terça-feira, 20 de agosto de 2019

A Cal para Caiar o Universo. Ruy Ventura. «Do que é certo desconfia do duvidar te enamora é bom não saber de Deus quem de dentro a Deus adora»

Cortesia de wikipedia e jdact

Cartas e quadras de Agostinho da Silva
«(…) Em todas estas quadras de Agostinho da Silva há uma grande reflexão sobre a existência de Deus ou sobre o que ele pensava ser a íntima essência da divindade. Sem fazer comentários (cada um deverá fazer os seus comentários interiores), apresento-vos algumas das quadras que publicou sobre essa temática:

Se não sabes o caminho
e a sorte nenhum prefere
toma então pelo mais duro
é esse o que Deus te quer.

Acho que Deus não escreve
e também que Deus não fala
e que nos sustenta vivos
a vida que nele cala.

Dizendo que é só amor
fazes Deus menor que Deus
cercas o ilimitado
dos limites que são teus.

E venha filosofia
teologia que farte
o que se pense de Deus
é só de Deus uma parte.

Mais que a teu Deus sê fiel
ao que tu sejas de Fé
talvez o Deus que te crias
oculte o Deus que Deus é.

O mais simples alicerce
traz logo a casa traçada
se eu quiser chegar a Deus
começarei por ser nada.

Posso dizer-lhes de Deus
quanto queiram mas calado
aprovarão se há silêncio
mas se me escutam cuidado.

Se Deus quisesse ocupar
lugar a si mesmo igual
preenchia todo o nada
e o deixava tal e qual.

Sobre o Espírito Santo, cujo culto Agostinho considerava ser a essência da cultura portuguesa, tem uma quadra sintética e bem demonstrativa da sua posição:

Do que é o Espírito Santo
só diga quem fique mudo
que palavra há que me leve
àquele nada que é tudo.

Há sempre uma grande aceitação tanto do mundo transcendente quanto do mundo concreto, imanente, em que todos nós vivemos. Embora acredite na crença, esta tem sempre base na desconfiança, na dúvida. Só com o vencimento das dúvidas, das desconfianças, é que se chega à crença, sendo no entanto sempre uma crença imperfeita. Refere:

Do que é certo desconfia
do duvidar te enamora
é bom não saber de Deus
quem de dentro a Deus adora.

E o mesmo diz do mistério. Ao longo da História, por motivos naturais e aceitáveis, o ser humano tem tentado constantemente vencer os mistérios e os segredos. Andamos sempre em demanda de uma revelação dos segredos».
In Ruy Ventura, A Cal para Caiar o Universo, www.arquivors.com/ruy_acal.pdf, 2007, Wikipedia.

Cortesia de Wikipedia/JDACT