quinta-feira, 28 de março de 2019

Alexandre VI. Volker Reinhardt. «Alexandre VI estava confiante no facto de que teria tempo de sobra para as suas realizações. A que se devia esse optimismo, vindo de um homem que, segundo os padrões da época, já era considerado um ancião?»

Cortesia de wikipedia e jdact

De Xátiva a Roma. 1378-1458. As Origens dos Bórgia
«(…) Rodrigo Borja nasceu, provavelmente, no primeiro dia de 1431. Ou, também presumivelmente, um ano depois. Embora a sua data de nascimento exacta seja cercada de dúvidas, uma coisa é certa: mesmo sendo um amante de festas opulentas e glamourosos bailes nocturnos, não celebrava o seu aniversário de forma ostensiva. Não era prioridade de um pontifex maximus comemorar a saída do útero materno, e sim o dia de sua nomeação como sucessor de Pedro. A escolha do Espírito Santo, de acordo com a versão oficial, outorgava ao predestinado, de facto, uma segunda existência, uma existência superior. Como símbolo dessa transformação, os papas assumem, até aos dias atuais, um novo nome. Assim, Rodrigo Borja, que havia muito já usava o nome italianizado para Borgia, passou a ser Alexandre VI em 11 de Agosto de 1492. Como pontífice, uma das suas maiores preocupações foi prolongar o seu pontificado, e, por conseguinte, a sua vida. Foi tão longe nessa obsessão que, a partir do ano-novo de 1502, resolveu pagar para garantir que viveria mais. Começou oferecendo 30 ducados a cada um de seus criados, acrescentando cinco ducados ao montante a cada ano. A contrapartida daqueles presenteados de forma tão generosa era garantir que o prémio chegasse a 100 ducados por cabeça, ou, em última análise, assegurar que Alexandre VI chegasse aos 86 anos de idade. A ideia por trás de tanta generosidade era conseguir algo das pessoas, tornando-as também beneficiárias do seu próprio benefício. Como os empregados conseguiriam prolongar a vida de seu senhor, não foi, no entanto, revelado. Provavelmente, por meio de orações. Pelo menos esse seria o método tradicional. Outros papas esperavam pelas preces de pobres seleccionados. Alexandre VI, ao contrário, apostava na consciência saudável sobre o lucro.
Mesmo com tais estimativas e empenho por conseguir uma expectativa de vida barata, Alexandre VI não era, de forma alguma, um caso isolado. Desfrutava a companhia de ilustres predecessores e teólogos. Todos eles tinham denunciado a contradição entre a majestade do papado e a curta duração da maioria dos pontificados como um escândalo que podia levar os cristãos à apostasia. Cuidados com o corpo e a higiene pessoal já faziam parte, desde muito tempo, do estilo de vida dos papas. No caso de Alexandre VI, no entanto, os seus contemporâneos acreditavam unanimemente que as precauções com saúde e longevidade deveriam beneficiar principalmente, se não exclusivamente, os Bórgia, ou seja, a expansão e protecção do poder familiar. Isso é o que indica também o momento dos generosos presentes de aniversário: 1503 tinha de ser o ano das decisões. A ordem era não morrer naquele momento.
Alexandre VI estava confiante no facto de que teria tempo de sobra para as suas realizações. A que se devia esse optimismo, vindo de um homem que, segundo os padrões da época, já era considerado um ancião? A confiança era alimentada, sem dúvida, pela tradição da família Bórgia. Desde muitas gerações, essa família estava convencida de que as suas modestas condições de vida nada tinham a ver com a sua origem nobre. Isso fez que os seus membros partissem do princípio de que um dia iriam ocupar o lugar que mereciam. Ressentimentos e esperanças desse tipo não eram incomuns naquela época. No caso dos Bórgia, somaram-se profecias precisas de que o destino os predestinara às mais elevadas honrarias. Muitas outras famílias que tinham conseguido subir na hierarquia social também lançavam mão de tais previsões. Dessa forma, justificavam seu sucesso como vontade divina. Não é de se estranhar que Alexandre VI acreditasse nas obras da previdência para justificar a história da sua linhagem. Dificilmente outra família da época teria tido uma ascensão tão vertiginosa quanto a sua. O destino, ao que parece, conduziu a família Bórgia da sua antiga pátria à terra prometida, e logo duas vezes, com tio e sobrinho, à Cátedra de Pedro». In Volker Reinhardt, Alexandre VI, Bórgia, o Papa Sinistro, 2011, Editora Europa, 2012, ISBN 978-857-960-127-9

Cortesia EEuropa/JDACT