sexta-feira, 15 de agosto de 2014

O Papado e Portugal no primeiro século da História Portuguesa: Carl Erdmann. «Alexandre III foi o primeiro papa, que mandou enviados próprios para fazer colecta de dinheiros; e no ano 1168 veio também um ‘Magister Petrus’ a Coimbra, colher o censo para a Cúria»

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Alexandre III
«(…) Além dos conventos e casas das ordens, também as catedrais eram alcançadas pela mão ordenadora do pape. Este incumbia o arcebispo João Peculiar de Braga de dar um estatuto ao seu cabido e de regular a divisão dos rendimentos entre o arcebispo e o cabido, e quando em Lisboa a eleição do bispo Álvaro foi de seguida combatida, Alexandre III investiu-o do novo no cargo. Várias vezes se dirigiram ao papa a pedir julgamento de litígios eclesiásticos; nós conhecemos três bulas referentes a diferenças entre o bispo de Coimbra e os cónegos de Santa Cruz, e um rescrito dirigido a Afonso Henriques por causa do dízimo dos cavaleiros de Santiago e Calatrava. Se é verdade que o número de diplomas de Alexandre III a favor de Portugal fica muitas vezes aquém dos passados a favor das outras terras da Península, mesmo assim também em Portugal a troca de correspondência com a Cúria, que anteriormente só se dava quando se tratava de acções políticas especiais, se tornou coisa vulgar.
Ao lado da correspondência por escrito vinha a missão de legados ou núncios. Provocavam-no em primeiro lugar já as necessidades da administração financeira papal, sobre a qual naquele tempo em geral pouco sabemos, mas precisamente e casualmente em Portugal encontra-se algum material a tal respeito. Alexandre III foi certamente o primeiro papa, que mandou enviados próprios a Espanha, para fazer colecta de dinheiros; já nomeamos o subdiácono Teodino, e no ano 1168 veio também um Magister Petrus a Coimbra, colher o censo para a Cúria. Ambos os legados, assim se chamavam então, apesar de não serem cardeais, porém, não se limitaram a cobrar os tributos, mas foram também chamados para resolver pleitos eclesiásticos. O direito de dar sentenças, não o possuíam eles certamente, porque só os cardeais-legados tinham competência de juiz. Um tal mandou agora Alexandre III no ano de 1172 a Espanha na pessoa de Jacinto, o já nosso conhecido cardeal-diácono de Santa Maria de Cosmedin, que assim pela segunda vez visitava a Península.
Em Portugal encontrava-se ele em Janeiro e Fevereiro de 1173, e a sua presença deixou no país vestígios abundantes. Em Coimbra visitou ele também desta vez, a, Igreja de Santa Cruz, passou um diploma a seu favor e recebeu o tributo de protecção papal. Depois esteve na companhia do rei Afonso Henriques em Braga onde solucionou vários litígios; aí concedeu privilégio ao convento de freiras de Tuias, provavelmente foi este o único privilégio que um convento beneditino português recebeu no século XII, porque os restantes conventos desta ordem em Portugal consideravam, tanto quanto sabemos, que não era conveniente requerer privilégios papais, atendendo à sua pobreza. O principal fim da legacia de Jacinto foi, porém, ainda desta vez, de natureza política. Tratava-se ainda do litígio entre Portugal por um lado e Leão e Castela por outro; ou exprimindo-nos eclesiasticamente: tratava-se do litígio de Braga com Santiago, por um lado, e com Toledo por outro. Temos de recuar uns anos para compreender isto.
Afonso Henriques não tinha descansado depois da conquista de Lisboa, mas antes, combatendo constantemente contra os muçulmanos, havia quase duplicado o seu território. Em 1166  caiu nas suas mãos Évora, capital do Alentejo, sede tradicional dum bispado. O rei mandou ocupar imediatamente a sé episcopal o sagrar pelo arcebispo de Braga o bispo eleito Sueiro. Desejava naturalmente que Évora fosse bispado sufragâneo de Braga». In Carl Erdmann, O Papado e Portugal no primeiro século da História Portuguesa, Universidade de Coimbra, Instituto Alemão da Universidade de Coimbra, Coimbra Editora, 1935.

Cortesia de Separata do BI Alemão/JDACT