estava inserido no imaginário de cavalaria, que incluía ainda o carácter do amor cortês. Esta característica estava descrita em Simon, na medida em que sua esposa, a condessa D. Alice de Montgomercy, é uma figura sempre presente nas conquistas do marido. Simon é descrito como esposo fiel, enquanto seus adversários, como por exemplo, o conde de Toulouse, é retratado como pervertido e poligâmico.
Nas características religiosas, percebem-se todas as qualidades de um cristão fiel, como fé, fidelidade à Igreja e seus líderes e respeito inexorável pela ortodoxia católica. Toda a descrição destas características converge para corroborar com a minha hipótese da criação de um Vassalo Perfeito, que servisse como um exempla tanto para a monarquia francesa em formação, como para a Igreja que precisava fortalecer o seu vínculo com o século, na medida em que o papado buscava aumentar a sua hegemonia no século através da Teocracia Papal. Para que estes pontos fossem aprofundados no meu trabalho, algumas obras foram de suma importância e merecem menção. Para uma melhor compreensão do conflito armado intitulado Cruzada albigense, duas obras foram fundamentais: A Heresia Perfeita – A vida e a morte revolucionária dos cátaros na Idade Média, de Stephen O’shea, e Atlas de los Cátaros, organizado por Jesus Mestre Campi. Em a Heresia Perfeita, O’shea descreve todos as nuances pertinentes à Cruzada, auxiliando na compreensão do contexto mais amplo sobre os eventos do Languedoc. A existência de dois projectos expansionistas dirigidos por Filipe Augusto de França de um lado, e Pedro II de Aragão de outro, está de acordo com a obra de O’shea. A segunda obra foi de grande valia para ambientar a pesquisa aos espaços territoriais envolvidos, como, por exemplo, verificar qual o território pertencente ao norte francês, qual a delimitação do Midi francês e a região de Aragão. Outros textos de relevância no amadurecimento de conceitos pertinentes à pesquisa merecem menção. A obra de José Rivair Macedo, Heresia, Cruzada e Inquisição na França Medieval, única obra encontrada sobre o tema na historiografia brasileira, auxiliou na percepção da construção da memória histórica sobre a heresia cátara. Na compreensão do conceito e dos preceitos de cavalaria de Pierre, foram utilizadas duas obras. O verbete cavalaria de Jean Flori, no já citado Dicionário Temático da Idade Média contraposto com o clássico sobre o tema de Leon Gautier, La chevalerie. Ambos foram importantes no sentido de compreender a noção de cavalaria no universo no qual o cronista Pierre estava inserido, para então, transpô-lo aos seus escritos. Foi necessário também buscar textos que auxiliassem na compreensão das relações entre senhor e vassalo, bastante presente na Crónica albigense». In Eduardo Luís Medeiros, Simon de Montfort, A figura do Vassalo Perfeito, História Albigeoise, Pierre des Vaux de Cernay, Ciências Humanas, Letras e Artes, UF do Paraná, Curitiba, 2006.

Cortesia de wikipedia/JDACT