quinta-feira, 23 de abril de 2020

A Conquista de Arzila pelos Portugueses. 1471. Paulo Mesquita Dias. «Num primeiro momento serão estudadas as conjunturas internas dos reinos ibéricos, Portugal, Castela, Aragão, Navarra e Granada, e do sultanato de Fez…»

Cortesia de wikipedia e jdact

«(…) Foi face a esta escassez de estudos acerca de Arzila, e particularmente relativos à sua conquista, que surgiu a ideia para a elaboração desta dissertação de mestrado. Essa falta de estudos de caso sobre as conquistas portuguesas em Marrocos, visível não só no que em cima deixamos dito mas também num artigo da autoria de João Gouveia Monteiro e Miguel Gomes Martins, revela-se para nós uma oportunidade, uma vez que nos permite inserir a nossa dissertação de mestrado numa lacuna da historiografia portuguesa, ao estudarmos de forma o mais aprofundada possível a conquista de Arzila, algo que até ao presente momento é inédito. Assim sendo, e face a tudo o que até este momento foi dito, parece-nos importante fazer uma análise mais detalhada daquele que será o objecto de estudo desta dissertação de mestrado. Antes de mais é necessário compreender a conquista de Arzila enquanto um acontecimento situado num tempo e espaço específicos. A dissertação terá o seu início com a escolha do alvo a atacar, passará pelos preparativos feitos para a expedição, humanos e materiais, pela conquista de Arzila propriamente dita, pela ocupação de Tânger e pelo tratado de tréguas assinado com o sultanato de Fez, para terminar com o regresso do rei e boa parte da armada ao reino. Todos estes acontecimentos ocorrem no ano de 1471, mas por vezes será necessário, para melhor ilustrar determinadas situações, recorrer a exemplos de campanhas anteriores, como a conquista de Alcácer Ceguer em 1458, ou posteriores, como a guerra contra Castela de 1475-1479.
Num primeiro momento serão estudadas as conjunturas internas dos reinos ibéricos, Portugal, Castela, Aragão, Navarra e Granada, e do sultanato de Fez, para compreender como estas permitiam, ou não, o lançamento de uma expedição militar em 1471. Para Afonso V era particularmente importante não só ter um reino pacificado a nível interno, mas também ter garantias suficientes de que Portugal não seria invadido por Castela assim a armada zarpasse rumo ao Norte de África. Mais, era essencial conhecer a situação interna do sultanato de Fez por forma a saber quais as hipóteses de sucesso da campanha, face à oposição que seria expectável que se viesse a enfrentar, bem como o alvo mais propício a atacar, Arzila ou Tânger. Sendo consideradas propícias as conjunturas interna e externa e estando escolhido o alvo a atacar, era então chegada a altura de começar a preparar os meios para a campanha. O recrutamento dos homens será estudado de acordo com as crónicas e os registos da chancelaria régia por forma a compreender não só quantos indivíduos participaram na conquista de Arzila, mas também quem eram estes homens, que papéis desempenharam e como foram recompensados pelo serviço prestado à Coroa. Já no que diz respeito aos preparativos materiais, como sejam a compra de mantimentos e armas, defensivas, ofensivas, de cerco etc., bem como o fretamento de navios, será feito recurso a, sobretudo, documentação de chancelaria. Tentaremos ainda compreender como foi possível a Coroa portuguesa pagar a expedição tendo em conta os seus rendimentos à época.
O cerne da dissertação é a conquista propriamente dita, e é sobre o decorrer desta que esperamos construir uma narrativa que permita compreender a forma como julgamos terem tido lugar os acontecimentos. Serão analisados da forma mais completa possível as várias fases do cerco, desde o desembarque até à conquista derradeira, dando especial atenção às figuras que desempenharam papéis mais importantes nas várias fases, desde o rei e do príncipe, até aos condes de Monsanto e Marialva. Também as repercussões da conquista de Arzila são essenciais ao nosso estudo, como a ocupação de Tânger, o assinar da trégua com o sultanato de Fez e o retorno das ossadas do infante Fernando a Portugal, e como tal serão alvo de estudo. Procuraremos ainda analisar as razões que levaram Afonso V a assinar as já referidas tréguas, o que significava o final das suas ambições marroquinas. Estas razões permanecem até hoje alvo de interrogação por parte dos historiadores, pelo que as procuraremos explicar, demonstrando que o rei teria já noção de que não existia em Portugal capacidade material e humana suficiente para conquistar todo o sultanato de Fez.
Este estudo será elaborado tenho em conta sobretudo os relatos legados por Jean Wavrin, borgonhês, contemporâneo dos acontecimentos e bem informado, e por Rui Pina e Damião Góis, funcionários da Coroa portuguesa que escreveram as suas crónicas respectivamente em inícios e meados do século XVI, bem como por outra documentação de tipo narrativo, como sejam os Anais, Crónicas e Memórias Avulsas de Santa Cruz de Coimbra, organizados por António Cruz, da Crónica da Fundação do Mosteiro de Jesus, de Aveiro, e Memorial da Infanta Joana filha del Rei Afonso V: Códice quinhentista, organizada por António Gomes Rocha Madahil, ou dos Anais de Arzila da autoria Bernardo Rodrigues e organizados por David Lopes. Como já tivemos oportunidade de referir, a documentação da chancelaria de Afonso V desempenhará ao longo da dissertação um papel de suma importância. Será, de resto, feito recurso também a colectâneas documentais já publicadas como a Monumenta Henricina e os Descobrimentos Portugueses: Documentos para a sua História de João Martins Silva Marques. Como já antes referimos, os estudos que até ao momento abordaram a conquista de Arzila pecaram pela falta de uso de documentação de chancelaria, uma vez que esta permite trazer nova luz sobre algumas afirmações menos claras dos cronistas, ou mesmo revelar algumas lacunas relativas a datas ou factos que estes cometem». In Paulo A. Mesquita Dias, A Conquista de Arzila pelos Portugueses, 1471, Dissertação de Mestrado em História, Especialidade História Moderna e Descobrimentos, Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, Universidade Nova de Lisboa, 2015.

Cortesia de FCSH/UNLisboa/JDACT