domingo, 21 de julho de 2019

O Quarto da Rainha. Segredo de Estado. Juliette Benzoni. «Dar um último passeio, senhora, visto que dentro em breve regressaremos a Paris. E para que bandas? Seria para o lado de Sorel?»

Cortesia de wikipedia e jdact

A menina de pés descalços, o sinete de cera vermelha. 1626
«(…) Um belo sorriso esparso, que ele lhe devolveu como pôde, mas que não escapara a dele! A Mme. de Vendôme, de muito mau humor, nesse dia em que desempenhava o papel de chefe de família numa cerimónia que não lhe agradava. Efectivamente, o seu esposo, o duque César, encontrava-se retido no governo da Bretanha, onde se atarefava em criar dificuldades ao homem que mais detestava no mundo: o cardeal Richelieu, ministro do rei Luís XIII. Todavia, durante o regresso, ela nada disse. Quando, após uma noite agitada, François desceu às cavalariças nas primeiras horas da alvorada, teve, no entanto, a surpresa de encontrar o escudeiro de sua mãe, o cavaleiro de Raguenel, que não parava de andar de um lado para o outro no meio das idas e voltas dos moços de estrebaria e dos aguadeiros. François fez de conta que não o vira, mas o empregado veio ter com ele na altura em que chegava aos portões. Ora bem, meu senhor François, onde pretendeis dirigir-vos a estas horas tão matinais? Dar um último passeio. Perceval Raguenel era um homem cortês, amável; contudo, François achou-o francamente antipático quando ele lhe perguntou: e para onde contais ir, por favor? Acaso ignorais que temos de regressar a Paris daqui a pouco? O que vos deixa sem tempo disponível. A não ser que tenhais apenas a intenção de dar a volta ao parque... François ficou todo corado: quer dizer, eu... Já não conseguia encontrar as palavras. O escudeiro veio em seu auxílio: e se fôsseis falar à senhora duquesa? Ela espera-vos nos seus aposentos. A minha mãe? Mas, porquê? Penso que vos dirá. Despachai-vos! Dentro de dez minutos ela irá à capela ler o livro de orações.
Como não descortinava maneira de agir de outro modo, François desatou a correr e, alguns momentos mais tarde, uma camareira introduzia-o no quarto onde Françoise Vendôme acabava de se pentear. Era o antigo quarto de Diane Poitiers, uma divisão sumptuosa, mas não muito mais do que o eram as outras vinte e duas daquele castelo quase real. As paredes e o tecto estavam pintados de cores vivas, realçadas a ouro; vários tapetes cobriam o soalho precioso e tapeçarias magníficas aqueciam quase tanto a atmosfera quanto o fogo que ardia na grande chaminé de mármore multicolor. Nessa manhã de Março, o dia passava através das travessas da janela onde se encastoavam vitrais pintados em camafeu cinzento que, podendo dar a ilusão de um relevo e representando cenas do Antigo Testamento, não deixavam filtrar nenhuma luz; no entanto, o fogo e as altas velas de cera branca encarregavam-se disso.
Logo que transpôs a entrada, o jovem fez uma saudação, avançando, em seguida, para sua mãe, no meio do bailado das acompanhantes que o olhavam sorrindo. Quanto a Mme. Vendôme, ela não sorria. Ah! Eis-vos aqui! Julie, parece-me que isto está bem, acrescentou, dirigindo-se à sua cabeleireira. Agora deixem-me e ide-vos todas embora. Depois, quando a última aia transpôs a porta: pois bem, onde contáveis ir a estas horas da manhã? Dar um último passeio, senhora, visto que dentro em breve regressaremos a Paris. E para que bandas? Seria para o lado de Sorel? O pequeno príncipe corou sem ousar responder, considerando a mãe com certa apreensão. Na realidade, apesar do cuidadoso amor que lhes dispensava, sem o mostrar excessivamente, Françoise Lorraine-Mercceur, duquesa de Vendôme pelo seu casamento, possuía o dom de impressionar as suas três crianças bem mais que o pai delas, o duque César, cujo carácter jovial e inclinação pelas brincadeiras frequentemente jocosas e cuja despreocupação recordavam muitas vezes as suas origens da região de Béarn (é uma região que corresponde à parte oriental do departamento dos Pirenéus-Atlânticos Unida ao condado de Foix (1290), no século XV passa com este para a casa de Navarra. O futuro rei Henrique IV, rei de Navarra em 1572, foi o último conde de Béarn; Luís XIII anexá-la à Coroa em 1620), faziam dele um interlocutor menos imponente». In Juliette Benzoni, O Quarto da Rainha, Segredo de Estado, 1997, Bertrand Editora, 2000, 2009, ISBN 972-251-097-5, ISBN 978-972-251-821-5.

Cortesia de BertrandE/JDACT