segunda-feira, 25 de fevereiro de 2019

Infantas de Portugal. Rainhas em Espanha. Marsilio Cassotti. «… chamada palavras de futuro, isto é, os esponsais, era válida a partir dos sete anos; só para a segunda, ou palavras de presente…»

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Infanta dona Urraca (1150?-1222?). Filha de Leão; filha de Afonso Henriques de Portugal; mulher do rei Fernando II de Leão; mãe do rei Afonso IX de Leão
«(…) Em 1143, Afonso Henriques firmara com o agora defunto monarca um acordo, por meio do qual ele o reconhecia como rei de Portugal. Inteirado da sua decisão, fez uma visita ao novo soberano leonês. Segundo os historiadores, o motivo principal foi falar das fronteiras, em especial a galega de Toroño, sobre as quais o monarca português tinha alguma jurisdição. Terá sido então adiantado nessas conversações o nome de Urraca como possível mulher do jovem rei? Fernando acabara de fazer vinte anos, e parece que até ao momento não se falara do seu casamento. Agora convertido em soberano, e numa idade mais do que respeitável para contrair matrimónio, por que não haveria o rei de Portugal de tentar a possibilidade de casar a sua filha primogénita? É certo que na altura Urraca tinha apenas sete anos, mas isso não constituía impedimento da realização de negociações para o seu futuro matrimónio. Segundo as regras da época, o matrimónio católico constava de duas partes; a primeira, chamada palavras de futuro, isto é, os esponsais, era válida a partir dos sete anos; só para a segunda, ou palavras de presente era necessário que a esposa tivesse cumprido doze anos.
Fosse como fosse, poucos meses depois do encontro, ou seja, em Maio de 1158, Fernando reuniu-se em Sahagún com o seu irmão, Sancho, rei de Castela, para tentar acabar com as pretensões reais daquele que viria a ser seu sogro. E ali assinaram um tratado que tornava letra morta os de 1143 de Afonso Henriques com Afonso VII de Castela e Leão, que mencionámos antes. A má nova não tardou a chegar à corte em Coimbra. Contudo, a morte prematura de Sancho de Castela pareceu reduzir o perigo. Os interesses de Fernando II de Leão a respeito de Portugal sofreram necessariamente uma demora, não só porque lhe faltou o seu irmão e principal aliado, mas também porque a instabilidade do reino castelhano, devido a que o novo rei não atingira ainda a maioridade, lhe abria perspectivas de ingerência mais apetecíveis. A conjuntura foi rapidamente aproveitada pelo oportuno monarca português para atacar a parte mais vulnerável da fronteira com o reino leonês, isto é, a Galiza e ocupar a região de Toroño, sobre a qual podia fazer valer certos direitos.
A demonstração de força por parte dos portugueses obrigou Fernando a deixar de momento a meseta castelhana, onde se encontrava, e a dirigir-se para norte. O bispo de Braga, tradicional aliado do rei português, serviu como mediador para que os diplomatas fernandinos começassem a preparar conversações com Afonso Henriques. Essas conversações entre os dois soberanos tiveram lugar em Cabrera, em Novembro de 1158. Escreveu-se que apenas assentaram num diferimento das questões suscitadas e numa delimitação provisória das fronteiras. O rei de Portugal aproveitou a ocasião para iniciar negociações com o conde de Barcelona, ali presente, com a ideia de casar a sua filha Mafalda com o herdeiro do catalão. De qualquer forma, essa aliança só seria selada a 30 de Janeiro de 1160. Afonso Henriques pretendia, com esse matrimónio, garantir o apoio de fora da órbita castelhano-leonesa. A partir de então, Fernando de Leão desencadeou uma reacção aos planos matrimoniais do monarca português, que deu lugar a uma verdadeira estratégia de tensão.
A primeira provocação, leonesa consistiu no repovoamento, em 1161, da então aldeia de Ciudad Rodrigo, situada num ponto estratégico do caminho que ia da leonesa Salamanca à portuguesa Coimbra. Afonso Henriques respondeu tomando Salamanca em l163, onde chegou a contar com a ajuda dos seus habitantes. Mas a posse foi efêmera, ao contrário do que sucedeu com os seus ataques com êxito à região galega, que iriam pressagiar a conquista de Compostela». In Marsilio Cassotti, Infantas de Portugal, Rainhas de Espanha, tradução de Francisco Boléo, A Esfera dos Livros, Lisboa, 2012, ISBN 978-989-626-396-6.

Cortesia ELivros/JDACT