sexta-feira, 24 de janeiro de 2014

Memória acerca dos portugueses na Abyssínia. 1894. Visconde de Soveral. «A prodigiosa actividade de El-Rei Manuel I levou os portugueses ao descobrimento desde o Indo ao Ganges, de toda a Ethiopia e Pérsia, com todos os mares, portos, enseadas e ilhas, a toda a China e à de Malaca»

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«A conquista de Ceuta por El-Rei João I em 24 de Agosto de 1415, foi, como refere um historiador alemão, o primeiro elo da grande cadeia que os marinheiros portugueses estenderam à roda da África até encontrar o paraíso da Índia. De facto aquele ousado empreendimento não tardou em produzir outros de maior alcance. No ano de 1480, reinando El-Rei Afonso V, Pero da Covilhã é o primeiro português que chega à Abyssínia por terra, seguindo depois pelo mar Roxo, à costa oriental da África até Sofala. Afonso de Albuquerque lança, em 1507, os alicerces há fortaleza de Ormuz (no mar Pérsico), cuja fortaleza Portugal conservara até o ano de 1622, quando Xá Abas, rei da Pérsia, a retomara com auxílio dos ingleses. Existiam ali a esse tempo, cinco igrejas e um convento de padres Agostinhos.
A prodigiosa actividade de El-Rei Manuel I levou os portugueses ao descobrimento desde o Indo ao Ganges, de toda a Ethiopia e Pérsia, com todos os mares, portos, enseadas e ilhas, a toda a China e à de Malaca. Foi aquele monarca quem mandou à Abyssínia, na qualidade de seu embaixador, Francisco Álvares, o qual passados alguns anos, em 1558, publicou a Historia descriptiva da Ethiopia. Damião de Goes e Faria Souza, julgam a obra defeituosa; todavia parece fora de dúvida ser o primeiro escrito detalhado acerca da Abyssínia.
Miguel Castanhoso publicou em 1541 a sua interessante história acerca da expedição dos portugueses sob o mando do valoroso Afonso de Albuquerque. Esta história, apesar de contar 343 anos depois da sua publicação, o governo italiano julgou acertado (no interesse da sua recente expedição à Abyssínia) mandar traduzi-la sob o título: Storia della spedizione Portughese in Abyssinia nel seculo XVI, narrata da Michelo de Castanhoso. Os primitivos exploradores portugueses eram invariavelmente seguidos de fervorosos missionários das ordens religiosas que n'essas épocas remotas de preferência se empregavam na propagação da fé, as de Santo Agostinho, S. Francisco e S. Domingos. Foram os missionários d'essas ordens os primeiros que levaram a religião cristã a África, Ásia e América. Apenas organizada a Companhia de Jesus, em 1540, os padres daquela ordem, especialmente os portugueses, prestaram importantes serviços à fé, à civilização, a agricultura e ao comércio, em toda a vastidão do território aonde o pendão das quinas tinha alcançado. A eles é igualmente devida a descoberta da origem do Nilo. Os padres portugueses Fedro Paes e Francisco Lobo levaram a efeito essa arrojada empresa.
Segue-se a narrativa, publicada em 1665, do Patriarca João Bermudez, o qual viera a Portugal na qualidade de embaixador do rei da Abyssínia junto de El-Rei Sebastião. O Patriarca descreve com especialidade os combates e as vitórias de Christovão da Gama na Abyssínia. Os padres da Companhia, Patriarca Afonso Mendes, Melchior Silva, Francisco Lobo e Nicolau Godinho, escreveram igualmente sobre a Abyssínia. Este padre publicou em Roma, (em latim), três obras importantes; uma refutando o que sobre a Abyssínia escrevera o padre Luís Urreta, espanhol, e frade dominicano. A segunda acerca da vida do padre Gonçalves Silveira, martirizado na África oriental, em 15 de Março de 1561; e a terceira, De Abassiorum Rebus de que Aithiopiae Patriarchus Joanne Nonio Barreto & Andrea, Oviedo1615.
Que os escritos dos missionários portugueses eram tidos em grande apreço nos séculos XVI e XVII, temos muitas provas; entre outras uma carta geográfica (da qual possuímos um exemplar), publicada em Veneza no tempo da Republica, intitulada: Abyssinia, dove sono le Fonti del Nilo, discrita secondo le relationi de P. P. Mendes, Almeida, Paes, Lobo e Lodulfo. A história da Abyssínia do padre Balthazar Telles, publicada em 1660, merece particular atenção: Historia general da Ethiopia a alta ou Preste João, e do que n’ella observaram os padres da Companhia de Jesus, composta na mesma Ethiopia pelo padre Manoel d'Almeida, natural de Vizeu, Provincial e Visitador que foi na India, abreviada com novas relações e methodo pelo padre Balthazar Telles, natural de Lisboa, Provincial da Provincia Lusitana». In Visconde de Soveral, Memória acerca dos portugueses na Abyssínia, Porto, Tipografia do Comércio do Porto, 1894.

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