sexta-feira, 8 de novembro de 2019

Chaves e as suas Fortificações. Paulo Dordio. «A rede urbana portuguesa, aparentemente imobilizada no tempo, da Baixa Idade Média à Contemporaneidade, constituída por uma boa armadura de pequenos centros urbanos que contrasta com a inexistência das cidades…»

Cortesia de wikipedia e jdact

Evolução Urbana e Arquitectónica
Cidades Portuguesas no Tempo. Rede Urbana e Sociedade em Portugal
«(…) A explicação da cultura político-institucional prevalecente no passado, matricialmente distinta, e da forma como esta lidava com a divisão territorial, são dois dos temas explorados por aquela nova investigação histórica a qual reafirma então que conceito de Estado não deve ser usado para analisar os universos político-institucionais do Antigo Regime, caracterizados na teoria e na prática, até meados do século XVIII, pela coexistência, a par da coroa, de diversos corpos dotados de uma esfera de jurisdição própria e irredutível, onde se incluiriam, entre outros, a Igreja, o poder senhorial e, também, o poder municipal. Esta investigação, que se estendeu à história da sociedade portuguesa medieval, moderna e contemporânea, bem como das formas da sua expressão territorial, acentuaria a vitalidade e a autonomia dos corpos políticos locais bem como a dimensão anti-regional do poder municipal ao mesmo tempo que constatava a escassez dos meios ao dispor do poder central, para a concretização do projecto de centralização política cujo anúncio precoce data da Baixa Idade Média e em particular dos reinados de Afonso III (1245-1279) e de Dinis I (1279-1325). Não mais seria possível enfrentar o estudo do urbanismo português sem as perspectivas abertas por este aprofundamento irredutível dos conceitos e das premissas.
A rede urbana portuguesa, aparentemente imobilizada no tempo, da Baixa Idade Média à Contemporaneidade, constituída por uma boa armadura de pequenos centros urbanos que contrasta com a inexistência das cidades médias adquire todo um novo significado quando explicada no âmbito da matriz institucional do espaço político de Antigo Regime (António Manuel Hespanha, L’ Espace Politique dans l’Ancien Regime, 1983). Ao basear a estrutura de legitimação do poder na tradição, o espaço habitado por uma comunidade natural passa a constituir a unidade política básica. Desta matriz decorre quer a rigidez e indisponibilidade da organização política do espaço quer a sua miniaturização. A nível local desenvolve-se uma mentalidade e culturas autárcita que privilegia o ideal de auto-suficiência. A incapacidade para crescer é outra das consequências desta matriz e cultura políticas. As palavras que José Mattoso utiliza para descrever os concelhos medievais do interior poderiam aplicar-se à generalidade dos núcleos urbanos concelhios ao longo de todo o Antigo Regime:

Quero-me referir particularmente à constante tendência para as cidades crescerem, alargando o espaço que ocupam, atraindo mais gente, diversificando as funções económicas e multiplicando os poderes. Os concelhos medievais do interior têm uma capacidade de expansão limitada. Quando alargam o seu território tendem a fragmentar-se em concelhos menores. (…). Ao fim e ao cabo, parece ser a tendência autonómica dos concelhos do interior em relação ao poder central, e a compartimentação do espaço que eles controlam, os dois factores determinantes da sua feição estática em termos urbanísticos.

Concomitantemente, não se verifica um processo de hierarquização dos núcleos urbanos. E no pensamento político, a boa dimensão de uma povoação é a que não ultrapassava a escala local: as cidades, reescrevia-se em Portugal no século XVII, não deviam ser muito grandes nem muito pequenas, seguindo a mediania aristotélica, de modo a que fosse possível ouvir em todos os cantos a voz do pregoeiro, isto é, onde a sociabilidade fosse a de uma comunidade (Manuel Botelho Ribeiro Pereira, Diálogos Moraes e Políticos, Viseu. Por outro lado, os conceitos de centro e periferia são os adoptados para descrever e explicar a relação entre a Coroa e os corpos políticos autónomos como os municípios ou as cidades. As expressões designam não tanto espaços geográficos delimitados mas antes, de um lado, a zona central onde se definem os símbolos, valores e crenças que governam a sociedade, e, por outro lado, a grande maioria da população que se encontra mais ou menos distanciada desse centro (Shils, 1992). A aludida inexistência da dimensão regional é então igualmente equacionada no âmbito dos processos de centralização régia e da escassez dos meios de extensão à periferia ao dispor do poder central (António Manuel Hespanha, 1986)». In Paulo Dordio, Chaves e as suas Fortificações, Evolução Urbana e Arquitectónica, ArqueoHoje, Chaves, Lavantamento Arquivístico e Bibliográfico, 2006, Chaves, Arquivo Municipal de Chaves, 2015, Wikipédia.

Cortesia de AMChaves/ArqueoHoje/JDACT