segunda-feira, 27 de julho de 2015

Os bons velhos tempos da prostituição em Portugal. Alfredo A. Pessoa. «Era o culto impuro inventado pelos homens, e as mulheres não tardavam a imitá-los, inventando o culto da natureza máscula, deificada em Adónis…»

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Os Fenícios: suas deusas impuras, que afinal eram os órgãos sexuais da mulher
«Não era só o comércio e as artes que as galés fenícias transportavam, sulcando rapidamente o mar, para as terras ocidentais. Juntamente com Melcarte vinha o simulacro de Astarte, e o culto dessa deusa impura teria de perverter os costumes simples dos primitivos habitadores das regiões da Ibéria. De Babilónia, a grande cidade corrompida, a prostituição espalhara-se largamente, como um flagelo, pela Ásia e pela África, até ao fundo do Egipto e da Pérsia. Em cada país onde a semente corruptora germinava, a prostituição ia tomando novos aspectos e o culto impuro revestia novas formas.
Na Arménia, Vénus, a deusa impura, tinha o nome de Anaítis; a fenícia chamava-se Astarte. Sob este nome deificavam-se os órgãos sexuais da mulher. Era o culto impuro inventado pelos homens, e as mulheres não tardavam a imitá-los, inventando o culto da natureza máscula, deificada em Adónis, que foi mais tarde o lúbrico Príapo, adorado no Ocidente. A Vénus fenícia tinha templos em Tiro, em Sídon e nas principais cidades da nação, sendo os mais célebres os de Heliópolis e de Afaque, nas proximidades do monte Líbano. À noite, a multidão povoava esses templos e, em honra da deusa, os homens disfarçavam-se em mulheres e as mulheres em homens, entregando-se com furor à mais infrene orgia. O sacerdote dirigia as lúbricas cerimónias e uma música horrenda sufocava os gritos libidinosos daquelas cenas nefandas, permitidas por uma religião imoral e imprópria de um povo tão adiantado.
A lei da hospitalidade impunha aos Fenícios o dever de prostituírem suas filhas aos estrangeiros. O hóspede não podia sem desdouro recusar este testemunho de benevolência, e o chefe de família era o próprio que apresentava a vítima para o sacrifício obsceno. Quando os Fenícios aportaram à Espanha, e povoaram de cidades o litoral, os templos de Vénus multiplicaram-se em todos os seus estabelecimentos. A marinha mercante deste povo encarregava-se de levar a toda a parte a corrupção que o infestava e cada novo empório aceitava de bom grado um culto que lisonjeava todas as paixões. Em volta dos templos da deusa impura levantavam-se tendas onde as raparigas iam sacrificar-se à Vénus fenícia. De princípio, estes sacrifícios obscenos não tinham carácter religioso. Os navegadores estabeleciam ao longo das costas lugares de prostituição, onde pudessem encontrar facilmente o prazer, depois de uma longa travessia. Com o andar dos tempos, os sacerdotes associaram a estas orgias a ideia religiosa, invocando, para proteger o recinto dissoluto, a Vénus fecunda dos seus altares.
Os templos da deusa eram, de ordinário, edificados em lugares elevados, de onde se avistava o mar. Ao largo, os navegadores descobriam a mansão da deusa e esta visão suave aparecia-lhes como uma promessa de prazer e de repouso, após uma viagem difícil e arriscada. Industriados pelos Fenícios no comércio e nas artes, os povos do litoral da Ibéria não tardaram também a imitar-lhes a corrupção. A prostituição teve, por essa época, nos estabelecimentos fenícios da Península, o mesmo carácter de mercantilismo que este povo imprimia a todas as suas manifestações. Antes do casamento, as  raparigas iam fazer o sacrifício do pudor para ganharem o dote e tinham o direito de escolher marido quando a quantia ganha desse modo era considerável. Como já dissemos, o esposo por elas escolhido não podia deixar de aceitar semelhante honra e, bom ou mau grado seu, tinha de receber por legítima esposa aquela mulher prostituída.
Havia também a prostituição na escravatura. Os Fenícios compravam ou raptavam donzelas que levavam para o seu país, ou que vendiam mesmo nas suas paragens ao longo do Mediterrâneo, quando o preço era convidativo. A Ibéria fornecia-lhes um grande contingente para este comércio odioso, que eles exploravam torpemente, no seu positivismo de mercadores endurecidos, que não atendiam senão ao lucro e dele faziam o seu deus predilecto». In Alfredo Amorim Pessoa, Os bons velhos tempos da prostituição em Portugal, Antologia, 1887, Anotações, 1976, Antígona_Frenesi, 2006, Lisboa, ISBN 972-608-175-0.

Cortesia de Antígona /JDACT