segunda-feira, 10 de fevereiro de 2020

A Batalha de Moscovo. Andrew Nagorski. «É provável que a Batalha de Moscovo tenha sido a mais importante da Segunda Guerra Mundial e, indiscutivelmente a maior entre dois exércitos»

Cortesia de wikipedia e jdact

«No Outono de 1941, dois exércitos gigantescos lutaram ferozmente nas estradas do norte, sul e oeste que levavam a Moscovo. De ambos os lados do campo de batalha, o comando não estava com os generais, mas com os tiranos Adolf Hitler e Joseph Stalin, que davam ordens sem hesitar em mandar milhões para a morte, fosse em combate, fosse nas prisões e nos campos de concentração. Os dois demonstraram uma determinação implacável e, por vezes, tácticas brilhantes, mas tiveram também momentos de miopia estratégica em escala colossal. Hitler enviou os seus exércitos para a Rússia sem fardas de frio, pois estava convencido de que triunfariam muito antes das primeiras neves do Inverno. Stalin mandou muitos dos seus soldados sem armas para a batalha, pois não tinha preparado o país para a invasão nazista. Isso selou o destino de milhares de alemães condenados à morte pelo frio no primeiro Inverno da campanha russa e de incontáveis milhares de soldados do Exército Vermelho condenados à morte instantânea por não terem tempo suficiente para pegar alguma arma que encontrassem entre os mortos e agonizantes.
A Batalha de Moscovo, que oficialmente durou de 30 de Setembro de 1941 até 20 de Abril de 1942, mas que na realidade cobriu um período maior que esses, 203 dias de ininterrupto assassinato em massa, marcou o primeiro fracasso da táctica de Blitzkrieg dos exércitos de Hitler. Quando esmagaram a Polónia, França e grande parte do restante da Europa com uma velocidade de tirar o fôlego, aqueles exércitos pareciam impossíveis de serem detidos. Essa derrota, entretanto, foi mais que apenas outra batalha perdida, lembrou nas suas memórias Fabian von Schlabrendorff, um dos oficiais que mais tarde participariam da conspiração contra Hitler. Com ela se perdeu o mito da invencibilidade do soldado alemão. Foi o começo do fim. O exército alemão nunca se recuperou completamente daquela derrota. É verdade, mas as forças alemãs continuariam a lutar com incrível tenacidade e a derrota final só viria muito tempo depois, e por isso esses julgamentos só foram possíveis com o benefício da avaliação retrospectiva.
É provável que a Batalha de Moscovo tenha sido a mais importante da Segunda Guerra Mundial e, indiscutivelmente a maior entre dois exércitos. Combinando os totais dos dois lados, aproximadamente sete milhões de soldados se envolveram nalgum episódio dessa batalha. Desses, 2,5 milhões morreram, foram feitos prisioneiros, desapareceram em acção, ou se feriram com gravidade suficiente para exigir hospitalização, sendo muito maiores as baixas no lado soviético do que no alemão. De acordo com os registos militares russos, 958 mil soldados soviéticos pereceram, número que inclui mortos, desaparecidos e prisioneiros. Considerando o tratamento que receberam dos seus captores, a maioria dos prisioneiros de guerra russos foi efectivamente condenada à morte. Outros 938.500 foram hospitalizados, totalizando em 1.896.500 as perdas soviéticas. O número correspondente de soldados alemães chegou a 615 mil.
Por comparação, as baixas em outras batalhas épicas, apesar de aterrorizantes, nunca chegaram perto desses números. Na imaginação popular, a Batalha de Stalingrado, de Julho de 1942 até Fevereiro de 1943, é geralmente considerada a mais sangrenta dessas lutas. Ela também foi enorme, mas ainda assim muito distante do tamanho da Batalha de Moscovo. Em Stalingrado, tomaram parte 3,6 milhões de soldados, e as perdas dos dois lados chegaram a 912 mil soldados, bem inferior aos 2,5 milhões na Batalha de Moscovo. Nenhuma das mais importantes batalhas da Primeira e da Segunda Guerra Mundial se aproximou dos números de Moscovo. Na Batalha de Gallipoli, por exemplo, as baixas dos soldados turcos e aliados foram de cerca de 500 mil; na Batalha do Somme, de Julho a Outubro de 1916, as baixas alemãs, inglesas e francesas somaram cerca de 1,1 milhão. E apenas em termos do número de soldados envolvidos na luta, muitas outras batalhas lendárias da Segunda Guerra Mundial nem chegaram a pertencer à mesma classe da Batalha de Moscovo. Na Batalha de El Alamein, durante a campanha do Norte da África, por exemplo, os exércitos antagonistas totalizaram 310 mil soldados.
Essa foi também uma batalha que se desenrolou diante de uma plateia global, quando Estados Unidos, Inglaterra, França, Japão e outros tomavam decisões com base na avaliação do seu resultado provável. Não há dúvida de que, se os alemães não tivessem sido rechaçados nos arredores de Moscovo, as suas repercussões teriam sido sentidas em todo o mundo. Ainda assim, a Batalha de Moscovo está hoje bastante esquecida. Os historiadores têm dado muito mais atenção às batalhas de Stalingrado e do saliente de Kursk, que representaram vitórias claras contra as forças de Hitler, e ao pavoroso drama humano do cerco de Leningrado. Por outro lado, o início da Batalha de Moscovo, marcado pelo número excessivo de erros de Stalin, apesar de ter levantado muitas perguntas perturbadoras, não teve o mesmo nível de atenção. O resultado foi ter sido tantas vezes discutida apressadamente nos livros de História e nunca ter atingido o mesmo tipo de status mitológico das vitórias posteriores. Mas é precisamente por causa de seu papel crucial no período inicial da Segunda Guerra Mundial, e do que ela revelou sobre a natureza dos gigantes totalitários que se enfrentaram, que a Batalha de Moscovo deve finalmente ser contada e colocada no lugar que merece na História da guerra». In Andrew Nagorski, A Batalha de Moscovo, 2007, Editora Contexto, 2013, ISBN 978-857-244-797-3.

Cortesia de EContexto/JDACT