quarta-feira, 8 de julho de 2020

Os Pilares da Terra. Ken Follett. «Eles permaneceram na aldeia durante todo o Verão. Mais tarde, vieram a considerar essa decisão como um erro terrível; na ocasião…»

Cortesia de wikipedia e jdact

«(…) Tom sentou-se subitamente na pilha de madeira. Perguntou-se o que tinha dado nele. Fora loucura desafiar lorde William daquele jeito. Sorte sua estar vivo. O tropel do cavalo de batalha de William diminuiu de volume, transformando-se num trovão distante, e o seu escudeiro esvaziou a bolsa em cima de uma mesa. Tom sentiu uma onda de triunfo, quando os pennies de prata rolaram à luz do sol. Fora loucura, mas dera certo: tinha garantido o pagamento justo para si próprio e para os homens que trabalhavam sob suas ordens. Até mesmo os lordes devem obedecer ao costume, disse, meio para si mesmo. Agnes o ouviu. Só espero que nunca venha a precisar de lorde William, disse amargamente. Tom sorriu para a mulher. Era capaz de entender a grosseria, sabendo que tinha se assustado. Não se preocupe demais, senão nada lhe restará excepto leite azedo nos seios, quando o bebé nascer. Não serei capaz de alimentar nenhum de nós a menos que arranje trabalho para o Inverno. O Inverno está muito longe, disse Tom.

Eles permaneceram na aldeia durante todo o Verão. Mais tarde, vieram a considerar essa decisão como um erro terrível; na ocasião, porém, pareceu bastante sensato, pois Tom, Agnes e Alfred podiam ganhar um penny por dia cada um trabalhando no campo durante a colheita. Quando chegou o Outono e tiveram que se mudar, possuíam um saco pesado de pennies de prata e um porco cevado. Passaram a primeira noite na entrada coberta de uma igreja da aldeia, mas no segundo dia encontraram um convento e gozaram da hospitalidade dos monges. No terceiro dia viram-se no coração da floresta Chute, uma vasta área coberta de mato fechado e muitas árvores, numa estrada não muito mais larga que um carro de boi, com a luxuriante vegetação do Verão morrendo entre os carvalhos de cada lado. Tom carregava as ferramentas menores num saquinho e pendurara os martelos no cinto. Tinha o manto dobrado debaixo do braço esquerdo e o espigão de ferro na mão direita, usando-o como uma bengala. Sentia-se feliz por estar na estrada de novo. Seu próximo trabalho poderia ser na construção de uma catedral. Poderia tornar-se mestre pedreiro, permanecer ali o resto da vida, e construir uma igreja tão maravilhosa que lhe garantisse um lugar no céu.
Agnes levava as poucas coisas de casa que tinham dentro da panela que amarrara nas costas. Alfred carregava as ferramentas que usariam para construir uma nova casa em algum lugar: um machado, uma enxó, um serrote, um martelo pequeno, uma sovela para fazer buracos no couro e na madeira e uma pá. Martha era pequena demais para carregar qualquer coisa, excepto a tigela e a faca amarradas no cinto e o manto de inverno nas costas. Tinha, contudo, a obrigação de conduzir o porco até que pudessem vendê-lo num mercado.
Tom conservou-se atento em Agnes enquanto atravessavam aquela interminável floresta. Já passara da metade da gravidez, e carregava um peso considerável na barriga, assim como nas costas. Mas parecia incansável. Alfred também estava óptimo: naquela idade os garotos dispõem de mais energia que capacidade de usá-la. Só Martha se cansava. Suas perninhas finas eram feitas para as correrias dos seus brinquedos, não para as longas marchas, e a menina ficava constantemente para trás, fazendo com que os outros tivessem que parar e esperar por ela e pelo porco. Enquanto caminhava, Tom pensava na catedral que construiria um dia. Começou, como sempre, imaginando uma passagem em arco. Era muito simples: dois pilares sustentando um semicírculo. Imaginou depois um segundo conjunto exactamente igual ao primeiro. Colocou os dois juntos, na sua cabeça, para formar uma passagem em arco. Depois acrescentou outro, e mais outro, muitos mais, até que tinha toda uma fileira, formando um túnel. Essa era a essência de um prédio, pois tinha um tecto para não deixar entrar chuva e duas paredes para sustentar o tecto. Uma igreja não passava de um túnel, com refinamentos». In Ken Follett, Os Pilares da Terra, 1989, Editorial Presença, 2007, ISBN 978-972-233-788-5.

Cortesia de EPresença/JDACT