sexta-feira, 25 de setembro de 2015

Um Rei Avesso à Política. Fernando II. Maria Antónia Lopes. «O rei dos Franceses, que não desejava criar conflitos com a Inglaterra e porque o futuro dos reis constitucionais de Portugal era mais do que incerto, não avançou com a candidatura de um filho…»

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Convite para ser rei. A escolha de Fernando Augusto de Coburgo
«(…) Todas as diligências teriam de ser feitas em completo sigilo porque estava em causa a dignidade da rainha e do país. De facto, seria bem pouco honroso se se soubesse que se procurava um marido para a monarca portuguesa e que esta recebia recusas. Tais instruções haviam sido cuidadosamente redigidas pelo ministro dos Negócios Estrangeiros, o conde de Vila Real! Lavradio dirigiu-se a Londres e conversou com Palmerston, então ministro dos Negócios Estrangeiros. A resposta não podia ter sido mais brutal: se a rainha dona Maria II contraísse casamento com um príncipe Orleães, cessariam todos os tratados de aliança entre a Inglaterra e Portugal. Sem contemplações, o governo inglês obstava a uma alteração do equilíbrio político, isto é, a que a França pudesse ter influência no nosso país, destruindo a tradicional aliança com a Inglaterra que era contrabalançada por igual e tradicional ligação da Espanha à França. Ora, com a criação de laços familiares estreitos entre as famílias reinantes de Portugal e da França, esta ganharia ascendente sobre toda a península.
O rei dos Franceses, que não desejava criar conflitos com a Inglaterra e porque o futuro dos reis constitucionais de Portugal era mais do que incerto, não avançou com a candidatura de um filho, embora em Abril tivesse demonstrado grande interesse ao embaixador de Portugal, visconde da Carreira. O rei Luís Filipe chamara-o à parte para lhe falar sobre a morte de Augusto Leuchtenberg, querendo saber a situação política de Portugal, se a rainha ficara grávida e opinando sobre a conveniência política do seu recasamento. Fez questão de dizer que não era verdade que não gostasse do príncipe defunto, mas que não aprovara o casamento porque não servira à reconciliação de Portugal com as potências que ainda não reconheciam a dinastia e que tinha lido que a rainha iria casar com Maximiliano, irmão do defunto marido, sendo esse demasiado novo e não indo agradar aos soberanos a quem desgostara o anterior casamento. Depois deu claramente a entender que lhe agradaria a união com um filho seu, mas que isso iria provocar ciúmes e obstáculos difíceis de transpor. Aliás, em Julho e Agosto, quando o casamento em França já estava posto de lado, ainda a família Orleães debatia a questão.
Decerto para se livrar do problema, Palmerston sugeriu o príncipe de Carignano, parente do rei da Sardenha (ele próprio Saboia-Carignano) e reconhecido no ano anterior como herdeiro do trono no caso de extinção da linha reinante. Lavradio nada sabia sobre ele e procurou informar-se, mas concluiu, e tinha razão, que, com excepção da idade, o que lhe diziam sobre o príncipe sardo era improvisado. Procurou informações sobre outros mancebos: o irmão do defunto Augusto, um filho do arquiduque Carlos da Áustria e o filho segundo do príncipe de Orange, mas nenhum reunia rodos os predicados requeridos para esposo de sua majestade e, motivo ainda maior, o negociador português percebeu que tanto o gabinete inglês como o francês desejavam que o marido da rainha não fosse nenhum dos príncipes das famílias imperiais ou reais que reinavam nos principais estados da Europa.
De facto, em conversa com o ministro português em Inglaterra, e temendo ainda a hipótese dos Orleães, Palmerston dissera-lhe claramente que eram, pois, príncipes como estes, das Casas de Vurtemberga ou da Saxónia-Altenburgo-Hildburghausen, sem conexão alguma com outras potências grandes, e que se tornariam completamente portugueses, como o príncipe Augusto fora, os que convinham, e não aqueles que poriam Portugal à cauda dos estados de onde vinham. Em Julho, dona Maria estava decidida a casar com o príncipe de Carignano, ordenando a Palmela que mandasse Lavradio tratar do assunto, mas este não o fez. Nas suas palavras: … continuando sempre nas minhas indagações, tive notícia de um príncipe que possivelmente reunia as qualidades exigidas; era o príncipe Fernando Augusto de Saxe-Coburgo, filho do duque Fernando Jorge de Saxe-Coburgo, irmão segundo do duque reinante de Saxe-Coburgo. Este príncipe estava para completar dezanove anos e, apesar de ser da família de Saxe-Coburgo, era católico desde o nascimento; era sobrinho do rei dos Belgas e de sua Alteza Real a duquesa de Kent, e, portanto, próximo parente da futura rainha de Inglaterra. Afirmavam-me também que o príncipe era dotado de talento, recebera uma excelente educação e tanto ele como todos os da sua família eram amigos do sistema constitucional, o que estava longe de ser verdade. Lavradio prossegue: … as ilustres alianças da família Saxe-Coburgo, a plena aprovação dada pelo rei de Inglaterra e pelo seu governo a esta aliança e a convicção da necessidade absoluta de concluir prontamente a negociação do casamento induziram-me a adiantá-la e a tomar sobre mim a responsabilidade de sobrestar na execução das ordens que havia recebido para negociar o casamento com o príncipe de Carignan. Não tive que me arrepender e tanto a rainha como Palmela aprovaram plenamente o meu procedimento». In Maria Antónia Lopes, D. Fernando II, Um Rei Avesso à Política, Círculo de Leitores, 2013, ISBN 978-972-42-4894-3.

Cortesia de CL/JDACT