segunda-feira, 1 de junho de 2020

Improvisos de Bocage. Manuel Maria B. du Bocage. «Monumento honrador da Humanidade, (se o Fado me sumir da Morte no Ermo), grato vos deixa cordial Saudade»

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Aos Amigos
I
«Terno Paz, bom Maneschi, Aurélio caro,
Alvares extremoso, Almeida humano,
Ferrão prestante, valedor Montano,
Moniz, que extrais teu nome ao Tempo avaro:

Freire, Viana, Blancheville, ó raro,
Moral tesoiro, que possui Elmano;
Sócio de Flora; e tu de som Tebano
Ó Cisne! E tu, Cardoso, em letras claro:

Monumento honrador da Humanidade,
(Se o Fado me sumir da Morte no Ermo)
Grato vos deixa cordial Saudade.

Ireis nos versos meus do Globo ao termo,
Por serdes, com benéfica Piedade,
Núncios, Núncios de um Deus ao Vate enfermo».

II
«Se o Grande, o que nos Orbes diamantinos
Tem curvos a seus pés dos Reis os Fados,
Novamente me der ver amimados
De modesta Ventura os meus Destinos;

Se acordarem na Lira os sons Divinos,
Que dormem (já da Gloria não lembrados)
Ao Côro etéreo, cândidos, e alados,
Honrar com Ele hum Deus ireis, meus hinos.

Mas, da humana Carreira inda no meio,
Se a débil flor vital sentir murchada
Por Lei que envolta na existência veio;

Co'a mente pelos Céus toda espraiada,
Direi, de Eternidade ufano, e cheio:
A Deus, ó Mundo! ó Natureza! ó Nada!»

III
«Pela voz do Trovão Corisco intenso
Clama, que á Natureza impera hum Ente,
Que cinge do áureo Dia o véu ridente,
Que veste d'atra Noite o manto denso.

Pasmar na Imensidade é crer o Imenso:
Tudo em nós o requer, o adora, o sente.
Provam-te olhos, ouvidos, peito, e mente?
Numen! Eu oiço, eu olho, eu sinto, eu penso.

Tua Ideia, ó Grão Ser, ó Ser Divino,
Me he vida, se me dão mortal desmaio
Males que sofro, e males que imagino.

Nunca Impiedade em mim fez bruto ensaio:
Sempre (até das Paixões no desatino)
Tua Clemência amei, temi teu Raio».
[…]

In Manuel Maria B. du Bocage, Improvisos de Bocage, Lisboa, Impressão Régia, 1805, Por Ordem Superior, Wikipédia.

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